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Cannes: Black Flies, de Jean-Stéphane Sauvaire

Trama cliché enfraquece filme de fortes atuações.

atualizado

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Black Flies
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Poucas profissões servem tão bem à dramaturgia quanto a medicina. Decisões de vida ou morte tem de ser tomadas em pouco tempo e o trauma segue não somente os pacientes, mas também os próprios médicos, sempre pré-dispostos a passarem noites em claro, suas cabeças ocupadas por visões de dor e sofrimento. Pelo menos quem trabalha de dia consegue passar a noite na cama, pois na escala de Gene “Rut” Rutkokvsky (Sean Penn) e Ollie Cross (Tye Sheridan), as madrugadas se passam quase que literalmente numa descida ao inferno, a bordo de uma ambulância nas ruas de Nova York.

Os parceiros são um clichê de Hollywood, Rut como o veterano grisalho, atuante como um paramédico de rua desde antes do 11 de setembro de Nova Iorque, que já viu de tudo e que parece não conseguir existir fora de seu trabalho enquanto Ollie é o novato, cheio de idealismo, empolgado com a perspectiva de salvar vidas. Só que para ele este é um emprego-tampão, visto que passa os dias estudando para uma prova de medicina no caminho de virar um médico de consultório.

A melhor coisa a se dizer sobre “Black Flies” é que o filme parece querer homenagear o cinema americano feito na década de 70, especialmente o de Nova Iorque. Se tratava então da melhor época do “auterismo” americano. Junto com a artificialidade das narrativas previamente roteirizadas, se selecionava uma trupe de atores e atrizes que pareciam pessoas escolhidas na rua por seus rostos e trejeitos únicos, não para a interpretação de personagens mas para a concretização de uma estética humana. Ancorado por dois atores de peso, o filme de Jean-Stéphane Sauvaire conta com dezenas de “sem-nomes”, tirados sabe-se-lá-de-onde, de uma maneira que não sabemos se assistimos realidade ou ficção. (Obviamente se trata de ficção, mas isso apenas ressalta a qualidade das interpretações “in extremis”, do filme.)

Testemunhamos um sem-número de atendimentos, sejam após tiroteios de gangue, durante partos na sarjeta, ou overdoses. Poucas destas sequencias tem revelancia narrativa, exceto por um encontro com uma briga de casais e o parto de um bebê prematuro, já positivo com HIV, enquanto sua mãe tem uma overdose. O resto está aí para mostrar o inferno da realidade nua e crua para o novato que, em termos nada sutis, tem o sobrenome “Cross”, ou “Cruz” e usa uma jaqueta com desenhos de duas asas angelicais.

Nós, é claro, descemos junto com eles, rondando o espetáculo mórbido como as “moscas negras” do título.

Avaliação: Regular (2 estrelas)

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