Cannes: “Le Daim”, de Quentin Dupieux
Um personagem central, biruta porém obstinado, conquista sua plateia com charme e humor esquisito.
atualizado
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O que não é possível quando se está decididamente apaixonado? Quando Georges (Jean Dujardin) encontra uma jaqueta de pelo de cervo, feita na Itália, ele gasta uma pequena fortuna para comprá-la. Completamente apaixonado pelo couro e pelas franjas, ele decide virar um cineasta com uma câmera de filmagem que ganha de presente e abandona sua vida passada.
Este é o início bizarro de “Le Daim”, novo filme do diretor francês Quentin Dupieux. Nunca descobrimos exatamente como era a vida prévia de Georges, mas sua nova paixão por couro marrom claro lhe dá uma missão na vida: eliminar todos os outros casacos do planeta. Sabemos que sua mulher lhe abandonou, e talvez o pobre coitado tenha ficado tão desnorteado que se acoplou ao primeiro objeto de beleza que apareceu em frente aos seus olhos.
Seu caminho pernóstico o leva a um hotel (também esquisito, óbvio) em um pequeno vilarejo nos montes Alpes. Usando a câmera e a desculpa de que é um diretor famoso filmando uma nova obra, ele se insere entre os habitantes, em um momento filmando uma cena esquisita aonde três pré-adolescentes jogam seus casacos fora e entoam um juramento de que nunca mais usarão jaquetas na vida.
Para ajudar Georges em suas desventuras, ele encontra Denise (Adele Haenel), uma bartender com um pouco de experiência em editar vídeos. Ambos entram numa brincadeira que raramente conseguimos estabelecer se é irônica ou sincera. Para Georges, ela é sincera, e é a performance cativante e hilária de Dujardin que faz o filme funcionar (Denise, por sua vez, é mais enigmática).
Momentos indescritíveis permeiam o filme: o tom é de humor negro. Em uma sequencia memorável, o atrapalhado George tem que remover um anel de noivado que está no corpo de um cadáver recém-suicidado (por um tiro no rosto). A coleção de peças com pele de cervo cresce exorbitantemente: um chapéu, luvas, etc.
O cinema é cheio de personagens mergulhando em uma crise de sanidade enquanto se perdem em agonia. “Le Daim” segue a mesma trajetória, para um final tão absurdo quanto apropriado, mas seu tom é completamente inovador. Assistir George tendo uma conversa com seu casaco, em que ele mesmo interpreta a voz da peça de roupa, é hilário, e de propósito.
Avaliação: Ótimo (4 estrelas)