Cannes: Cerrar Los Ojos, de Victor Erice
Cineasta que realizou uma das obras mais marcantes do cinema espanhol transita entre questões de arte sem dizer muito.
atualizado
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Quando um cineasta passa mais de 30 anos sem fazer um filme, fica difícil administrar expectativas, especialmente quando se trata de Victor Erice, diretor de “O Segredo da Colmeia”, reverenciado como um dos melhores filmes a já sair da Espanha. Sem realizar um longa desde 1992, Victor Erice coloca um diretor aposentado como o protagonista de sua nova trama. Miguel Garay (Manolo Solo) era um diretor bem-sucedido até que, um dia, no meio de uma filmagem, seu amigo e ator principal, Julio Arenas (Jose Coronado) desaparece sem deixar qualquer vestígio. Décadas mais tarde, um canal de televisão pede a participação de Miguel em um episódio sobre o caso. Miguel nunca mais filmou, e vive recluso, indicando que o sumiço lhe deixou uma marca profunda.
Um desaparecimento é ponto de partida comum no cinema, tanto pela busca de respostas quanto o que esta busca ocasiona no personagem principal. Mergulhar no passado é sempre uma proposta arriscada. Que Erice tenha roteirizado um personagem tão próximo do que poderia ser ele mesmo, é uma indicação de que algo profundo está para acontecer. Algo que um diretor guarda dentro de si por trinta anos e um dia lança ao mundo.
O mundo ao qual Miguel retorna não é algo de cinema. Sem sequencias audazes ou virtuosas, Erice arma um filme baseado em encontros, re-encontros e conversas. Encontra um velho parceiro de trabalho, com quem lamenta as transformações do cinema, um antigo amor, e até a filha de seu amigo desaparecido. O programa de TV vai ao ar e eventualmente surge uma pista sobre um local aonde Julio teria passado. Miguel sai à sua procura.
A espera, como metáfora, é tão explorada no cinema quanto a ausência, e o filme novo de Erice, que já passa dos 80 anos, faz bom uso de ambos. Com mais de duas horas e meia de duração, o filme nunca fica moroso ou enfadonho, mas talvez as respostas que ele acaba fornecendo ao espectador não são também as mais satisfatórias. Pelo menos no que diz respeito ao que também já foi dito antes, por outras obras. Esta contemplação, sobre o efeito que o cinema, e a arte como um todo, tem sobre nossas memórias e nossos sentimentos é algo que tem vindo cada vez com mais força no cinema mundial, talvez como resposta à pandemia enfrentada.
“Cerrar los Ojos” começa com uma sequencia que seria própria do filme que Miguel e Julio faziam antes do desaparecimento. Envolve um ex-guerrilheiro sendo contratado para encontrar, na Ásia, a filha fujona de um figurão idoso. A esperança deste era de vê-la mais uma vez, antes de morrer. Neste filme, este tipo de coisa só é possível na sala de cinema.
Avaliação: Bom (3 estrelas)