Cancelamento do Glastonbury coloca em xeque realização de festivais em 2021
Apesar da notícia, eventos brasileiros como Rock In Rio, Lollapaloza, Coala e outros mantêm o otimismo
atualizado
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Brasília e São Paulo (SP) – A disponibilização da vacina contra a Covid-19 no início de 2021 foi encarada por muita gente como uma promessa de retorno à normalidade, com direito a música e aglomeração para comemorar. Agora que o imunizante é realidade, vem à tona também os desafios de torná-lo acessível a toda a população.
Sem que isso ocorra, o segmento cultural, um dos mais atingidos pela paralização das atividades, deve enfrentar uma retomada lenta. Segundo estudo da empresa de pesquisa Hibou, 67% da população só voltará a frequentar eventos fora de casa depois de vacinados.
O prognóstico imprevisível acerca da disponibilização da vacina em massa já começou a mexer no calendário de eventos do ano. O Glastonbury, no Reino Unido, considerado o maior festival de música a céu aberto do mundo, foi cancelado pelo segundo ano consecutivo devido à pandemia nessa quinta-feira (21/01)
O evento estava marcado para ocorrer entre os dias 26 e 29 de junho, mas os idealizadores não vislumbram uma cenário favorável até lá. “Apesar dos nossos esforços parar mover céus e terra, ficou claro que simplesmente não poderemos organizar o festival este ano”, lamentaram Michael e Emily Eavis em um comunicado divulgado no Twitter.
A iniciativa de cancelar o evento para evitar expectativa por parte dos fãs e burocracias na hora de reembolsar fornecedores, artistas e público pode ser seguida por outros festivais nos próximos meses.
Otimismo no Brasil
Entre os festivais que ocorrem no Brasil e já tem data marcada estão o o Rock In Rio, entre 24 e 30 de setembro e 1º e 3 de outubro, na Cidade do Rock, Zona Oeste do Rio de Janeiro; o Lollapaloza e o Coala Festival, ambos entre os dias 10 e 12 de setembro, em São Paulo; além do Rocky Mountain, em Petrópolis (RJ), que privilegia a música nacional e esgotou o numero de ingressos disponibilizados para sua próxima edição, em novembro, em apenas nove horas.
Semanas antes do primeiro dia de janeiro, o Coala Festival, que em 2020 reuniu pela internet músicos como Gilberto Gil, Novos Baianos e MC Tha, iniciou a venda de entradas para a próxima edição. O festival de música brasileira já anunciou duas atrações, Gal Costa e Maria Bethânia, escaladas para se apresentar nos dias 11 e 12 de setembro, respectivamente.
Mesmo com um grande ponto de interrogação sob a cabeça, o Coala já vendeu mais de 80% dos ingressos até o momento, segundo um dos fundadores e curador do evento, Gabriel Andrade. Até 30 mil pessoas são esperadas nos dois dias.
“Ainda há muita incerteza, estamos sujeitos a forças maiores dos governos estadual e federal. Tem muitas partes envolvidas para que a gente possa voltar. Na pior das hipóteses, teríamos que adiar, mas acredito que não por mais de seis meses”, admite Andrade. Até o momento, porém, não foi revelada nenhuma informação sobre reembolso do valor da entrada.
Uma, duas, três datas?
A pandemia de coronavírus tem alterado os planos, por exemplo, do Nômade Festival. O evento que acontece desde 2018 na capital paulista remarcou a data da terceira edição em meio ao surto de coronavírus, sob a justificativa de oferecer assistência à cadeia de trabalhadores envolvidos na organização. Aconteceria inicialmente em 8 de outubro de 2020, foi adiado para 24 de abril deste ano, mas deve ganhar uma terceira – e provavelmente – definitiva data nas próximas semanas.
Os sócios da agência InHaus, idealizadora desse e de outros festivais, Luiz Restiffe e Juliano Libman, reverteram o cenário desfavorável com o que chamam de reinvenção. Fizeram apresentações musicais em drive-in, separados por boxes para seis pessoas e eventos de live marketing dentro dos protocolos de segurança contra Covid-19, afirmam. Essa frente, juntamente com shows de pré-carnaval e carnaval, permitiu que a empresa fechasse o ano no azul.
Para antecipar uma possível dor de cabeça, a papelada de contratos também foi repensada na pandemia. Caetano Veloso e Elza Soares, que são do grupo de risco por já terem ultrapassado os 60 anos, são os primeiros nomes anunciados para a próxima edição.
“Nós colocamos uma cláusula de possível alta de data, seguindo os protocolos de vigilância sanitária. Isso ficou muito claro para os artistas, principalmente os de MPB e hip hop, que são os que mais entendem essa mudança e levantam a bandeira da preocupação com saúde”, afirma Restiffe.
Com a proximidade de abril, os sócios da InHaus devem revelar em breve uma terceira data do Nômade Festival já com mais dois novos nomes da MPB que estarão lá. O Nômade também acontece no Memorial da América Latina e reuniu mais de 10 mil pessoas em 2019. Sem muito alarde na divulgação nas últimas semanas, a agência calcula a venda de 30% da carga de ingressos até o momento.
Shows internacionais preocupam
Se por um lado a música brasileira vem carregada de certa euforia, por outro lado os organizadores que trazem artistas internacionais estão mais com o pé no chão. O jornalista e curador do Popload Festival, que nasceu sob o guarda-chuva do site de música indie Popload, Lúcio Ribeiro, analisa que cantores e bandas gringas de expressão podem rarear em 2021 por conta do agravamento da pandemia.
Nos últimos dois anos ao vivo e com público, Patti Smith e Blondie subiram ao palco, por exemplo. “A complicação começa porque vai ser difícil um artista grande vir, a não ser que ofereçam um caminhão de dinheiro. Eles estão com discos e turnês atrasados, e o mercado brasileiro não é prioritário, preferem Estados Unidos, Europa, Ásia e depois olham para América do Sul”.
Em contrapartida, Ribeiro acredita que esse período de avaliação oferece chances de incluir mais brasileiros no line-up. Desde 2013, o Popload mescla atrações internacionais e nacionais. Em 2019, a Time For Fun (T4F) adquiriu a plataforma de música criada pelo jornalista.
Por consequência da dúvida, o Popload ainda não revelou sua próxima edição, mas a ideia é que uma decisão seja tomada até o final de fevereiro. Isso porque a partir do segundo semestre, mais precisamente de setembro em diante, Ribeiro projeta uma enxurrada de festivais e shows de música no calendário do país, inclusive com dias e horários parecidos. Como exemplo, o Lollapalooza e o Coala estão marcados para o mesmo fim de semana de setembro.
De acordo com o infectologista Leonardo Weissmann, o cenário para a realização de eventos de grande porte é de muita incerteza. “A vacinação começou agora e temos que levar em consideração a quantidade de vacinas disponível, que é muito pequena. É muito cedo para fazer qualquer afirmação mesmo sobre o segundo semestre”, diz.
Eventos no DF
Em Brasília, onde a cultura dos festivais é recente, a agenda de grandes eventos ainda não foi aberta. A Influenza Produções, por exemplo, uma das responsáveis pela produção do Festival CoMa – Convenção de Música e Arte, realizado desde 2017 no Eixo Monumental, não definiu a data nem o formato da próxima edição. No entanto, pretende “reativar a marca esse ano”.
“Queremos realizar algo esse ano sim, mas não sabemos como vai ser. Tudo vai depender da vacina e de como o mundo vai se comportar”, avaliou a produtora Kaká Bessa.
Dono da AC Eventos, o produtor Aci Carvalho, espera espera promover pelo menos dois grandes shows ainda em 2021: o Samba Prime, previsto para acontecer em abril deste ano e O Encontro, marcado para o próximo mês de maio. No entanto, está ciente que terá de encarar muitos desafios para fazê-los acontecer.
“Acreditamos que a maior dificuldade será reconquistar o público. Demonstrar para as pessoas que há segurança sanitária. Mas as pessoas querem voltar a socializar, de um novo jeito, claro, não aguentam mais ficar isoladas”, opina.