“Um monstro destruiu a vida dele”, diz pai de homem morto por sargento
Francisco, 41 anos, foi assassinado nessa quarta (12/06/2019) por Juenil Queiroz, 56, militar reformado da FAB. Os familiares pedem justiça
atualizado
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“Nunca pensei que teria um filho tão humilhado, barbaramente assassinado por um cidadão que se diz um sargento da Aeronáutica”, revolta-se Francisco de Assis, 70 anos. Ele é pai de Francisco de Assis Pereira da Silva (foto em destaque), 41, morto, na quarta-feira (12/06/2019), com dois tiros disparados por Juenil Bonfim de Queiroz, 56, em um apartamento no Cruzeiro Novo. Após alvejar o rapaz, o militar reformado atirou três vezes contra a própria esposa, Francisca Naídde de Oliveira Queiroz, 58, que morreu na hora. O homem acusava as vítimas de terem um caso extraconjugal.
O pai do rapaz mora em Teresina, no Piauí, cidade natal da família, onde o corpo foi encaminhado para sepultamento, na tarde desta sexta-feira (14/06/2019). “A despedida que eu tenho do meu filho é profunda. Deixa um vazio tão grande no meu coração.”
A dor dele vem também da acusação imposta pelo assassino. Segundo familiares, Francisca era apenas conhecida de Francisco. Sabendo que o rapaz estava sem emprego fixo, ela teria se oferecido a ajudá-lo financeiramente e feito algumas viagens, como cliente do aplicativo em que ele trabalhava como motorista.
Considerada uma pessoa muito religiosa, Francisca tinha como característica gostar de cuidar das pessoas e ser uma espécie de “mãezona”. Ela e o marido conheceram Francisco e o companheiro dele, Marcelo Soares Brito, 40, há três anos, desde que se mudaram para o mesmo prédio.
“Só tenho a dizer que espero justiça em cima disso. De minha parte, está perdoado, mas ele [Juenil] precisa pagar pelo que fez: crime de feminicídio e tirou a vida do meu filho. Esse militar é um psicopata, um criminoso, alguém que precisa de tratamento”, declarou o pai.
Vídeo
O duplo homicídio foi gravado pela única testemunha ocular dos crimes. Em quase nove minutos de filmagem, a câmera do celular de Marcelo não capta imagens do momento dos crimes, mas é possível escutar toda a ação. A sensação de terror é crescente até chegar à barbárie, quando o sargento da Força Aérea Brasileira (FAB), atira na cabeça de Francisco e contra a própria mulher.
Veja os vídeos do crime:
Amável
Segundo conhecidos, Francisco não tinha inimigo algum. Sua personalidade amável lhe rendia novos amigos por onde passava e era motivo de orgulho para a família. “Era um menino muito bom, prestativo e comunicativo. Todo mundo gostava dele”, resume a irmã dele, Marcilene Oliveira, 39.
Em 16 de maio, Francisco comemorou o aniversário com os amigos. Há cinco anos, ele saiu de Belo Horizonte para o Distrito Federal, onde passou a viver com Marcelo. Na capital, se dedicava aos estudos: comparecia em cursos variados, como gastronomia e nutrição. Sua formação original era a em recursos humanos.
“A gente quer que a justiça seja feita. E bem feita. Ele [Juenil] tirou a vida de duas pessoas. Os vídeos provam que Francisco estava sendo acusado sem provas, e que o assassino já estava planejando tudo”, disse a irmã. “Estamos sem chão. Completamente abalados”. Ela conta que a mãe chegou a ter perda de memória e está sob o efeito de remédios.
O corpo de Francisco chegou na tarde desta sexta-feira (14/06/2019) em Teresina para o velório. De acordo com a família, todos os pertences dele serão doados a pessoas necessitadas. O pai destaca que não precisa dos bens materiais do filho, e sim de suas lembranças.
“Vai ficar na minha memória para sempre. Um filho que criei e eduquei para que o mundo tomasse conta dele, mas chegou esse monstro e destruiu sua vida. Espero que ele tenha um grande arrependimento”, lamenta o pai.
Ainda atônitos com tamanha tragédia, familiares e amigos se despediram de Francisca nesta manhã. Ela foi velada e enterrada no Cemitério Campo da Esperança da Asa Sul. Abalados, eles não se pronunciaram sobre a morte da mulher. Durante a despedida de Francisca, os presentes ao velório fizeram uma oração antes de seguirem em cortejo até a sepultura.
O crime
Juenil, o “Seu Queiroz”, era considerado tranquilo e educado. Ele e a mulher eram sempre vistos na rua passeando com o cachorro. No entanto, dentro de casa, era ciumento e violento. Francisca chegou a se separar do militar e a fazer uma queixa na delegacia, mas acabou voltando a morar com ele no último mês.
Uma prima de Marcelo, que não quis se identificar, presenciou os momentos de terror antes do crime. De acordo com o relato da mulher, Marcelo e Francisco estavam juntos havia cerca de cinco anos. Nunca teria havido desentendimento entre o casal e o sargento, conta a testemunha.
“Os dois vieram aqui para pegar um notebook, e ficamos conversando na parte debaixo do prédio. Nesse meio-tempo, o sargento chegou com a esposa. Ele estava muito nervoso e agitado. Subiu rapidamente, depois desceu armado e chamando o Francisco para subir.”
Insultando Francisco, o militar teria dito a ele: “Sobe agora, que eu vou te mostrar o que é um homem”. Diante das ameaças, Marcelo, Francisco e o sargento foram ao apartamento de Juenil. “Nós chamamos a polícia nesse meio-tempo, mas não deu nem sete minutos e Marcelo desceu correndo, fugindo do sargento, que também correu atrás dele”, relatou.
“O Marcelo está péssimo. Ele viu o Francisco morrer de joelhos”, contou a prima.
O sargento da Aeronáutica acusado de cometer duplo homicídio no Cruzeiro Novo debochou das vítimas após o crime. Depois de atirar e matar a esposa e Francisco, ele teria dito a Marcelo: “Tá vendo o que acontece com homem que mexe com mulher casada?”.
Neste 2019, o Metrópoles inicia um projeto editorial para dar visibilidade às tragédias provocadas pela violência de gênero. As histórias de todas as vítimas de feminicídio do Distrito Federal serão contadas em perfis escritos por profissionais do sexo feminino (jornalistas, fotógrafas, artistas gráficas e cinegrafistas), com o propósito de aproximar as pessoas da trajetória de vida dessas mulheres.
O Elas por Elas propõe manter em pauta, durante todo o ano, o tema da violência contra a mulher para alertar a população e as autoridades sobre as graves consequências da cultura do machismo que persiste no país.
Desde 1° de janeiro, um contador está em destaque na capa do portal para monitorar e ressaltar os casos de Maria da Penha registrados no DF. Mas nossa maior energia será despendida para humanizar as estatísticas frias, que dão uma dimensão da gravidade do problema, porém não alcançam o poder da empatia, o único capaz de interromper a indiferença diante dos pedidos de socorro de tantas brasileiras.