Vítima de feminicídio, Adriana levou 32 facadas. Marido é suspeito
Imagens do circuito de segurança do prédio onde ocorreu o crime mostram casal chegando e homem saindo sozinho com saco nas costas
atualizado
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O suspeito de matar com pelo menos 32 facadas Adriana Maria de Almeida, 29 anos, já tinha agredido e tentado assassinar a mulher antes. Constam na Polícia Civil outras duas ocorrências de Lei Maria da Penha contra ele. Há quatro anos, o homem foi, inclusive, preso após tentar esfaquear a companheira. Acabou solto no dia seguinte. O outro caso ocorreu em 2017.
A polícia confirmou, no começo da tarde desta segunda-feira (30/09/2019), o nome do suspeito: Wellington de Sousa Lopes, 37. E também deu informações sobre o carro no qual ele teria fugido, o Palio Fire Economy, cor prata, placa JHZ 3082-DF. Segundo investigadores, atualmente, o homem usa barba.
O casal, de acordo com relatos de vizinhos na 29ª Delegacia de Polícia (Riacho Fundo), se relacionava havia cinco anos e tinha uma filha pequena, de 4 anos, que teria entrado no meio da briga dos pais, em 2017, evitando que o acusado desferisse golpes de faca na mãe.
Adriana chegou a pedir medida protetiva contra o companheiro, mas retirou a solicitação, segundo informou o investigador Mauro Aguiar Machado, delegado-chefe da 29ª DP, que apura o caso. De acordo com familiares, o relacionamento deles era conturbado, sobretudo por que o suspeito teria ciúmes da parceira. No entanto pessoas que residem próximo ao imóvel dos envolvidos dizem que o casal “parecia tranquilo e unido”.
Na manhã desse domingo (29/09/2019), vizinhos ouviram gritos e objetos sendo quebrados no apartamento que foi palco do assassinato investigado como feminicídio, no Riacho Fundo. Depois, o som alto do rádio abafou a discussão entre o casal, que morava havia pouco tempo no Conjunto 4 do Setor Placa das Mercedes. Doze horas depois, o corpo de Adriana foi achado.
Imagens do circuito de segurança do prédio mostram os dois chegando na noite de sexta (22/09/2019). Eles aparentavam estar tranquilos. Depois, o suspeito sai por volta das 9h de domingo (29/09/2019). Ele parecia estar apressado e carregava um saco preto grande nas costas.
O crime chocou a vizinhança. Segundo testemunhas, o casal vivia em regime de união estável. “Conhecia os dois de vista, a gente se cumprimentava. A primeira briga que escutei foi ontem [domingo]. Eram vários gritos, mas não consegui ouvir as palavras. Tinha também barulho de coisas quebrando. Depois, colocaram um som muito alto e pensei que estava tudo bem. Veio um silêncio em relação à discussão. O som ficou ligado na rádio o dia todo, bem alto. O que causou o estranhamento foi isso”, relata uma pessoa que mora no prédio.
A vizinha lembra que o ventilador ficou em cima do corpo de Adriana, achado no quarto. Ela diz que havia muito sangue no chão. A faca foi encontrada no banheiro. O companheiro teria fechado todos os vidros. “Não tinha nada aberto, coisa que não ocorria, pois as janelas ficavam abertas”, pontua a mulher. Desconfiados após o som ficar ligado o dia inteiro em um volume alto, os moradores do edifício acionaram os familiares do casal. Um chaveiro conseguiu abrir a porta.
Paulo Romero, 51, também mora no prédio. O professor de música conta não ter visto nem ouvido nada de anormal, mas relata que viu as pessoas apavoradas no andar debaixo e logo desceu, foi quando soube da tragédia. “É muito triste saber o que houve. Eles têm uma filhinha de 4 anos”, lamentou.
“Eles pareciam ser tranquilos. Fico preocupada com a filha deles, tão pequena… Agora, é esperar as providências da Justiça”, comentou outra vizinha. Se confirmado, este é o 24º feminicídio registrado no Distrito Federal e um dos seis assassinatos ocorridos no domingo na capital do país.
Na quinta-feira (26/09/2019), outra mulher foi assassinada no Distrito Federal. O crime ocorreu entre 6h e 6h30 na comunidade de Catingueiro, na região da Fercal. Queila Regiane Jane, 42, também foi morta a facadas. Horas depois, o suspeito foi preso. Os investigadores acharam Iron da Cruz Silva, 37, que já tinha passagem por tentativa de homicídio, em um assentamento a 25 km de casa. Ele viveu com a vítima por 20 anos. O casal tem duas filhas.
“A gente imagina que os primeiros golpes de faca tenham sido desferidos com a vítima ainda dormindo. A filha de Queila de 13 anos estava no quarto ao lado no momento, então pode não ter havido discussão entre o casal antes”, destacou o delegado Laércio de Carvalho, da 35ª DP (Sobradinho II). No momento em que foi preso, o assassino confesso não demonstrou arrependimento pelo feminicídio.
A motivação do crime teria sido ciúmes. “Ele fazia comentários de forma vaga: ‘Ela está trabalhando fora, tendo amizades diferentes…’”, destacou o policial. Após esfaquear a mulher, Iron tirou a adolescente e a levou para a casa da outra filha, casada e de 18 anos, que mora na mesma rua dos pais. “Disse para ela ficar com a irmã porque a mãe estava passando mal e iria providenciar socorro”, detalhou o investigador.
Foi nesse momento que os familiares ouviram os gritos de Queila e correram para a casa dela. Acharam o corpo da mulher na cozinha, quase sem vida. Uma vizinha acionou a polícia. A delegacia se mobilizou para chegar até a área rural. Teve apoio aéreo para fazer o cerco e de aproximadamente 40 policiais. Por volta das 17h, a equipe conseguiu prender Iron. No imóvel, foi encontrado um martelo – que a PCDF acredita ter sido usado pela vítima para tentar se defender. “Ela andou a casa inteira, que está repleta de sangue”, informou o delegado.
Neste 2019, o Metrópoles iniciou um projeto editorial para dar visibilidade às tragédias provocadas pela violência de gênero. As histórias de todas as vítimas de feminicídio do Distrito Federal serão contadas em perfis escritos por profissionais do sexo feminino (jornalistas, fotógrafas, artistas gráficas e cinegrafistas), com o propósito de aproximar as pessoas da trajetória de vida dessas mulheres.
O Elas por Elas propõe manter em pauta, durante todo o ano, o tema da violência contra a mulher para alertar a população e as autoridades sobre as graves consequências da cultura do machismo que persiste no país.
Desde 1° de janeiro, um contador está em destaque na capa do portal para monitorar e ressaltar os casos de Maria da Penha registrados no DF. Mas nossa maior energia será despendida para humanizar as estatísticas frias, que dão uma dimensão da gravidade do problema, porém não alcançam o poder da empatia, o único capaz de interromper a indiferença diante dos pedidos de socorro de tantas brasileiras.