Crítica: Meu Anjo é retrato desesperador de uma infância de abandono
O filme francês mostra uma inversão impossível: uma criança enfrenta os demônios da mãe para não ficar sozinha
atualizado
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Se uma diretora estreante tem sorte nessa vida, ela se chama Vanessa Filho. Em seu segundo longa-metragem, a realizadora conseguiu ninguém menos que a oscarizada Marion Cotillard para um papel coadjuvante. Em cartaz nos cinemas brasileiros, Meu Anjo começa muito bem e se perde no segundo ato. É um desses filmes que nadam e morrem na praia.
Na história, a jovem Marlène (Cotillard) tem que sustentar não somente a si mesma, mas sua filha pequena, Elli (Ayline Aksoy-Etaix, num trabalho muito maduro). A dupla, no entanto, segue uma dinâmica em que a criança cuida da adulta – ou, ao menos, a mulher não se responsabiliza pela educação da menina. Em diversas interações entre as duas durante o primeiro ato, Marlène oscila entre muito quente e muito fria com Elli: ou a pequena é a pessoa mais importante de sua vida, ou não quer nem ficar no mesmo cômodo que a filha.
A criança, extremamente sozinha, busca imitar muitos comportamentos da mãe. Elli usa maquiagens com glitter, roupas com estampas de animais e, quando nada faz com que Marlène preste atenção nela, começa a beber num ritmo comparável ao da mulher. A irresponsabilidade da mãe é tal que decide levar a filha para uma balada, onde se embriaga, se distrai com um homem e, ao ver que a Elli está bebendo restos de drinques deixados na mesa, encarna um novo personagem para a bronca. Não cola.
Em seguida, numa virada aterradora, Marlène simplesmente deixa a criança sozinha. O segundo ato une menina e adulto abandonados pelos pais: Elli força a amizade com o tímido Julio (Alban Lenoir) que, depois de anos tentando contato – sem sucesso – com o pai, resolve acolher a menina. É neste ponto em que a atuação de Aksoy-Etaix atinge sua melhor forma, mas infelizmente é quando o filme se perde num roteiro inconclusivo.
Em Meu Anjo, a criança deve enfrentar todos os demônios da mãe: alcoolismo, desinteresse pelo trabalho – no caso, pela escola –, homens violentos, o constrangimento de se ter uma vida sexual ativa, a inveja de quem só se importa com as aparências. Até mesmo as tendências suicidas de Marlène, anunciadas no início do filme, quando a mãe questiona a filha, na janela, se ela pularia. Elli só consegue a atenção de sua mãe quando concretiza o maior medo dela.
Avaliação: Regular