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Sem-teto não têm prazo para sair do Clube Primavera

Depois de passar quase uma semana em hotel de luxo, invasores se instalam em Taguatinga. Vizinhos vão acionar MP para retirá-los

atualizado

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Fotos: Rafaela Felicciano/Metrópoles
Rafaela Felicciano
1 de 1 Rafaela Felicciano - Foto: Fotos: Rafaela Felicciano/Metrópoles

A piscina luxuosa com vista para a Esplanada dos Ministérios usada nos dias de calor por integrantes do Movimento de Resistência Popular (MRP), no Hotel St. Peter, foi substituída por uma bem diferente: abandonada, com água parada e em meio a ruínas do clube Primavera, em Taguatinga. Apesar do lodo e da sujeira, adultos e crianças insistiram em passar a manhã desta segunda-feira (21/9) pescando. “Já peguei três peixes”, disse orgulhoso Pedro Brasil, 39 anos, enquanto arrumava o anzol sem isca.

Do luxo ao lixo, os invasores não se aborreceram com a mudança. Pelo empenho do Governo do Distrito Federal em arrumar o local, a estada dos hóspedes no novo espaço não será tão curta. Uma nova reunião entre invasores e integrantes do GDF está agenda para esta terça-feira (22). 

 

Integrantes do MRP ocupam área do clube Primavera *Rafaela Felicciano/Metrópoles**
Clube estava fechado há 25 anos. Área suja e abandonada

A reportagem do Metrópoles percorreu a área destinada para os invasores. Entrevistas foram interrompidas por coordenadores do movimento sob alegação de que os integrantes poderiam se confundir ao explicar a situação. “Eles não sabem o que dizem, podem falar algo de forma equivocada. Se você tem dúvida, fala diretamente com os coordenadores”, disse um dos responsáveis pelo grupo.

Apesar do calor – e da ausência do ar-condicionado que ajudou a amenizar a temperatura nos dias de ‘hospedagem’ no St Peter –, as famílias se empenharam em fazer uma faxina na construção desgastada pelo tempo. Alguns mostravam com orgulho o espaço que seria o quarto e sala da moradia improvisada, outros preparavam o almoço do grupo na cozinha ou em um fogão a lenha. O cardápio se restringe a arroz e macarrão, fruto de doações.

Doações garantem o almoço dos sem-teto

Com energia, mas sem água
Barracas de acampamento estão instaladas em toda área verde do clube. Os acampados já contam com energia. A água será fornecida em breve pela Caesb. Saber improvisar é pré-requisito para quem adere ao movimento. A água de uma nascente é usada para dar banho nas crianças e lavar panelas; garrafas PET, quando cortadas, servem como pratos e copos.

Os dois vigilantes que trabalhavam no clube foram substituídos por guardas do movimento. “São pessoas de confiança e antigas no MRP, eles se revezam em turnos e só deixam entrar pessoas autorizadas pelos coordenadores”, explica Solange Oliveira, 36 anos, que também responde pelo MRP. Com um filho e grávida de três meses, a mulher se mostra satisfeita com a situação do grupo.

 

Solange Oliveira, integrante do MRP *Rafaela Felicciano/Metrópoles**
Solange, uma das líderes do movimento, diz que lista de nomes já está com GDF

 

“Uma equipe da Terracap já veio cortar a grama e, em breve, deve demarcar os terrenos para cada família construir um barraquinho”, completou. De acordo com Solange, a relação de nomes das famílias inscritas na Codhab já foi enviada para o GDF. Apesar do movimento alegar que todas as famílias possuem cadastro, a reportagem localizou integrantes que disseram não ter o registro de inscrição.

Cobras encontradas
Com mais de 90 crianças, o acampamento exige atenção redobrada dos adultos. Três cobras foram encontrada pelos sem-teto. Reclamações sobre furtos também são recorrentes entre os invasores. “Já pegaram minha pasta de dente, colher, pratos e lençol. Quando estávamos lá no hotel, tive que trancar minha mochila em um dos banheiros e quebrar a fechadura, estou aprendendo umas artimanhas para driblar a situação”, desabafou uma integrante que não quis se identificar.

 

*Rafaela Felicciano/Metrópoles**
A ducha quente do hotel foi substituída pelo banho de lata

 

Sobre a situação dos acampados, Francinaldo Silva, um dos coordenadores, afirmou que, na medida do possível, tenta atender solicitações e reclamações. “Conversamos com eles para evitar possíveis  problemas. O movimento é formado por famílias carentes e honestas. Não levamos nada do hotel, não vamos pagar essa conta”, destacou. Uma nova reunião entre o movimento e o GDF está agendada para esta terça-feira (22/9), no Palácio do Buriti.

O governo entendeu que nosso movimento é legítimo, já regularizamos a situação do MRP e estamos cooperando.

Francinaldo Silva, coordenador do movimento

Polêmica na vizinhança
A chegada dos sem-teto em Taguatinga não agradou aos moradores da QSC 17, região vizinha ao Primavera. Na noite desse domingo (20), eles tentaram impedir a entrada do grupo com barreiras de pneus queimados. A estratégia não deu certo e o tumulto tomou conta do local. A polícia teve de conduzir o comboio de sem-teto para os fundos do clube, onde há uma entrada alternativa. Insatisfeitos com a manobra, os moradores seguiram os veículos, mas não conseguiram evitar a entrada deles no terreno.

 

Lúcio Costa , morador de Taguatinga* Rafaela Felicciano/Metrópoles**
Lúcio Costa, morador da área vizinha ao clube, reclama de insegurança


Durante a madrugada os vizinhos afirmaram que os invasores tentaram arrombar o portão que dá acesso à rua da QSC 17. Diante do impasse, os moradores tiveram que soldá-lo. “Minha família está preocupada com a nossa segurança. Tentaram entrar aqui em casa para assaltar e chamamos a polícia”, disse o biólogo Lúcio Costa, 43. Ele conta que contratou uma empresa para instalar alarme e câmeras de segurança na residência.

O estudante Guilherme Rangel, 21, também se mostrou insatisfeito com os novos vizinhos. “A sensação é de insegurança”, desabafou. Os moradores da região recolheram 100 assinaturas e acionaram o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), alegando que a região ocupada pelo MRP tem alto valor de preservação ambiental e não pode ser ocupada.

Sobre o clube
O Clube Primavera fez sucesso em Taguatinga desde sua inauguração, em 1972. Nos anos 1980, vivia cheio e o público aproveitava o período de calor escaldante tomando sol e banhando-se nas três piscinas do endereço. Por conta de obrigações trabalhistas não cumpridas pela direção, o Primavera fechou as portas em 2004. O local encontra-se abandonado desde então.

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