Crítica: Adoráveis Mulheres, um filme sobre ler, viver e escrever
Nova adaptação do romance de Louisa May Alcott traz direção de Greta Gerwig (Lady Bird) e nomes como Emma Watson e Saoirse Ronan no elenco
atualizado
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Em certo momento do filme Adoráveis Mulheres, sétima adaptação cinematográfica do livro clássico (Little Women) de Louisa May Alcott, duas irmãs conversam sobre a obra escrita por uma delas. A autora acha que literatura reflete a vida. A leitora pensa diferente: escrever confere importância às coisas – inventadas ou experimentadas. Sobretudo histórias contadas do ponto de vista feminino, historicamente ignorado e silenciado.
A obra que já recebeu roupagens distintas ao longo de quase um século em Hollywood, arregimentando estrelas como Katharine Hepburn, Elizabeth Taylor, Janet Leigh, Winona Ryder, Kirsten Dunst e Claire Danes, agora chega às mãos da diretora e roteirista do momento: Greta Gerwig, do potente drama adolescente Lady Bird: A Hora de Voar (2017), e também atriz de hits indies a exemplo de Frances Ha (2012) e Mulheres do Século 20 (2016).
Ao recusar uma atualização frontalmente feminista do material de origem – um gesto antenado em tempos de #metoo –, Gerwig topa o desafio de burilar um filme de época e emprestar o seu olhar inquieto e impetuoso sobre personagens do passado.
No século 19, tempos de Guerra Civil, os homens trocaram lares por campos de batalha, empregos por armas. Após a convocação do patriarca (Bob Odenkirk), só sobraram mulheres na casa da família March. E cada uma pensa a vida de forma diferente. Em especial, Josephine (Saoirse Ronan), ou apenas Jo. Leitora incansável, escritora em formação e jovem que recusa expectativas criadas em torno de qualquer mulher da época. Não quer se casar de jeito nenhum.
Meg (Emma Watson), a primogênita, sonha em virar atriz, mas também em encontrar um grande amor e ter filhos. Amy (Florence Pugh) gosta de coisas elegantes e chiques apesar de não pertencer à elite. E de pintar. Beth (Eliza Scanlen) é a mais caseira do quarteto: faz tudo pela mãe, Marmee (Laura Dern) e mostra seus talentos musicais apenas para a família.
O olhar casual e dinâmico de Gerwig tira aquele peso antiquado que se espera de uma história de época. Transições sutis distribuem a narrativa entre passado e presente e, no caso da protagonista, Jo, vida escrita e vivida.
Há romance (ou sugestões de romance) na trajetória das irmãs – Laurie (Timothée Chalamet), o bom vizinho, e Friedrich (Louis Garrel), o imigrante intelectual –, mas paixões e amores desfilam na trama como forças coadjuvantes.
Com clareza do que pretende visualmente – nada de firulas de câmera ou truques de montagem – e uma generosa direção de atores, Gerwig usa Little Women para ir além da narrativa de dores e glórias domésticas e celebrar mulheres tomando conta de suas próprias histórias (vividas e inventadas) e recusando padrões (sociais e artísticos) forjados por homens. Queiram elas se casar ou publicar livros.