Cannes: “Nos Frangins”, de Rachid Bouchareb
As histórias sobre brutalidade policial não são novas, mas esta é de forte emoção.
atualizado
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A reflexão da força policial como uma instituição de brutalidade e subjugação não é nova e nem surpreendente, infelizmente. Na Europa, as feridas vão além do racismo, incorporando também centenas de anos de colonialismo. Especialmente complicadas são as ligações entre França e Algéria. Em seu novo filme, o diretor Rachid Bouchareb usa o assassinato de dois jovens acerca de um protesto em Paris para examinar questões históricas e atuais.
O dia 5 de dezembro de 1986 é um dos piores da história da polícia parisiense. Jovens estudantes protestavam uma proposta de reformas no sistema de educação e o efetivo policial recebera ordens de desbandar os protestantes de qualquer maneira. Rapidamente se renderam aos seus piores instintos violentos.
Se foi ruim para a polícia, foi pior para as vítimas desta ação. Abdel Benyahia e Malik Oussekine (Adam Amara), de 19 e 22 anos, morreram nesta noite. O primeiro com um tiro de um policial alcoolizado, enquanto tentava apartar uma briga na rua, e o segundo, após ser perseguido e espancado por membros da divisão de motocicletas da polícia anti-protesto. Sem participar do protesto, Oussekine voltava para casa após um show de Nina Simone.
É um caso bem conhecido na França, por isso o diretor está menos interessado na urgência da história, formando uma trama por vezes lenta, que quer explorar o que leva a essa injustiça e a corrupção moral das instituições acerca do governo. A polícia é personificada no Inspetor Daniel Mattei (Raphaël Personnaz), que tenta esclarecer o que aconteceu ao mesmo tempo em que é instruído a enrolar e mentir para os familiares das duas vítimas: pai (Samir Guesmi) e irmão (Lais Salameh) de Benyahia e irmão (Reda Kateb) e irmã (Lyna Khoudri) de Oussekine.
A relação de subjugação colonial está presente, portanto, não apenas na violência policial cometida contra jovens de descendência árabe, mas também no desrespeito aos seus familiares. Isso funciona, no começo, com o pai de Benyahia, que vive uma vida tentando não causar problemas para e lei, embora seu outro filho insista que a polícia está mentindo. Os familiares de Oussekine, por outro lado, resolvem insistir na verdade.
A responsabilidade da França para com os descendentes de seus colonizados, especialmente os nascidos em solo francês é inescapável. É isso que o filme trabalha, e ele busca estabelecer que a tentativa oficial de negar isso, de ver estes cidadãos como algo menor que seus compatriotas, além de trágica, é contraproducente, pois servem apenas para aumentar o abismo entre as duas culturas.
Avaliação: Bom (3 estrelas)