Governo estuda reduzir salários iniciais dos servidores públicos
A ideia é reduzir valores pagos para quem ingressa no serviço público e ampliar a distância em relação à remuneração recebida no final da carreira
atualizado
Compartilhar notícia
A notícia não é boa para os concurseiros de plantão. Sob pressão para reduzir os gastos com a folha de pessoal, o governo federal estuda rever o salário inicial das principais categorias de servidores. A ideia é reduzir valores pagos para quem ingressa no serviço público, considerados altos, e ampliar a distância em relação à remuneração recebida pelo funcionário no final da carreira.
Hoje, os servidores recém-aprovados em concursos públicos recebem salários muito elevados – bem acima dos registrados na iniciativa privada – e, em alguns casos, bastante próximos daqueles que estão no topo da tabela do plano de carreira. No funcionalismo público federal, há salários iniciais que chegam perto de R$ 30 mil. É o caso do consultor legislativo do Senado, que ganha no início de carreira R$ 29,1 mil e, no final, R$ 30,54 mil.
Os integrantes da Advocacia-Geral da União (AGU), da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e das procuradorias dos ministérios e do Banco Central já estão recebendo desde agosto honorários pelas causas ganhas pela União Também serão autorizados a exercer advocacia privada, desde que não sejam causas contra o governo.
Na Receita, que tradicionalmente consegue se organizar com maior força para conseguir acordos mais vantajosos, o salário inicial é de R$ 15,74 mil. Um delegado da Polícia Federal recebe salário inicial de R$ 16,83 mil, enquanto um de fim de carreira ganha R$ 22,81 mil.
“O nível salarial de entrada é muito elevado. Muito maior do que na iniciativa privada”, disse uma fonte da área econômica envolvida na discussões. Uma mudança nessa estrutura é complexa, polêmica e exigirá o envio de projetos de lei alterando as diversas carreiras. Mas, para a área econômica, esse debate ganha força nesse momento.
O economista Pedro Bastos (foto ao lado), professor da Unicamp, acredita que os elevados gastos com pessoal são “desperdício de munição”, principalmente em meio à recessão. Integrante da corrente de economistas favoráveis à expansão do gasto público para atenuar a queda da atividade econômica, o professor avalia que o governo teve a chance de conter esse processo para tentar preservar investimentos, mas definiu prioridades de forma equivocada.
Salários maiores
Os salários de início de carreira no Judiciário e no Legislativo federal são ainda maiores do que nos cargos do Executivo. Levantamento feito pela reportagem, com dados do Ministério do Planejamento, evidencia essas disparidades: enquanto a remuneração básica inicial no Executivo dificilmente ultrapassa os R$ 20 mil mensais, no Judiciário e no Legislativo esse valor serve praticamente de piso.
Um professor do serviço público federal ganha R$ 6,2 mil ao passar no concurso, enquanto um analista da Câmara dos Deputados começa recebendo um salário de R$ 21,5 mil por mês. Um auditor do Tribunal de Contas da União (TCU), que é uma das carreiras mais cobiçadas pelos concurseiros, recebe no início da carreira R$ 18,8 mil. Já um auditor fiscal da Receita Federal tem salário de início de carreira de R$ 15,7 mil.
O presidente do Sindicato Nacional dos Auditores da Receita, Claudio Damasceno, diz que a diferença da remuneração inicial entre as carreiras com os demais Poderes está tirando a atratividade histórica dos cargos da Receita Federal.
Está havendo um êxodo de servidores para outras carreiras de menor complexidade do que a Receita
Claudio Damasceno, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores da Receita
Damasceno cita os casos do TCU e demais carreiras do Judiciário e lembra que, em 2010, pela primeira vez, um concurso público para cargos no Fisco não preencheu todas as vagas. Na Receita, um servidor leva 18 anos para receber a remuneração máxima e passa por 13 níveis. Em relação à intenção do governo de reduzir os salários iniciais, ele disse que os vencimentos iniciais na Receita não são tão elevados e que, se esse estudo for levado à frente, não deverá afetar a categoria.
Administração
Em cargos da área de administrativa, que não representam a atividade-fim, o quadro é semelhante: enquanto um funcionário de Ministério recebe de R$ 5,45 mil a R$ 8,4 mil, um servidor administrativo de uma agência reguladora ganha de R$ 13,1 mil a R$ 18,6 mil.
Na Câmara, as remunerações para a área administrativa são ainda maiores, de R$ 21,5 mil a R$ 27,4 mil. No Senado, ficam entre R$ 22,5 mil e R$ 25,5 mil. São valores que, no caso do Executivo, apenas funcionários das chamadas atividades-fim que estão no final da carreira conseguem receber.
O levantamento mostra ainda que os servidores do Judiciário têm os salários mais elevados em relação aos outros dois Poderes. Os magistrados e procuradores têm remuneração básica, sem os adicionais, de R$ 28,9 mil. O valor é só um pouco maior do que a remuneração de final de carreira de um servidor da área administrativa da Câmara Federal.
Para bancar todos esses salários, que ainda terão reajustes até 2019, o governo teve de abrir uma brecha no texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que institui um teto de gastos. Pela regra geral, todos os Poderes, à exceção do Executivo, já ultrapassariam o limite de despesas na largada. Mas o substitutivo prevê que o Executivo poderá compensar o excedente nos primeiros três anos, a partir da contenção das demais despesas para bancar os aumentos.
Disparidade
Os salários da iniciativa privada ficam muito abaixo da remuneração dos servidores em algumas profissões. Uma pesquisa feito com base em dados da Catho, empresa de recrutamento e seleção, mostra uma disparidade grande entre a esfera pública e privada. Enquanto um professor ganha entre R$ 6,2 mil e R$ 18 mil no funcionalismo público, o setor privado paga, em média, cerca de R$ 1,8 mil. Um professor de matemática, por exemplo, ganha R$ 2 mil.
O mesmo ocorre na área da saúde. Enquanto um perito médico previdenciário ganha entre R$ 11,3 mil e R$ 16,22 mil, um médico-cirurgião ganha, em média, quase R$ 7,1 mil na iniciativa privada. Outro profissional cuja diferença de renda é brutal é o advogado. Na União, o salário desse profissional fica entre R$ 18,28 mil e R$ 23,76 mil. No setor privado, na média, recebem R$ 2,92 mil; se for criminalista, o valor sobe para R$ 3,1 mil e tributarista, R$ 3,5 mil.