Sem creches perto de casa, mãe enfrenta rotina em 6 ônibus por dia
Já outra responsável não conseguiu administrar a dura rotina e tirou o filho do colégio. Secretaria diz que vai construir mais escolas
atualizado
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Para mães de baixa renda, não conseguir vagas em creches perto de onde moram pode significar uma rotina desgastante, ou pior, o abandono do ano letivo e consequente defasagem escolar para as crianças. É o que acontece com duas moradoras de zonas rurais vizinhas no Riacho Fundo II que tiveram os filhos contemplados em escolas no Recanto das Emas, cidade onde fica a sede da regional de ensino.
A auxiliar de serviços gerais Raquel da Silva, 22 anos, sente na pele o que é não ter o filho matriculado perto de onde reside. Todos os dias, a mãe de Paulo Henrique, 4 anos, e Mateus, 2, precisa pegar seis ônibus para que o mais velho consiga frequentar a creche. Ela acorda às 6h e sai da zona rural Caub II com as duas crianças até o Recanto das Emas, onde deixa Paulo Henrique e volta com Mateus.
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No entanto, a creche só funciona por meio período. Então, às 12h, ela toma mais uma vez o percurso de ida e volta do ônibus que liga as duas regiões, ainda acompanhada do filho mais novo para buscar Paulo Henrique. Já exausta, a mãe ainda precisa sair de casa, por volta das 15h e conseguir dinheiro no emprego temporário de auxiliar de serviços gerais num restaurante da região, mais uma vez usando o transporte público.
“É muito difícil ele estar estudando longe: gasto muito com passagem pra ir e voltar. Não tenho essa condição toda de estar levando e trazendo. Já recorri à Regional, ao Cras, em muitos lugares, mas nada adiantou. Dizem que está lotado e não tem vagas nas escolas. Já estou pensando em desistir”, desabafou a mãe.
Ao todo, a região de ensino à que pertence o Riacho Fundo II tem quatro Centros de Educação da Primeira Infância, os Cepis, mas todos eles ficam no Recanto das Emas. Apesar de as duas cidades serem vizinhas, separadas pela DF-001, na prática, o morador do Riacho Fundo precisa andar 5,8 km para deixar o filho na creche pública mais próxima, o Cepi Beija Flor, isso se a unidade de ensino tivesse vaga para todos os alunos.
Visando atender ao público do Riacho Fundo II, a Secretaria de Educação (SEE) fez parcerias com três creches privadas, para receber as crianças que fazem parte da rede pública. Assim, a população que mora do lado de lá da rodovia conta com essas instituições. No entanto, todas as vagas estão ocupadas. A pasta afirma que pretende abrir três creches públicas no Riacho Fundo II (ver nota completa no fim da matéria).
Segundo conta a irmã de Raquel, Kathielen Ramos, 26, essa situação pode deixar a mãe dos dois meninos sem renda de um dia para outro, isso porque Raquel recebe o Auxílio Brasil, programa que substituiu o Bolsa Família. Para que o beneficiário mantenha a ajuda é preciso que os filhos frequentem a escola. “O Paulo Henrique está com seis faltas porque se ela perde o ônibus, o próximo passa só 1 hora depois”, explica Kathielen. “O emprego dela é temporário, então, a qualquer momento ela pode ficar sem nada”, completa.
“Todo mundo que fica sabendo da história tenta ajudar de alguma forma”, garante a irmã de Raquel. Foi o que tentou fazer a líder comunitária Maria do Rosário, moradora da região rural ao lado, o Caub I. Ela conseguiu reuniões com a regional de ensino do Recanto das Emas a fim de pleitear duas vagas, todavia, não teve sucesso. “O Estado tem obrigação de fornecer a vaga”.
A outra criança que a líder comunitária quer colocar na escola é Rubens, de 4 anos, filho da vizinha Eva Francisca de Oliveira, 48. Diferentemente do caso de Raquel, o ofício de dona Eva não permite que ela pegue vários ônibus por dia para que o pequeno possa começar o processo de alfabetização. A quitandeira, então, trabalha na companhia do filho, que terá de tirar o atraso no próximo ano letivo, caso seja contemplado.
“Estive diretamente na escola, me confirmaram que ele não tinha sido contemplado, não estava na lista, as vagas estavam preenchidas e não tinha como matricular ele de jeito nenhum”, narra a trabalhadora rural. Segundo conta a mãe, o menino está sem estudar desde janeiro: “Isso me preocupa, mas não tem o que fazer; não posso ficar sem trabalhar e, para mim, fica impossível ele estudar em outra região”, afirmou.
Questionada sobre a situação das duas mães, a Secretaria de Educação afirmou que não comenta casos individuais, no entanto, afirmou que vai abrir licitação para a construção de mais três creches públicas no Riacho Fundo II.
Veja a íntegra da nota da Secretaria de Educação:
“A Secretaria de Educação encaminha as crianças para unidades localizadas o mais próximo possível da residência ou do local de trabalho dos pais. Para a região, há previsão de licitar, no primeiro semestre, a construção de três centros de educação da primeira infância (CEPIs), com capacidade para 188 alunos cada, sendo dois no Riacho Fundo II e o outro no Riacho Fundo. Atualmente, há 11.900 crianças aguardando por vagas em creches no DF.”