Vítimas de feminicídio: conheça mulheres que morreram pelas mãos deles
Em 2018, pelo menos 15 mulheres tiveram a vida interrompida. Na maior parte dos casos, algozes foram os próprios companheiros
atualizado
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Somente em 2018, 15 mulheres foram assassinadas no Distrito Federal. A vítima mais recente, Janaína Romão Lúcio, 30 anos, perdeu a vida de forma covarde, a facadas, e na frente das filhas pequenas. Assassino confesso, Steffanno Jesus Souza de Amorim, 21, está preso.
O crime bárbaro ocorreu em Santa Maria, no sábado (14/7), um dia após as autoridades alemãs divulgarem a prisão de Marcelo Bauer. Há 31 anos, ele matou Thaís Mendonça, 19, sua namorada à época. Foi condenado à revelia em Brasília e, agora, sua impunidade chegou ao fim.
Os casos se assemelham não só pela brutalidade e covardia. O modo como os assassinos agem é parecido. Segundo especialistas, os algozes, geralmente pessoas com quem as vítimas se relacionam, começam com pequenas exigências, cenas de ciúmes, cobranças, brigas seguidas de presentes e pedidos de desculpas com promessas de mudanças.
Acuadas e sob constante ameaça, em geral, as mulheres optam por não fazer a denúncia quando ocorre a primeira agressão. Depois, é um caminho sem volta. O Estado falha no combate à violência e proteção às vítimas. A família, muitas vezes, não consegue evitar consequências mais graves. Assim, as tragédias vêm ocorrendo.
Vítimas
Foi assim com Jessyka Laynara da Silva Souza, 25, morta a tiros pelo soldado da Polícia Militar Ronan Menezes, 27, no dia 4 de maio, em Ceilândia. Extremamente possessivo e controlador, o rapaz não aceitava o fim do relacionamento.
Ameaçava e agredia Jessyka constantemente, e ela, com medo, escondia os hematomas usando maquiagem. “Era para eu estar enterrada agora. Ele me espancou tanto, tanto. Me deu tanto chute, soco, coronhada. Rasgou minha cabeça”, contou a moça, em áudio enviado para uma amiga. Agora, a mãe da vítima, a técnica de enfermagem Adriana Maria da Silva, 39 anos, chora a perda da filha.
Ele é um covarde. Deu dois tiros no peito dela (de Jessyka) e um nas costas. Quero que pague pelo que fez, mas nem 100 anos de cadeia vão trazer a minha filha de volta
Adriana da Silva
Parentes da vítima disseram ainda que só tomaram conhecimento das agressões após a morte da jovem, por meio de uma amiga para quem ela costumava desabafar. Segundo o relato da testemunha, Ronan Menezes dizia para a ex-companheira que, caso ela fizesse a denúncia ou tentasse fugir, mataria toda a família dela.
A irmã de Janaína, Cleire Romão, 29, diz que o medo dos agressores é o que faz com que as vítimas optem por não denunciar. “Minha irmã tomou essa atitude, mas foi ameaçada e acabou retirando a queixa. Ele a perseguia”, disse.
Em 6 de março, outro caso de feminicídio chocou o DF. A funcionária do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) Romilda Souza, 40, foi morta a tiros pelo marido e ex-vigilante Elson Martins da Silva, 39, que se suicidou em seguida, na 406 Sul.
Dez dias depois, Mary Stella Maris Gomes Rodrigues dos Santos, 32, também foi alvo de tiros disparados pelo marido, o piloto do Metrô-DF Júlio César dos Santos, 38, que também se matou em seguida em Ceilândia. Segundo vizinhos, o casal estava se divorciando e tinha uma relação abusiva. “Eles brigavam muito, mas não era uma discussão normal. Sempre tinha muito xingamento, objetos atirados um contra o outro“, disse uma testemunha.
Em 5 de abril, a advogada Jusselia Martins de Godoy, 50, foi alvo de três tiros disparados pelo ex-marido, Evandro Alves de Faria, 56, em Planaltina. Ela chegou a ficar internada no Hospital de Base, mas não resistiu e veio a óbito cinco dias depois. Após o crime, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil — Seccional do Distrito Federal (OAB-DF), Juliano Costa Couto, se manifestou lamentando a morte de Jusselia e repudiando a violência contra as mulheres.
“A OAB-DF repudia qualquer prática de violência. Não existe justificativa para crimes como esse. Fica nosso extremo pesar e desejo de que nenhuma mulher seja vítima de crimes bárbaros”, disse.
Outro caso bárbaro e que poderia ter sido evitado foi o de Tauane Morais dos Santos, 23, esfaqueada até a morte pelo ex-companheiro Vinícius Rodrigues de Sousa, 24, no dia 6 de junho, em Samambaia. O homem cometeu o crime um dia após ser solto por agredir a jovem.
Na época, o juiz Aragonê Nunes Fernandes, que proferiu a decisão, disse não ter “bola de cristal” para prever a tragédia. Um irmão da vítima relatou o quanto Vinícius era possessivo. “Ele a agredia muito. Chegou a quebrar tudo dentro de casa”.
No dia 22 de fevereiro, a vítima foi a aposentada Isabel Lino de Souza, 60, assassinada pelo próprio filho Fernando, 33. O homem usou um guidão de bicicleta e a espancou até a morte. Na carceragem da 27ª Delegacia de Polícia, disse que assassinou brutalmente a idosa por questões financeiras. “Burrice da cabeça”, afirmou o homem, indiciado por feminicídio. Já Cristiane do Nascimento Mendes, 35, levou diversas facadas pelo corpo após uma discussão em um bar com dois homens, no dia 28 de junho, em São Sebastião.
Entre as vítimas, apenas duas pediram medida protetiva à Justiça. Janaína chegou a ter o direito garantido, mas retirou o pedido feito à Justiça. Atualmente, dos 143 presos que usam tornozeleiras eletrônicas no Distrito Federal, 21 cometeram violência doméstica e têm o equipamento preso ao corpo para se manterem distantes de suas vítimas.
Alerta
A presidente do Instituto Personna de Estudos e Pesquisas em Violência e Criminalidade, Elisa Waleska Krüger Costa, alerta: ao primeiro sinal de violência, denuncie. “A mulher não deve tentar ser psicóloga do agressor, dando conselhos ou justificando seus comportamentos”, afirma.
Mas não basta apenas denunciar. O Estado também precisa ter uma rede de proteção e de combate à violência eficientes para evitar que mais tragédias ocorram. É o que diz a professora adjunta de Direito da UnB Janaína Penalva.
“É necessário que a mulher se coloque em um espaço mínimo de resistência, denunciando ameaças — quando há tempo para isso –, mas ainda que ela denuncie, não evitará o crime se o Estado não se mobilizar para protegê-la. O que evita o feminicídio é a resposta estatal à violência”, assegura.
Denuncie
Pelo número 180. As ligações são gratuitas e o serviço funciona 24 horas. Na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam), localizada na 204/205 Sul, ou pelo disque-denúncia da Polícia Civil, no número 197.