Bárbara Paz se descobre cineasta em Babenco e pode chegar ao Oscar 2021
Filme mostra últimos anos de vida de Hector Babenco e o nascimento de uma diretora obstinada e multitalentosa
atualizado
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Quem assiste a Babenco: Alguém Precisa Ouvir o Coração e Dizer: Parou – leia a crítica do Metrópoles – esperando um simples documentário biográfico pode se surpreender com a complexidade de sentimentos que Bárbara Paz consegue agregar ao gênero, em sua estreia como diretora.
Para além de um candidato em potencial a representante do Brasil no Oscar, o longa é um retrato íntimo, delicado e apaixonado do relacionamento de Bárbara e Hector Babenco e de ambos com o cinema. “Um filme sobre a vida, feito à mão”, como ela mesma descreve.
Nele, a diretora retrata os últimos anos da vida do marido argentino, naturalizado brasileiro, que se tornou um dos maiores nomes do cinema nacional, e faleceu em 2016 após anos de luta contra o câncer. Contudo, vai além de enumerar os trabalhos que alçaram Babenco a esse status. Em pouco mais de 60 minutos, Bárbara registra a personalidade única do homem que amou — grandioso, determinado e convicto de que filmar era seu alimento.
Veja a entrevista completa:
“Quando eu falei pro Hector que eu queria fazer um filme dele, foi num leito de hospital. Ele estava muito mal. Achei que eu não ia mais ter tempo de registrá-lo, fiquei com medo de que ele fosse partir. Isso foi uns sete anos antes dele ir embora. E aí a gente foi filmando. Ele perguntou: ‘quando você começa’, respondi: ‘já comecei’”, conta Bárbara, em entrevista ao Metrópoles.
Mesmo do lado do set que poucas vezes aparece na tela, Bárbara está 100% presente em cada cena: aprende, registra, dirige, produz e empresta memórias compartilhadas com Babenco.
“Eu sou fascinada pelo cinema verdade. E enxergar o ser humano através de uma lente assim, de uma forma tão crua, sempre me chamou muita atenção”, diz. “E aí eu encontro essa pessoa que eu tenho vontade de registrar o tempo inteiro, que eu quero que o mundo todo escute aquilo que ele está falando, que eu quero registrar todos os momentos, de alegria e dor”, completa.
Apesar de ter convido com a possibilidade da morte desde os 38 anos de idade, quando descobriu o primeiro câncer logo após ser indicado ao Oscar de Melhor Diretor em 1985, Babenco é descrito e retratado como um companheiro destemido, que encontrou na atriz alguém com quem poderia partilhar o fascínio pelo cinema.
Em vários momentos do longa, o cineasta aparece repassando técnicas e conceitos, como quem quer deixar uma herança que não cabe em nenhum inventário. “Nos últimos anos, a doença voltou, ele começou a ficar com mais vontade de filmar, com mais vontade que eu gravasse, ficou com medo. Ele nunca teve medo do fim, mas acho que ficou com uma intuição de que algo estava se fechando”, lembra.
Em retribuição, Bárbara dedicou-se de corpo, alma e até mesmo financeiramente ao projeto, bancando, do próprio bolso, parte significativa dele. “Fui produzindo eu mesma, by my self, levantei set, tudo com meu dinheiro, com meu salário. Aí um pouquinho antes dele partir, ele falou ‘Bárbara, coloca esse projeto na lei, vai tentar conseguir alguma coisa’. Então foi assim que eu virei produtora da noite pro dia”, diz.
“Ele sempre dizia que eu era uma boa produtora e não precisava de ninguém. Realmente, me descobri produtora. Sou muito boa produtora”, completa.
Sem abandonar o papel de esposa para desempenhar todos que aparecem nos créditos, Bárbara também relata episódios difíceis na ilha de edição. “Teve momentos muito ruins, na montagem”, confessa. “Mas eu acho que a pessoa tá dentro da gente depois que ela parte, alguma coisa se transforma. Tem muita saudade, tem a falta. Eu quero falar com ele, contar tudo que está acontecendo”.
Nasce uma diretora
Aos 46 anos, Bárbara Paz já se desafiou diante do público muitas vezes. Foi apresentadora de tevê, protagonizou novelas, trabalhou no cinema — incluindo em Meu Amigo Hindu, último filme de Hector Babenco ao lado de Willem Dafoe — e se consagrou como uma das primeiras mulheres a vencer um reality show no país, a primeira edição de A Casa dos Artistas, no SBT.
A construção de Babenco e a aposta da Academia Brasileira de Cinema (ABC) para disputar a vaga no Oscar de melhor filme internacional, no entanto, tem feito a direção falar mais alto. “É uma coisa que eu acho que tá no meu sangue. Porque eu gosto de orquestrar: a música, a arte, o som, a imagem, eu adoro fotografar, enfim, amo juntar essas partes. Então pra mim é fascinante, é como se eu tivesse montando uma tela”, revela.
Por isso, Bárbara tem planos de conciliar trabalhos na tevê, já no próximo ano, com um novo projeto para o cinema.
“Tô fazendo um filme no Rio, com Letícia Colin, da Júlia Resende, chamado Porta ao Lado; tenho trabalho na tevê pra voltar ano que vem, acabei de dirigir um curta… não parei de trabalhar”, brinca. “E aí ano que vem tem um roteiro da Antônia Pellegrino que fui convidada a dirigir, lindo, chamado Silêncio… vamos ver o que vem primeiro, se a atuação ou a direção, quero tentar equalizar as duas coisas. Mas, vou te falar, a diretora tá me chamando muito pro jogo. Tá me chamando pro ringue. E eu tô aqui com as luvas prontas pra continuar”.