Além da ficção: produções true crime alteram cursos de julgamentos
Após produção, o destino de Erik e Lyle Menendez pode ser alterado nos tribunais. Porém, outras obras afetaram resultado de crimes reais
atualizado
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Erik e Lyle Menendez podem ter a pena, definida como prisão perpétua sem direito à condicional, alterada após uma produção sobre Os Menudos, que eram agenciados por José Menendez. Apesar de parecer inusitada essa interação “invertida” entre o ficcional e o real, a situação não é novidade e já aconteceu no Brasil.
No caso dos irmãos Menendez, que assassinaram os pais a sangue frio, a defesa foi focada nos abusos sexuais sofridos pela dupla. Mesmo assim, eles foram obrigados a ficar atrás das grades pelo resto da vida. Porém, durante o documentário Menéndez + Menudos: Boys Betrayed, o ex-membro do grupo Roy Rosselló afirmou ter sido molestado por José.
A declaração levou o promotor de Los Angeles, George Gascón, a reavaliar o caso, marcando uma nova audiência para o dia 29 de novembro. Com isso, Erik e Lyle podem ganhar a chance de um novo julgamento ou uma revisão da sentença, o que poderia alterar a acusação para homicídio culposo.
Outros casos
Esse não é o único caso em que uma produção audiovisual influenciou o desfecho ou reabertura de um caso judicial. No Brasil, o desaparecimento de Evandro Ramos Caetano, de 6 anos, em 1992, foi reexaminado graças ao trabalho do jornalista Ivan Mizanzuk.
Por meio de um podcast e uma produção sobre o caso, Mizanzuk revelou gravações de áudio que mostravam que Beatriz Abagge, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira, condenados pelo crime, haviam sido torturados para confessar. Os registros levaram a uma reviravolta no processo e a uma retratação do Ministério Público.
Nos Estados Unidos, o cantor R. Kelly viu sua vida mudar drasticamente após o lançamento do documentário Sobrevivendo a R. Kelly, da Netflix. Apesar de ter sido absolvido em 2008 de acusações de pornografia infantil, a produção trouxe à tona depoimentos de várias mulheres que foram vítimas de seus abusos sexuais. Em 2019, novas acusações surgiram, e, em 2021, ele foi condenado por extorsão, tráfico sexual, pornografia infantil e aliciamento de menores.
Outro exemplo de reviravolta promovida por uma obra de mídia foi o caso de Adnan Syed, que teve sua condenação anulada após a exposição do caso no podcast Serial, em 2014. Syed havia sido condenado à prisão perpétua pelo assassinato de sua ex-namorada Hae Min Lee em 1999. No entanto, a Suprema Corte de Maryland, em uma decisão posterior, restabeleceu a condenação, alegando erros processuais na anulação da sentença.
Objetivo é trazer novos detalhes à tona, diz jornalista
No Brasil, o jornalista e roteirista Ullisses Campbell, conhecido por suas obras sobre crimes reais, como os casos do Maníaco do Parque, Suzane Von Richthofen, Elize Matsunaga e Flordelis, afirmou que o objetivo de um jornalista ao escrever sobre true crime é justamente causar impacto e, muitas vezes, reabrir casos ou trazer à tona novos detalhes.
“Sempre que um livro ou filme consegue modificar a percepção sobre um crime, isso é muito válido”, explicou Campbell em entrevista ao Metrópoles. “Quando escrevo um livro, procuro trazer novidades que vão além do que já foi divulgado”, acrescentou.
No caso específico dos irmãos Menendez, Campbell ressaltou que presos têm o direito de pedir a revisão de suas penas, mesmo sem a existência de uma série documental. No entanto, ele reconhece que produções como a que envolveu o caso Menendez podem servir como catalisadoras desse processo. “Eles aproveitaram a série que expôs a vitimização dos dois irmãos e a demonização das vítimas para solicitar a revisão da pena. E acho isso válido”, comentou.
Por fim, Campbell destacou que obras desse tipo têm o poder de engajar o público e despertar emoções, o que as torna uma ferramenta poderosa para trazer à tona questões relevantes e gerar discussões.