Viciado “torrou” herança de R$ 250 mil em drogas
Filho de servidores públicos e morador da Asa Norte, jovem começou a usar drogas aos 14 anos e era abastecido por traficante preso pela Cord
atualizado
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O drama de uma família da Asa Norte se esconde por trás da prisão de um traficante e a apreensão de 20 gramas de crack, R$ 2 mil em espécie e uma arma falsa.
Um jovem de 24 anos, filho de servidores públicos, e viciado em crack, gastou toda a herança que recebeu após a morte do pai em drogas. O valor, estimado em R$ 250 mil, desapareceu das mãos do rapaz após ele receber o dinheiro da mãe para que “tomasse jeito”. Um carro da família, modelo VW Up! também foi dado ao traficante como pagamento de uma suposta dívida de drogas e para deixar a família em paz.
*Felipe não estudava nem trabalhava. Ele começou a usar entorpecentes ainda adolescente. Primeiro, experimentou maconha. Depois, passou para drogas mais pesadas até se entregar ao vício pelo crack. Ele esteve internado em uma clínica de reabilitação no Entorno do DF por diversas vezes, mas sempre deixava de lado o tratamento e procurava novamente o traficante. O jovem de classe média, por diversas vezes, precisou ser resgatado nas cracolândias de Brasília.
O caso é explicado pelo delegado Erick Sallum, da Coordenação de Repressão às Drogas (Cord) e responsável pela prisão do traficante que abastecia o vício de Felipe. Segundo ele, o bandido vendia crack entre as quadras 714/715 Norte, próximo à casa da família que extorquia. Tinha como público prioritário as pessoas que procuravam serviços sexuais de prostitutas e travestis no conhecido ponto de prostituição da W3 Norte.
A Cord geralmente atua em investigações envolvendo grandes quantidades, mas, quando tomamos conhecimento de um caso nesse contexto, nos comovemos. Fica aqui o alerta para que as famílias prestem atenção nos seus filhos porque, depois que entra, é difícil sair [do vício]. A droga é um vírus que se espalha para a família inteira
Erick Sallum, delegado da Cord
Ameaças e extorsão
A informação sobre o traficante, seu modo de agir e a extorsão à família de Felipe chegou à Cord pela clínica Salve a Si, com sede na Cidade Ocidental (GO), onde o jovem morador da Asa Norte esteve internado em várias ocasiões. O fundador do lugar, Henrique França, foi quem entrou em contato com a Polícia Civil para relatar o caso.
“Ele era frequentador do hotel da droga [prédio abandonado do Torre Palace] e me mostrou o lugar. Quando o traficante chegou até a casa dele para cobrar mais dinheiro, eu disse que era a última vez que iria receber, se não denunciaria para a polícia”, detalha França.
O fundador da clínica é ex-usuário e ex-traficante e hoje atua como representante da sociedade civil no Conselho de Política Antidrogas do DF. Conhece bem o universo – e os dramas – de quem se vicia em psicotrópicos. “Já fui pego com 15 quilos de cocaína em Paris e cumpri três anos lá. Não tenho medo de bandido”, disse. “Ele [o traficante] ia lá [na casa da família da Asa Norte] ameaçar todo mundo, até a avó de 92 anos do cara. Já pegou dinheiro, carro e joias da família”, revela.
Polícia à espreita
No momento da prisão, em uma rua do Gama, o criminoso estava com o carro da vítima. Ele era acompanhado de perto por dois agentes da Cord que, quando perceberam a situação favorável para a prisão, solicitaram o reforço de mais oito policiais e conduziram o homem para a carceragem do Departamento de Polícia Especializada (DPE).
O traficante possui passagens por roubo e tráfico. Ele passou por uma audiência de custódia nesta segunda-feira (27/8) e teve a prisão em flagrante convertida em preventiva, dado o risco do criminoso para os familiares de Felipe na continuidade dessas investigações.
O delegado da Cord conta que pediu a prisão preventiva também a fim de que outras vítimas tenham coragem de comparecer à delegacia para prestar depoimento. Segundo Erick Sallum, a mãe e os avós de Felipe sequer queriam denunciar o caso, por temerem represálias.
“O cara instrumentalizava o jovem viciado. Como o rapaz não conseguia se livrar do crack, procurava quem o fornecesse. Ele gastou R$ 250 mil de herança e pedia dinheiro aos avós. Os dois davam porque preferiam o neto em casa do que usando crack nas ruas”, narra Sallum.
Quando o carro de Felipe foi tomado pelo traficante, inicialmente a família não passou a propriedade do veículo. Mas, ao começar a chegar dezenas de multas no endereço da mãe do jovem, os parentes de Felipe pediram ao traficante a mudança do nome do proprietário no documento. O bandido, então, passou a titularidade do automóvel para a mulher. “Por isso, ele responderá, também, por lavagem de dinheiro”, diz o delegado. O veículo será colocado à disposição da Justiça.
Após a prisão do homem responsável pelo fornecimento de crack, Felipe foi novamente encaminhado para uma clínica de reabilitação.
*A reportagem utilizou um nome fictício para o jovem com vício em crack por recomendação da Polícia Civil. O nome do traficante não foi revelado pela Cord, pois a investigação ainda está em andamento.