Cannes: Kuru Otlar Ustune, de Nuri Bilge Ceylan
Vencedor da Palma de Ouro no passado, diretor turco aponta sua câmera ao homem intelectual moderno.
atualizado
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O cineasta turco Nuri Bilge Ceylan tem um certo tipo de público. São filmes de longa duração, passando de três horas, com pouca ação e muita conversa. Conversas não sobre ações, mas sobre conceitos. São perenes nos festivais, mas duram pouco na sala do multiplex. Isso parece não perturbar o diretor, que continua no mesmo trajeto, sem muita variação. O próprio título do filme, que se traduz como “Sobre Gramas Secas” parece indicar a completa drenagem de aceleração da trama: propõe algo como uma decomposição inerte, um estanque temporal.
Assim é a vida do professor primário Samet (Deniz Celiloglu), na verdade. Ensinando numa escola pública num vilarejo remoto o solteirão entediado torce por uma transferência para a cidade grande, como Istanbul. Enquanto isso, o que lhe resta é reinar na província, só que como ele não significa tanto para o lugar, Samet tenta se destacar nas suas relações com os jovens alunos. Só que um dia alguém encontra uma carta de amor escrita pela jovem Sevim (Ece Bagci) na escrivaninha da própria. Rapidamente, a suspeita de uma relação imprópria ganha força.
É de se esperar que Ceylan não fará um filme escandaloso, mas contemplativo. O foco não é a intriga escolar, mas as ramificações desta na psique e no comportamento de Samet, que claramente se vê acima de todos em sua volta. Talvez seja este o ponto mais opaco desta nova obra: um protagonista intelectualmente arrogante e propenso a pequenas tiranias. Para o espectador, não há dúvida de que a suspeita de impropriedade sexual é falsa, mas à medida que o filme progride, duvidamos da necessidade de passar tempo com o protagonista.
Sevim, por exemplo, é claramente sua aluna preferida, e o professor lhe dá atenção especial durante a aula. Quando outros alunos reclamam, este retruca grosseiramente. Samet divide sua moradia governamental com outro professor, Kenan (Musab Ekici), e quando este expressa interesse em uma mulher Nuray (Merve Dizdar), Samet se move para se interpor entre os dois. Sobra até pra Sevim, agora vista por seu querido professor como alguém hostil e perigosa.
Em várias de suas discussões, o que Ceylan e seus personagens parecem discutir é o limite do egocentrismo. Debatendo em voz alta as discrepâncias entre suas vidas interiores e exteriores, eles e elas já não conseguem se consolidar com o ambiente em que vivem–imagine só conseguirem integrar-se com outros membros da raça humana. Em um singelo momento de quebra da 4a parede, Ceylan parece admitir algo óbvio: todo esse egocentrismo mascara insegurança.
Avaliação: Regular (2 estrelas)