Cannes: após sessão, Kleber Mendonça e Sônia Braga falam de “Aquarius”
Cineasta disse que o protesto no tapete vermelho foi apenas “um pequeno gesto”. A atriz defende que o filme merece vencer, sobretudo pelo trabalho do diretor
atualizado
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Ao fim da sessão de gala de “Aquarius”, nesta terça-feira (17/6), no Festival de Cannes, o diretor Kleber Mendonça Filho e os atores do elenco conversaram com a imprensa no hotel em que a equipe está hospedada. As primeiras perguntas, evidentemente, foram em torno do protesto que o cineasta e elenco fizeram no tapete vermelho, antes da exibição.
“Cannes tem muitas câmeras fotográficas, imprensa do mundo inteiro. Acho que um pequeno gesto às vezes é bem importante. Foi um pequeno gesto que a gente fez. Pensamos em algumas frases que transmitem um pouco do que está acontecendo”, comentou.
Mendonça contou que, logo em seguida, soube que havia vários franceses perguntando sobre o que está acontecendo no Brasil. “Então, isso pra mim é importante, que eles busquem informações na internet e saibam o que está acontecendo no Brasil”.
O filme e a realidade brasileira
Questionado sobre a “coincidência quase astral” que haveria entre ele competir em Cannes com um filme humanista como “Aquarius” — em que valores de mercado se confrontam com valores humanos — e o atual momento brasileiro, o cineasta disse que não se trata de coincidência.
“Quando você parte para escrever alguma coisa, seja um livro, um filme, se você faz algo a partir de coisas que te incomodam ou, eu diria, até que te levam pra baixo e que vêm da vida que a gente vive, você termina pegando coisas no ar que saem de maneira muito natural e bate com a realidade”. Ele ressaltou que o roteiro foi escrito três anos atrás e foi sendo modulado, enriquecido de detalhes.
Competindo para ganhar
Sônia Braga participa do Festival de Cannes pela sexta vez. Ela esteve no evento com “Eu te Amo” (1981), “O Beijo da Mulher Aranha” (1985), “Rebelião em Milagro” (1988), “The Judge” (telefilme de 2001) e, novamente, com “O Beijo da Mulher Aranha”, que retornou na sessão de clássicos do festival.
Sobre a expectativa em torno de um prêmio, a atriz disse que seria muito bom um filme brasileiro ganhar, porque há muito tempo o Brasil não leva uma Palma de Ouro e “sobretudo, porque o Kleber merece esse prêmio”. “Se você é um nadador, vai a uma competição, e diz ‘estou querendo muito chegar em segundo lugar’, não é uma verdade. É uma competição. Estamos aqui competindo”, afirmou.
Sônia contou que quando leu o roteiro, aconteceu algo “impressionante”. “Na primeira parte inteira eu não estava respirando. Era tão excepcional e tão perfeito, todas as falas, todas as cenas, tudo se encaixava”.
A Clara dizia as coisas com a perfeição do meu sentimento. Encontrei nela uma plataforma para o que eu sentia. Viemos de formações diferentes, mas parecemos em muitas coisas, em estrutura, em desejo. Foi um trabalho muito incrível
Kleber Mendonça Filho e Sônia Braga começaram a conversar através de e-mail, a partir da intermediação de amigos comuns. Só se conheceram pessoalmente em Cannes, no ano passado. Na volta, marcaram um encontro em Nova York. “Andamos e conversamos cerca de 18km em três dias”, conta o diretor.
“Depois fiquei muito seguro para recebê-la, três, quatro semanas, depois para iniciarmos os ensaios. Foi muito natural. Foi uma experiência pessoal realmente muito rica trabalhar com Sônia”, Kleber
Locação em ruínas
Kleber contou que seu desejo era filmar no antigo Edifício Caiçara, localizado na orla de Boa Viagem, em Recife. Mas, em 2013, houve uma tentativa de demolição, interrompida pelos militantes do movimento Ocupa Estelita.
E ele permaneceu ali parado, como se fosse vítima de uma guerra. Perfeito de um lado e destruído de outro. Falou-se, de uma forma até quase sonhadora, que a Justiça iria mandar reconstruir tijolo por tijolo. Mas há três meses soubemos que os tratores voltaram e demoliram tudo
Kleber Mendonça Filho, cineasta
O diretor diz que perdeu não só uma referência arquitetônica na praia de Boa Viagem, perdeu também um set de filmagem, “de um filme que estava muito dentro de mim”. A produção se mudou, então, para o último prédio de estilo antigo no bairro, o Oceania. “Se a gente não conseguisse filmar lá, teríamos que ir para João Pessoa ou Maceió”.