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Cannes: “Wonderstruck”, de Todd Haynes

Todd Haynes parece ter feito um filme embalado pro Oscar, em vez de uma obra de arte provocadora

atualizado

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Divulgação/Festival de Cannes
Wonderstruck
1 de 1 Wonderstruck - Foto: Divulgação/Festival de Cannes

O que aconteceu com Todd Haynes? Uma das vozes fundadores do movimento indie no cinema norte-americano dos anos 90 tinha uma voz singular e expressiva, que em seu último filme, assim como em “Carol”, troca uma visão original por uma história embaladinha para ganhar um Oscar. Embora completamente diferente de seu predecessor, já citado, “Wonderstruck” junta o formalismo narrativo, o cenário de época e o primor técnico com a caretice e o sentimentalismo barato dos filmes que sempre são favoritos à estatueta dourado mais cobiçada de Hollywood.

Esta é a história de duas crianças, Rose (Millicent Simmonds) e Ben (Oakes Fegley), que fogem de suas pequenas cidades interioranas à procura de um destino em Nova Iorque. Porém, suas infâncias tem uma diferença de 50 anos, visto que Rose está percorrendo NY em um filme mudo, em preto e branco, em 1927 e Ben está vivendo um filme à cores e com som. Não que isto sirva muito a ele, pois logo no começo Ben sofre um acidente com um raio e fica surdo, assim como Rose, surda de nascença.

Haynes faz uma ode à Nova Iorque em ambas as tramas. A época de Rose mostra uma cidade romantizada, com o preto-e-branco reverencial e nostálgico que admira o gigantismo arquitetônico da cidade com os mesmos olhos apaixonados de quem desembarca nela pela primeira vez. Já nos anos 70, Ben é exposto a um poço de decadência, perigoso e imundo. Mas a câmera de Haynes está à procura da beleza na sarjeta, e os tipos, as pichações e o lixo que Ben encontra são fotografados com maestria, indicando uma certa saudade do diretor por estes tempos mais libertários. Esta é, sem dúvida, a melhor coisa do filme: seu retrato de uma das maiores cidades do mundo.

Um dos pontos de encontro das duas histórias é o Museu de História Natural, famosamente ocupados por esqueletos pré-históricos e animais empalhados. Existe aqui um paralelo a ser feito com a própria visão do filme, de uma Nova Iorque que agora só existe no passado, e que as crianças de hoje só poderão conhecer através de obras de arte. “Wonderstruck” tem imagens tão lindas que caberiam em quadros de museu, o problema é a história conectando tudo isso.

Baseado num livro de Brian Selznick, o mesmo de “Hugo Cabret”, que Martin Scorsese adaptou em 2011, este filme tem o mesmo problema: luxo visual misturado com uma trama água-com-açúcar. Rose e Ben estão à procura da mesma coisa, que não cabe revelar aqui, apenas que Rose é obcecada com uma atriz famosa, vivida por Julianne Moore, e Ben possui um antigo marcador de livros, com o endereço de uma livraria.

Todd Haynes batalhou por décadas fazendo um cinema provocador, sem impor limites na sua visão artística. Pode ser que o tempo tenha passado e ele busque um sucesso comercial, ou mesmo que a idade tenha amansado seu coração. Mesmo assim, a perda é triste.

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