Fazer compras é uma brincadeira para crianças?
Na TV e nas redes sociais o bombardeio da publicidade sobre os pequenos é intenso. Nós, pais e responsáveis, precisamos estar atentos
atualizado
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Preocupada, uma mãe comentou comigo que abriram uma loja de famosa marca de artigos esportivos nas dependências do colégio onde o filho estuda. O menino tem 9 anos.
A escola justificou que a loja nas instalações facilitaria a vida dos pais, afinal, ninguém tem tempo de fazer compras.
Para muitos pais, isso foi uma mão na roda. Esta mãe, no entanto, pensa diferente: para ela, foi uma ação completamente irresponsável da escola, uma vez que foi feita sem consulta prévia aos responsáveis pelos alunos.
Ela está certa. A principal preocupação é o consumismo na infância e como ele é fomentado.
Tornei-me mãe há pouco e sou bombardeada por propagandas a toda hora. Se os adultos têm dificuldades em resistir a inúmeras ofertas, imaginem os pequenos. Afinal, era necessário abrir essa loja em um colégio?Os valores que constituem e formam nossos filhos são desenvolvidos no dia a dia e o consumismo é uma variável de grande impacto. Infelizmente, essas crianças são assíduas telespectadoras do YouTube, no qual propagandas de bonecas, carrinhos, comida, bebidas, concursos de beleza e viagens para parques de diversão são apresentados em quase todos os canais que os pequenos assistem.
Será que os pequenos têm estrutura emocional para lidar com valores que ainda estão sendo construídos? Diga, você, que é um adulto: é fácil lidar com a vaidade? Com a vontade de comprar o tempo todo? Resistir ao refrigerante com propagandas lindas de Natal? Não adquirir aquele item de luxo que todos do seu círculo de amizade estão comprando?
Então… Imagine o quão difícil é para o seu filho.
Parte da personalidade de adultos pródigos, ansiosos, que sofrem com obesidade ou depressão foi influenciada intensamente pela relação estabelecida com o consumo quando eram pequenos.
Não imagine que os anunciantes terão ética e preocupação com o desenvolvimento saudável da criança. Eles já descobriram que quem manda no consumo de casa são elas. O bombardeio da publicidade é direcionado aos pequenos.
Em 2014, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), órgão vinculado à Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República, lançou uma resolução proibindo a publicidade direcionada a crianças. Segundo a Resolução nº 163/2014, “a prática do direcionamento de publicidade e comunicação mercadológica à criança com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço é abusiva e, portanto, ilegal”. A medida é ótima e ajuda muito, mas não resolve.
O Conanda sabe das consequências nocivas que o consumo infantil impõe. Porém, no meu entendimento, como especialista em educação, o mundo sempre trará desafios à sociedade. Cabe às famílias exercerem o dever de proteger os filhos com amor, informação e intimidade.
A psicóloga Viviane Daemon ensina: “Crianças devem ter acesso à internet, às redes sociais, a vídeos e jogos com supervisão. Mesmo que você não esteja acompanhando literalmente com elas o que está sendo assistido ou jogado, permaneça no mesmo ambiente, fique atento ao que está na tela”. É nesse momento de interação que o bombardeio encontra uma brecha.
Na internet, uma das febres atuais é o chamado unpacking (desembrulhar). Trata-se de vídeos de blogueiros (inclusive infantis) que mostram aos seguidores os presentes que eles ganharam de graça de marcas famosas. A prática é especialmente perversa para o imaginário infantil (a boneca, o carrinho e o tênis da moda).
Viviane Daemon lembra que não basta apenas controlar o tempo que as crianças navegam na internet – é importante também filtrar o que é visto por elas no mundo virtual. O mesmo serve para estímulos ao consumismo no nosso dia a dia – fora da internet, na vida off-line. Ou seja: é importante filtrar o bombardeio de consumo dos pequenos. É aí que está o perigo de se instalar uma loja de marca com artigos esportivos da moda em uma escola com crianças tão pequenas.
Assim, é importante que os pais sempre reflitam: nos últimos fins de semana, eu e meu filho frequentamos mais os shoppings da cidade ou os clubes e parques?