Crítica: “The Post: A Guerra Secreta” louva papel social do jornalismo
Sob direção de Steven Spielberg, filme mostra escândalo dos Pentagon Papers pelo olhar de jornalistas e editores do “The Washington Post”
atualizado
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Como esperado em qualquer thriller jornalístico baseado (ou não) em fatos reais, “The Post: A Guerra Secreta” é costurado entre telefonemas tensos, encontros discretos com fontes prontas a entregar confidências e discursos sopesados pela defesa à liberdade de imprensa (“Jornalismo é para os governados, não para os governantes”).
O novo longa de Steven Spielberg, veterano que mais adiante (em 5 de abril) lança “Jogador Nº 1”, sua usual contrapartida pop ao filme sério da vez (“The Post”), junta as já pontuais convenções de biografias midiáticas com seu pendor quase infalível para verter história em entretenimento.
Em tempos de fake news e duelos entre o presidente Donald Trump e parte da imprensa americana (sobretudo a que se posiciona como liberal), o longa volta aos atribulados anos 1960 e 1970 para radiografar as reverberações sociais de escândalos políticos e suas repercussões no jornalismo.
“The Post” retrata os Pentagon Papers, dossiê vazado para a imprensa que detalhou em milhares de páginas como quatro presidentes americanos (Truman, Eisenhower, Kennedy e Johnson) mentiram para o Congresso e para o povo acerca da Guerra do Vietnã. Tantíssimos jovens engrossavam as tropas no sudeste asiático enquanto a Casa Branca já sabia que a derrota era questão de tempo.
Eis que, após o “The New York Times” dar com exclusividade as primeiras matérias sobre os Papers, em 1971, entram em cena os jornalistas do “The Washington Post”, veículo concorrente que acabara de anunciar abertura de capital para drenar perdas financeiras.
Publicar ou não publicar?
Kay Graham (Meryl Streep), proprietária do jornal, e Ben Bradlee (Tom Hanks), editor-chefe, aos poucos enxergam na crise entre mídia e governo Nixon a oportunidade de revelar podres da política por meio de documentos estancados pela Suprema Corte após o furo do “Times”. Ao mesmo tempo, cria-se um dilema corporativo. A empresa passa por dias de incerteza.
Spielberg continua como um dos melhores contadores de histórias em Hollywood, mas aqui costuma se sair melhor quando emoldura cinematograficamente os procedimentos jornalísticos do que nos momentos em que parece forçar vultos pessoais e emocionais provocados por uma investigação de tal porte.
Nesse sentido, “The Post” nada tem de “Spotlight: Segredos Revelados” (2015), filme competente que assume uma veia mais comedida dentro da tradição do thriller jornalístico.
O longa de Spielberg recusa o tom impessoal do filme vencedor do Oscar e não tem medo de emprestar bravura e carga épica aos esforços de Ben Bagdikian (Bob Odenkirk), repórter decisivo na divulgação dos Pentagon Papers, e de profissionais de diferentes esferas (dos editores aos trabalhadores da gráfica).
A cena que mostra Graham descendo a escadaria da Suprema Corte sob o olhar de admiração dos jovens manifestantes pacifistas realça o quanto o diretor é capaz de dar às imagens uma carga histórica, mas também simbólica.
Lá pelas tantas, fica evidente que a chave narrativa de “The Post” é se filiar a “Todos os Homens do Presidente” (1976), filme sobre repórteres do mesmo jornal que revelaram o escândalo do Watergate, noticiado pouco depois dos Pentagon Papers.
O título assinado por Spielberg talvez não alcance o status de clássico obtido por seu antecessor – a primeira hora soa um tanto burocrática, vale pontuar –, mas funciona como uma tomada de pulso da confusa contemporaneidade midiática ao celebrar o jornalismo escrito em seu auge.
Avaliação: Bom