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Secretário de Segurança pede demissão. Em carta, fala em “desmandos” na Polícia Militar. Leia a íntegra

Um dia depois de recuar da decisão de exonerar o comandante-geral da PM, Rollemberg abre crise na segurança pública e perde titular da pasta

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Gabriel Jabur/Agência Brasília
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1 de 1 21140562935_303b06e7cd_o - Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília

O secretário da Segurança Pública e Paz Social, Arthur Trindade, pediu demissão do cargo nesta quinta-feira (5/11). A saída ocorre um dia depois de o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) recuar da decisão de exonerar o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Florisvaldo Cesar. Em carta (veja íntegra abaixo), o agora ex-secretário criticou abertamente a ação da Polícia Militar e falou em “desmandos”.

“A ação da PMDF contra os professores foi equivocada, do meu ponto de vista. Todos os especialistas que consultei foram unânimes em dizer que houve uso desproporcional da força e que não foram esgotadas as negociações. Pior, a ação foi dirigida diretamente pelo comandante geral, sem consultar o governador ou o secretário de segurança”.

A relação entre Trindade, sociólogo da Universidade de Brasília (UnB), e o militar, que nunca foi boa, azedou depois da ação da PM no confronto com professores grevistas que fecharam a saída Sul na semana passada, e foram contidos com balas de borracha e bombas de efeito moral.

O então secretário deu um ultimato ao governador Rollemberg em reunião realizada na última sexta (31/10): “Ou ele ou eu”. A ideia inicial do governador era exonerar Florisvaldo Cesar nesta quarta (4). Ele teria sido informado da exoneração um dia antes. Mas, pressionado por políticos e oficiais da PM, que ameaçaram entregar os cargos, o chefe do Executivo recuou e manteve o coronel, contrariando Trindade. Homem de palavra, o sociólogo pediu demissão, confirmada pela Secretaria de Segurança.

Polícia cidadã
Na carta, Trindade destaca que não pode concordar com o que aconteceu. “Precisamos decidir qual polícia queremos. Uma polícia cidadã ou uma polícia que não se submete à autoridade civil e tem dificuldades para admitir seus erros?”

Ele isenta os policiais do Batalhão de Choque ao dizer que são profissionais que seguem protocolos. Mas, “se os protocolos estão equivocados, cabe ao comando corrigi-los. Mais do que erros pontuais, a ação revelou as graves falhas na cadeia de comando e na estrutura de governança da segurança pública do Distrito Federal.”

Em outro trecho, não escondeu os atritos com o comando da PM: “Desde o início dos nossos trabalhos, temos encontrado dificuldades de trabalhar com alguns setores da PMDF. Para estes, prevalece a ideia de que a polícia é autônoma e não precisa se submeter às diretrizes da Secretaria de Segurança Pública. Eles não querem uma secretaria forte e capaz de planejar uma política de segurança pública.”

Nota de Rollemberg
Por meio de nota, Rollemberg lamentou a saída do secretário. “Agradeço ao Arthur pelo valoroso trabalho à frente da secretaria. Com a integração das forças de segurança, conseguimos diminuir os índices de violência na nossa cidade. Por isso, continuaremos investindo no programa Viva Brasília a fim de avançar cada vez mais contra a criminalidade no DF”, disse o governador.

Confira a carta de demissão do secretário na íntegra:

Nestes dez meses que estamos à frente da Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social, temos nos esforçado para construir uma política pública de segurança voltada para a redução dos crimes violentos e aumento da sensação de segurança. Esta política está baseada na filosofia de policiamento orientado para a solução de problemas e na intensa participação da sociedade civil.  

Para isso, reestruturamos a Secretaria para que pudesse efetivamente coordenar a política e orientar as ações a partir de análises criminais baseadas em evidências científicas. Também implantamos uma câmara técnica para aproximar o Ministério Público, o Judiciário e a polícia. Introduzimos uma política de transparência de estatísticas e informações criminais.

Os resultados foram muito bons, com destaque para a queda de 14% no número de homicídios. Isso aconteceu devido aos esforços da Polícia Militar em apreender armas de fogo e, principalmente, aos trabalhos da Polícia Civil em investigar estes crimes e coibir a atuação das gangues. Se os esforços forem mantidos, poderemos alcançar uma redução de 50% das mortes violentas nos próximos anos.

Também merece destaque a redução das mortes no trânsito. Resultado das ações de prevenção realizados pelo Detran e pela Polícia Militar, além do excelente trabalho de socorro realizado pelo Corpo de Bombeiros.

Com relação aos crimes contra o patrimônio, os números ainda estão aquém das metas que traçamos. A despeito dos esforços da SSP em elaborar análises estatísticas, as ações do policiamento ostensivo da PM ainda carecem de foco. Não basta apenas colocar mais policiais na rua. Eles precisam estar no dia, na hora e no local corretos.

Estes resultados se diluem quando erros e desmandos acontecem. A ação da PMDF contra os professores foi equivocada, do meu ponto de vista. Todos os especialistas que consultei foram unânimes em dizer que houve uso desproporcional da força e que não foram esgotadas as negociações. Pior, a ação foi dirigida diretamente pelo comandante-geral, sem consultar o governador ou o secretário de Segurança.

Sou professor e tenho uma trajetória em segurança pública e direitos humanos. Não posso concordar com o que aconteceu. Precisamos decidir qual polícia queremos. Uma polícia cidadã ou uma polícia que não se submete à autoridade civil e tem dificuldades para admitir seus erros?

Os erros na ação da semana passada não podem, de forma alguma, ser atribuídos aos policiais do Batalhão de Choque. São profissionais que seguem protocolos. Se os protocolos estão equivocados, cabe ao comando corrigi-los. Mais do que erros pontuais, a ação revelou as graves falhas na cadeia de comando e na estrutura de governança da segurança pública do Distrito Federal.

Desde o início dos nossos trabalhos, temos encontrado dificuldades de trabalhar com alguns setores da PMDF. Para estes, prevalece a ideia de que a polícia é autônoma e não precisa se submeter às diretrizes da Secretaria de Segurança Pública. Eles não querem uma secretaria forte e capaz de planejar uma política de segurança pública.

O Distrito Federal tem, em termos proporcionais, o maior orçamento de segurança pública do país. Tem também os maiores efetivos proporcionais. Nossas polícias são bem pagas. Mas, apesar disso, historicamente as entregas na área de segurança pública têm sido pífias. Nossa taxa de homicídios é alta, a população segue insegura, desconfia das polícias e os serviços de polícia deixam a desejar. Tudo isso porque falta uma secretaria de fato capaz de ditar uma política de segurança.

Lutamos para construir uma política de segurança e fortalecer a secretaria como órgão central de planejamento e governança. Os obstáculos têm sido enormes. Os acontecimentos recentes agravaram o quadro, tornando insustentável a minha permanência. Agradeço a todos(as) que me apoiaram.”

 

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