Em Tiradentes, Babu Santana cobra mais negros no cinema e na TV
“Nós temos vários Lázaros Ramos que ainda não tiveram oportunidade”, comentou o ator na abertura do festival
atualizado
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O ator Babu Santana é o grande homenageado da 21ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Além de ter recebido o troféu barroco na cerimônia de abertura, que ocorreu sexta (19/1), Babu atua em quatro filmes da programação, dois deles em pré-estreia nacional.
O homenageado do festival carrega no currículo participações em mais de 20 longas-metragens, além de dezenas de curtas e novelas. Entre seus trabalhos estão os filmes Cidade de Deus (2002), Uma Onda no Ar (2002), Quase Dois Irmãos (2004), Batismo de Sangue (2006), Estômago (2007), Meu Nome Não é Johnny (2008) e Tim Maia (2014), no qual interpretou o cantor. É com essa vasta experiência que Babu levanta o debate sobre a baixa presença de negros em algumas produções, não apenas do cinema mas também na televisão.“Nós temos vários Lázaros Ramos que ainda não tiveram oportunidade. Tem programa de televisão que levanta a questão do racismo e tem 80% do elenco branco. Não entendo. Aparece só o branco falando do racismo. Já teve diretor que não me deu papel em filme porque disse que não tinha personagem com o meu perfil. Perguntei a ele se não tinha homem na história”, disse.
O filme da abertura do festival foi Café com Canela (2017), o primeiro longa-metragem dirigido pelos jovens Ary Rosa e Glenda Nicácio. O trabalho, que teve pré-estreia nacional, conta com Babu no elenco e é protagonizada por ele e mais quatro atores negros.
Glenda é a única mulher negra que dirige um longa-metragem em exibição na mostra. Ela também levanta a bandeira da necessidade de mais espaço aos negros no audiovisual. “Pois não existe [diretores negros na história do cinema brasileiro]. É um crime falar, porque nós temos por exemplo Adélia Sampaio, que agora está sendo rememorada. E nem digo rememorada. É memorada, porque até pouco tempo ela simplesmente não existia no cinema nacional. Falem o nome de diretores negros marcantes na história. Digam”, desafia Glenda.
A mineira Adélia Sampaio foi a primeira negra a dirigir no Brasil um longa-metragem: Amor Maldito, lançado em 1984. A cineasta também tem no currículo a direção de curtas-metragens. Os primeiros deles datam da década de 1970.
Convite
Os diretores de Café com Canela contam que fizeram o convite a Babu depois de assistir a uma entrevista onde o ator expressava o desejo de interpretar um homossexual. No roteiro do filme, Ivan é um gay que vive a dor da perda do marido. “Ele pediu o papel ao vivo”, brinca Ary Rosa.
O cineasta afirma ter se surpreendido com a aceitação de Babu. “Ele estava no centro das atenções. Havia acabado de interpretar Tim Maia, estava em novela da Rede Globo. Eu não achava que fosse topar participar do primeiro longa de dois jovens diretores e foi uma das negociações mais tranquilas”.
Babu, por sua vez, diz que gosta de trabalhar com iniciantes. “A pessoa, quando está começando, não tem a experiência, mas tem uma vontade. E eu quero sempre beber dessa vontade, sempre ter a impressão de que estou começando”, afirma.
Além de Café com Canela, a programação da Mostra de Cinema de Tiradentes traz Babu Santana também em Tim Maia (2014) e em Uma Onda no Ar (2002), filme que leva para as telas a história da Rádio Favela, uma emissora comunitária de Belo Horizonte sediada no Aglomerado da Serra. A outra pré-estreia que conta com a participação do ator é Bandeira de Retalhos (2017), do diretor e músico Sérgio Ricardo, que será exibido na noite de hoje (21).
Para o cineasta, a interpretação de Babu deu nova dimensão ao filme. “Eu dei um texto pra ele decorar e ele improvisou um texto completamente diferente. O pior é que o texto dele era melhor do que aquele que estava escrito. Ele é indisciplinado. E fez um personagem genial, muito melhor do que tínhamos bolado inicialmente. Eu, como diretor, fiquei sem ter o que dizer. Foi terrível”, brincou Sérgio Ricardo.
Sob o tema “chamado realista”, a 21ª Mostra de Cinema de Tiradentes exibe 102 filmes, sendo 72 curtas-metragens e 30 longas. Em nove dias de programação, serão realizados também debates, intervenções e performances artísticas, apresentações musicais e outras atividades, todas gratuitas. O evento, que vai até o dia 27 de janeiro, é produzido pela Universo Produções, com o apoio do Ministério da Cultura. Nesta edição, se celebra também o aniversário de 300 anos da cidade mineira.