Especialistas respondem: é possível sustentar um “personagem” no BBB21?
Em todo início de temporada, fãs se perguntam “quem está sendo de verdade” no reality. Com presença de artistas, dúvidas aumentaram
atualizado
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Fenômeno de audiência por mais de 20 anos no Brasil, o conceito do Big Brother foi originalmente criado pela produtora holandesa Endemol, inspirada no best-seller 1984, do inglês George Orwell. No romance distópico, a sociedade tem sua liberdade cerceada por um governo vigilante. Quem supervisiona tudo, com câmeras instaladas dentro de cada casa, é o Grande Irmão, de quem o protagonista Winston Smith tenta esconder suas reais crenças e anseios.
Na adaptação para reality, é o público quem assume o papel de Grande Irmão, monitorando cada passo dado pelos participantes. A regra é de que nada pode escapar às 11 câmeras espalhadas na casa, nem mesmo um ato falho ou um franzido de testa. Apesar disso, ainda há quem tente perseguir a estratégia do herói da obra ficcional.
A 21ª edição do programa da Globo, com estreia na última segunda (25/11), começou com o cancelamento como pauta central. Para evitá-lo e garantir mais tempo no jogo, grande parte do elenco chegou com discursos bem construídos sobre temas polêmicos em 2020 como racismo, machismo e respeito às diferenças. Resultado: o excesso de prudência acabou decepcionando os fãs “mais raiz” do programa.
Especialistas, no entanto, avaliam que os participantes têm personalidades fortes e não conseguirão manter os “personagens” ao longo de 100 dias. Não à toa, algumas máscaras já começam a cair.
Gestão da imagem
Issaaf Karhawi, pesquisadora em comunicação digital na USP, lembra que a mudança de formato, com a presença de influenciadores digitais, impacta na dinâmica, que agora também é conduzida pela gestão da imagem. Se antes os confinados estufavam o peito para afirmar que “falam o que pensam”, hoje têm medo de que qualquer atitude equivocada possa não só eliminá-los da competição, mas impactar negativamente a vida fora do BBB.
“Quando influenciadores, celebridades, pessoas comum constroem sua presença digital, a gente chama isso de performance. E essa performance tem a ver com o que se oculta e o que se evidencia. Mas isso não é sustentável no formato de um reality show. Ali, a visibilidade é imperativa, penetrável e autoritária”, explica.
Ela explica que a tentativa de forjar uma identidade “agradável” ao público tende a fracassar hora ou outra, sobretudo por causa dos estímulos ao conflito, conduzidos pela própria direção, com provas de resistência, divisão de comida, punições que alcançam todo o grupo, os famosos jogos do monstro e da discórdia, além de festas regadas a álcool.
“O encontro com a autenticidade é um mote do reality show, o que guia. Quando a gente pensa numa participação baseada em uma performance, com script pronto, essa atitude vai totalmente contra a o que é o BBB, ao que conecta esse tipo de programa com o público”.
Issaaf Karhawi, pesquisadora em comunicação digital na USP
Coaching não aula de teatro
É comum que nas primeiras semanas de BBB, os fãs se questionem sobre quem está ou não está “representando um papel”. A resposta, segundo o coaching Alex Rodrigues, costuma aparecer em poucos dias. “Ninguém consegue manter uma personalidade, um caráter que não é seu por mais de duas ou três semanas”, opina.
Famoso após ter sido apontado como o coach que ajudou Rafa Kalimann a chegar à final do BBB20, o profissional contesta a ideia de que um profissional da área possa “transformar” alguém da água pro vinho, ajudando-o a criar um personagem. “Mudanças reais são sempre de dentro para fora. Não dá para fazer isso em dois, três meses de preparação antes do BBB”, pontua.
Alex também destaca que há o risco da audiência não gostar do “papel” criado.
“A gente consegue camuflar certos comportamentos durante uma festa, um evento, um momento pontual. No dia a dia, debaixo de tantas pressões e desafios, não. Por isso, o trabalho com os BBBs é baseado no desenvolvimento da capacidade de gerir suas emoções e da consciência dos seus pontos fortes e fracos. Assim, acontecimentos externos acabam tendo cada vez menos influência no seu comportamento, emoções e formas de agir”.
Alex Rodrigues, coach de Rafa Kalimann
Opinião de quem assiste
Em bate-papo com o Metrópoles, Carlos Felipe, Julia Santos e Wesley Cavalcante, especialistas em Big Brother e donos do canal @VaiDesmaiar, que acompanha os principais realities brasileiros, opinaram sobre o assunto e divergiram bastante.
“Acho pouco improvável que uma pessoa atue 24 horas por dia. Mesmo com toda preparação fora da casa, deslizes acontecem e naturalmente o público desconfia da atuação. As máscara caem”, avalia Wesley.
Carlos acredita que muitos campeões ganharam interpretando um personagem, uma vez que após tantos anos no ar, os competidores já desenvolveram um bom entendimento do que funciona ou não com os telespectadores.
“Estamos na 21ª edição do programa, dificilmente as atitudes são 100% genuínas, todo mundo tem ideia do que o público se identifica ou não e a partir disso monta o seu jogo. Acho possível criarem personagens para conquistar uma massa”, acrescenta Carlos.
Na avaliação de Julia, alguns traços podem sim ser controlados ao longo de 100 dias. Um exemplo seriam as manifestações de cunho machista e racistas, que dificilmente se revelarão nessa edição, depois das polêmicas do BBB20.
“Acredito que toda pessoa quando chega a um reality, ou em qualquer lugar novo, potencializa aquelas características que julga melhores ou mais convenientes. Algumas conseguem se manter, mostrando outras facetas, claro, mas rapidamente retornando ao que julgam mais adequado”, conclui Julia.
Essa música da Manu é sobre o Fiuk? #BBB21 pic.twitter.com/1qInh4FeZW
— Vai Desmaiar (@vaidesmaiar) January 29, 2021