Crítica: “O Formidável” cutuca Godard com caricatura mal-ajambrada
Novo filme do diretor Michel Hazanavicius, vencedor do Oscar por “O Artista”, ilumina relacionamento de Godard com a atriz Anne Wiazemsky
atualizado
Compartilhar notícia
“O Formidável” é o mais novo tributo ao cinema assinado pelo francês Michel Hazanavicius, vencedor do Oscar por “O Artista” (2011).
Se o filme premiado pela Academia homenageou a era muda da sétima arte num pastiche romântico sobre a chegada do cinema falado, a novidade salta décadas para entrar na vida privada de Jean-Luc Godard, um dos criadores da Nouvelle Vague e até hoje artista dos mais inventivos e inquietos em atividade.
Vemos o casal na recepção negativa ao filme, que segue um grupo de jovens revolucionários de ideias maoístas, o comunismo chinês então recém-estabelecido no país.
Cinema pop lúdico e pouco provocativo
Em 2011, Hazanavicius fez um filme mudo para homenagear o cinema mudo. Em 2017, ele segue a mesma fórmula. Incorpora e imita o estilo de Godard em uma cinebiografia que busca mais cutucar do que venerar o diretor a partir de seu relacionamento intempestivo com Anne, morta em outubro deste ano.
Godard pensou em “A Chinesa” (1967) como um filme de tomada de posição revolucionária. Logo depois, em maio de 1968, ele e Anne aderiram aos protestos de estudantes e operários nas ruas de Paris. Aqui e ali, era interpelado por fãs: “quando você vai voltar a fazer filmes divertidos?”.
O diretor, à época, renegava suas obras anteriores, como “Acossado” (1960) e “O Demônio das Onze Horas” (1965). Tornou-se uma figura tão áspera e rabugenta quanto ciumenta, de acordo com o ponto de vista adotado por “O Formidável”, que adapta a autobiografia de Anne.
Nada disso seria um problema se Hazanavicius não transformasse qualquer traço de provocação instigante em quadros sem graça de um cartum mal-ajambrado. “O Formidável” se vende como acesso à vida privada de um gênio, mas o próprio filme é um exercício de autossabotagem.
Hazanavicius só parece entender mesmo a superfície da estética godardiana. Ironiza as cartelas poéticas escritas pelo veterano com capítulos de título constrangedor – “Salve o Seu Traseiro (e o Seu Casamento)” e “O Primeiro dos Moicanos”, para citar dois deles. Dá piscadinhas cinéfilas e irônicas para o público – a cena de nudez, Garrel/Godard chamando os atores de porre.
“O Formidável” pelo menos consegue conferir a Godard um genuíno tratamento de estrela pop. Uma pena que Hazanavicius não se esforce para ir além da iconoclastia rasteira.
Avaliação: Ruim