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Crítica: Sean Baker descasca realidades marginais dos EUA em Anora

Em Anora, Sean Baker explora o romance acelerado entre uma dançarina erótica e um herdeiro russo

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Imagem colorida de mulher dançando em uma boate no filme Anora - Metrópoles
1 de 1 Imagem colorida de mulher dançando em uma boate no filme Anora - Metrópoles - Foto: Divulgação

Cannes (França) – Diretor e roteirista de Tangerina, Projeto Flórida e Red Rocket, exibido no Festival de Cannes de 2021, Sean Baker tem a habilidade de expor e descascar realidades marginalizadas na sociedade americana com uma sensibilidade que falta à maioria dos autores do cenário independente. O cineasta é o tipo de autor apaixonado por seus personagens e, até imagino, se pudesse ultrapassar a barreira da dramaturgia cinematográfica e as demandas narrativas havidas na arte, daria o melhor mundo possível a cada um deles.

É o caso de Anora, ou Ani, como prefere ser chamada, uma dançarina erótica de um clube badalado de Nova York que, certa noite, por ter fluência em russo, é convidada para atender Ivan, um impulsivo homem de 21 anos, filho de oligarcas riquíssimos. A química bate e ele a convida para ser sua acompanhante durante uma viagem a Las Vegas, onde se casam, para desespero de Toros, Garnick e Igor, os capangas de seus pais, que devem anular o casamento a qualquer custo. Só que Ivan foge, e cabe ao quarteto procurá-lo na cidade até o horário de comparecer no tribunal nova iorquino.

O destaque é Mikey Madison, que interpreta a personagem-título. A atriz de Pânico e Era Uma Vez em… Hollywood é um poço de energia interminável, manifestada a princípio sexualmente; depois, no sentimento de quem ganhou na loteria e aproveita como pode um sonho de Cinderela até o inevitável badalar da meia-noite torná-la em gata borralheira.

Imagem colorida de um homem e um mulher andando abraçados pela rua
Anora: no filme de Sean Baker

Após terminar a lua-de-mel, com a fuga de Ivan da responsabilidade, a energia de Ani é transformada em uma combinação de esperança – de que ele tomará a decisão certa – e inconformismo – este retratado na reação física e verborrágica da personagem, que deve soltar tantos palavrões quanto Leonardo DiCaprio e Jonah Hill juntos em O Lobo de Wall Street.

Falando desse jeito, nem parece que Anora é uma orgia sedutora de gargalhadas pela forma com que Sean Baker constrói as situações e explora-as até o limite do absurdo e da ansiedade, enquanto escapa da maioria de clichês habituais em obras análogas. A longa sequência ambientada dentro da casa dos pais de Ivan, mas que Ani acredita ser dele, é o melhor exemplo para compreender como Sean Baker tem êxito por ousar explorar a acidez das circunstâncias e irreverência das atuações de Karren Karagulian, Yuriy Borisov e Vache Tovmasyan (não exatamente os tipos de capangas russos que o cinema apresentou para nós).

Até por esses personagens, Sean Baker preocupa-se, pois apenas cumprem ordens dos pais oligarcas de Ivan, enquanto também lidam com a reação inesperadamente violenta de Ani. A propósito, mesmo que a direção explore o corpo da personagem – porque, bem, ela é uma dançarina erótica e seria no mínimo hipócrita e cosmetizado se não o fizesse –, não faz o mesmo quando trata da humanidade e dignidade dela. Ani não se acovarda diante daqueles homens, e se é subjugada fisicamente, isto só ocorre após morder um e quebrar o nariz do outro. Esta força e resiliência ainda são testadas no clímax da narrativa, antes de Sean Baker devolver a personagem ao mundo real.

Como comédia, a narrativa é ótima pelo humor fácil e irreverente fruto de situações inusitadas. Como drama, idem, pois eventualmente o casco grosso da personagem é penetrado pelo mundo real que a cerca. Como estudo da personagem-título é um arraso.

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