Crítica: Lady Bird é doce e pontiagudo filme sobre mãe e filha
Filme ambientado em 2002 narra angústias de uma adolescente que sonha em se mudar para Nova York
atualizado
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Lady Bird: A Hora de Voar é um filme sobre como lidamos com quem somos, nossas origens e como essas raízes nos levam a outros lugares, outras pessoas. A personagem principal quer renegar o que conhece. A começar pelo nome: não a chame de Christine McPherson (Saoirse Ronan), mas de Lady Bird.
Prestes a fazer 18 anos, a adolescente passa por aquele doloroso interstício que separa o conforto sob as asas dos pais do atribulado começo de vida adulta. Antes de qualquer coisa, ela odeia (ou diz odiar) Sacramento, capital da Califórnia e cidade onde nasceu.
Quer sair de lá e nutrir suas inclinações artísticas em uma faculdade de artes na costa leste, de preferência em Nova York. Cansada da rigidez do colégio católico no qual estuda desde pequena, ela também pretende acumular novas experiências: arrumar namorados, sair mais de casa, fazer novos amigos.
Dirigindo um filme pela segunda vez – estreou dividindo a função com Joe Swanberg em Nights and Weekends (2008) –, a também roteirista Greta Gerwig (atriz do hit indie Frances Ha) faz do longa uma espécie de discreta autobiografia.
Boa parte dessa crônica teen se constrói nos atritos entre Lady Bird e sua mãe, Marion (Laurie Metcalf). Apesar das ambiciosas aspirações da adolescente, a família enfrenta perrengues financeiros. A trama se passa em 2002, com o pai, Larry (Tracy Letts), desempregado, e o irmão, Miguel (Jordan Rodrigues), também em momento de transição – ainda não “decolou”.
Sobre amadurecer
O desejo de Marion é que a filha estude numa faculdade perto de casa em vez de tentar bolsa e se distanciar dos laços familiares ao se mudar para o leste. Com um olhar mui atento para detalhes de cena e elementos de época numa era pré-smartphones, Gerwig mostra os ora doces, ora pontiagudos instantâneos de Lady Bird antes do definitivo voo para fora de casa.
Além da mãe, quem também sofre com as metamorfoses da personagem é Julie (Beanie Feldstein), melhor amiga que vê Bird trocá-la por namoricos e roqueiros niilistas. O timing cômico também se revela certeiro: áspero, contraditório, tipicamente adolescente.
Lá pelas tantas, Gerwig ainda consegue reler a clássica cena de despedida em aeroporto da maneira mais autêntica e cortante possível. Lady Bird, ao contrário da maioria dos filmes sobre esse período da vida, toma distância de respostas definitivas.
Não se trata de uma história sobre achar alguém para amar, escolher a profissão certa ou se dar bem com os pais. Mas sobre procurar seu espaço no mundo, reconhecer ônus e virtude de suas origens e administrar pressões (suas e dos outros).
Avaliação: Ótimo