Mercado do DF inflaciona maconha vendida no Brasil
Droga que sai do Paraguai a R$ 20 o quilo é vendida na cidade a R$ 1,8 mil. Alto poder aquisitivo na capital supervaloriza o “produto”
atualizado
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O Distrito Federal se transformou em um entreposto para o tráfico nacional da maconha. Cerca de 90% da erva consumida pelos usuários brasileiros é produzida no Paraguai e boa parte passa pela capital da República antes de seguir para outras regiões do país. Quando atravessa a fronteira paraguaia, o quilo custa aos traficantes R$ 20. A parada em território brasiliense é obrigatória. Motivo? O mercado consumidor de alto poder aquisitivo dá uma supervalorizada na droga, que chega a ser revendida a R$ 1,8 mil. Uma rentabilidade de 8.900%, que transforma o tráfico em um negócio imbatível.
Se a droga segue daqui Brasil afora, o ganho é maior ainda, já que o quilo atinge a cifra de R$ 3 mil. Violenta e rentável, a indústria da maconha fez com que traficantes brasilienses ganhassem expertise no transporte da droga. A rota do produto, a logística montada para dar suporte às operações e as “tendências” de mercado da erva foram mapeados pela Coordenação de Repressão às Drogas (Cord) da Polícia Civil do DF e pela Delegacia Estadual de Repressão a Narcóticos (Denarc) de Goiás.
Carros de passeio e caminhões estilo baú são os preferidos dos traficantes para transportar a droga de Goiás para o DF. A comunicação via rádio e aplicativos de conversa instantânea é intensa entre os criminosos durante todo o trajeto. Estradas vicinais são as mais usadas e os carregamentos ficam escondidos em chácaras nas áreas rurais e em imóveis afastados de regiões mais movimentadas.
Segundo o chefe da Cord, delegado Rodrigo Bonach, as investigações apontam que traficantes brasilienses ficam baseados em Goiânia, onde realizam as transações envolvendo os carregamentos de maconha que abastecem o DF e também seguem para outros estados. “Esses traficantes perceberam que teriam um lucro maior e um risco menor adquirindo a droga em Goiás. Eles não precisam percorrer grandes distâncias, pagam um valor menor e revendem por muito mais”, explica.
Apenas nos primeiros oito meses deste ano, a Cord apreendeu 391 quilos de maconha e prendeu 41 traficantes. Também foram recolhidos R$ 220 mil faturados com a venda de drogas no DF. “Não investigamos a ponta do negócio, mas sim a raiz do problema. Nosso alvo são os grandes traficantes e não os pequenos ‘vapores’ (pequenos traficantes). Por isso, batemos o recorde de apreensão de drogas no ano passado. Apenas a Cord retirou 4,1 toneladas de maconha das ruas. Se levarmos as outras delegacias em consideração, a quantidade ultrapassa cinco toneladas”, explica o delegado.
Despistando a polícia
Em Goiânia, os traficantes se especializaram em desviar o foco da polícia no momento de transportar grandes quantidades de maconha para o DF. Eles utilizam carros de passeio como chamariz. Simultaneamente, um caminhão abarrotado da erva deixa a cidade por outra estrada, bem distante do ponto onde está a “isca”. O delegado-chefe da Denarc, Alécio Moreira de Sousa, revela que apreendeu quatro toneladas de drogas apenas no primeiro semestre deste ano, em quatro operações.
Tivemos uma média de uma tonelada de maconha apreendida por operação depois de descobrir como os traficantes locais e do DF estavam agindo. Conseguimos flagrar os caminhões abarrotados da droga já na BR-060, no sentido Brasília.
Alécio Moreira de Sousa, delegado
A transformação de Goiânia em uma cidade “depósito” fez com que as apreensões de maconha explodissem no último ano. Os policiais da Denarc apreenderam 7,3 toneladas da erva entre o período de janeiro a dezembro, média de 600 quilos por mês.
Cenário dramático
Diferentemente de seus vizinhos, o Brasil não é um grande produtor de drogas, mas é o segundo maior mercado consumidor do mundo — superado apenas pelos Estados Unidos. O país se tornou refúgio de narcotraficantes, e o maior exemplo foi a prisão, em 2007, do colombiano Juan Carlos Ramirez Abadia.
O criminoso procurado em vários países foi detido pela Polícia Federal numa mansão em um condomínio de luxo na Grande São Paulo. Na época, Abadia teria dito aos federais que escolheu o Brasil para se esconder por achar que poderia passar despercebido pelas autoridades que o procuravam.
Por ter proporções continentais com 23.102 quilômetros de fronteiras, uma área superior a 8,5 milhões de quilômetros quadrados, fiscalizar o tráfico de drogas nos limites territoriais do país não é tarefa fácil. Afinal, o Brasil faz divisa com dez países, três dos quais são os maiores produtores de cocaína — Peru, Colômbia e Bolívia — e, como já citado, o segundo maior produtor de maconha — Paraguai. A estimativa é que o narcotráfico movimenta anualmente, em todo o mundo, US$ 500 bilhões.