Feminicídio no DF: mulher é morta a facadas. Filhos testemunharam
Após o crime, assassino foi espancado por vizinhos e está internado com traumatismo craniano no Instituto Hospital de Base (IHB)
atualizado
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Uma mulher de 44 anos foi morta a facadas pelo companheiro na noite desta quarta-feira (10/10). O autor, Orlando Sousa Alves, 61, foi preso momentos depois do crime, após ter sido espancado por vizinhos na QL 6, no Itapoã. Policiais militares e agentes da Polícia Civil intervieram na confusão e deram voz de prisão ao homem.
Maria Júlia de Alvim não resistiu aos ferimentos e morreu no local. O assassinato foi presenciado por dois filhos – um menino de 8 anos e uma jovem maior de idade – e pela irmã da vítima. Foi o garoto que ligou para a polícia.
O homem ficou ferido após as agressões e está internado no Instituto Hospital de Base (IHB). O caso está sendo investigado pela 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá).
Uma filha do casal teria acionado o serviço de emergência da corporação após presenciar o pai, bêbado, espancar a mãe. Aos militares, a testemunha informou que Orlando agiu por ciúmes. O casal tem oito filhos e estava separado havia 10 anos.
Um dos filhos do casal contou que o pai ameaçava e agredia a mãe com frequência. Ele acrescentou que o homem era muito violento. Segundo a Polícia Civil, o flanelinha tem passagens por ameaça e tentativa de homicídio.
Recorde de casos
Em 2018, até agora, 23 feminicídios foram registrados no Distrito Federal. O número é quase o dobro de todas as ocorrências de 2017: 12. Em pelo menos três ocasiões, os filhos viram a mãe ser executada a sangue frio. Em dois episódios, o pai ainda tirou a própria vida na frente das crianças.
Relembre alguns casos de feminicídio no DF:
Mesmo os profissionais acostumados a lidar com familiares de vítimas de violência admitem ser extremamente delicado tratar órfãos de feminicídio. “Você vai estar diante de crianças que enxergavam ao mesmo tempo a mãe cuidadora e amorosa e a mãe esfaqueada e morta”, conta a professora Gláucia Diniz, PHD em psicologia da Universidade de Brasília (UnB).
Ainda segundo a especialista, que há 10 anos coordena um projeto interdisciplinar voltado para o acolhimento de vítimas de violência doméstica, “é fundamental acolhê-las para que essas imagens chocantes não as levem a um estado de ansiedade e as façam evoluir para sintomas de ansiedade crônica, depressão ou esquizofrenia”.
Ao Metrópoles, familiares de vítimas de feminicídio contaram que até conseguem ser inseridos em programas de acompanhamento psicológico gratuitos, mas muitos desistem pela distância dos locais de atendimento.
Atualmente, segundo Andressa Augusto Queiroz, subsecretária de Apoio às Vítimas de Violência da Secretaria de Justiça, há núcleos do Pró-Vítima em Ceilândia, Paranoá, Lucio Costa (Guará), Asa Sul, Taguatinga e Plano Piloto. “A ideia é expandir para Planaltina, Santa Maria, Sol Nascente e Estrutural. Também temos um carro disponível que só falta adesivar. Ele será o núcleo móvel”, responde.
Apesar da quantidade expressiva de feminicídos em 2018, até o início de setembro apenas quatro órfãos de mulheres vítimas desse crime passavam por acompanhamento psicológico na rede pública de saúde. “É preciso que essas pessoas saibam que nossa rede está à disposição”, reforça Andressa Augusto.
Em nota, a Secretaria de Saúde diz manter o Programa de Pesquisa, Assistência e Vigilância à Violência (PAV), que acolhe familiares e vítimas de violência. “O PAV tem como principais atribuições o atendimento a pessoas em situação de violência, numa abordagem biopsicossocial e interdisciplinar, a articulação com a rede de atendimento, os encaminhamentos institucionais e intersetoriais, a promoção da cultura de paz e a vigilância dos casos.”
A pasta também informou que tal público tem acesso ao Centro de Orientação Médico Psicopedagógica, que presta atendimento interdisciplinar em saúde mental a crianças e adolescentes do DF e Entorno. “Atende desde os casos mais leves de sofrimento psíquico até os transtornos mentais mais graves. Possui, ainda, um acolhimento humanizado, diário, com classificação de risco, realizado por profissionais capacitados para melhorar o processo de trabalho na unidade e avaliar a gravidade e a urgência de cada caso”, diz o texto.
“Botão do pânico” é para poucos
Uma das medidas anunciadas pelo GDF para frear os feminicídios no DF foi o programa Viva Flor, um dispositivo entregue a mulheres ameaçadas de violência doméstica e que, ao ser acionado, chega à central da Polícia Militar, que, imediatamente, envia uma equipe ao local. Apesar do avanço tecnológico, até a primeira semana de setembro sete mulheres receberam o aparelho desde o lançamento da medida, há quase 10 meses.
A Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social informou que a Vara de Violência Doméstica do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) é responsável por indicar quem serão as vítimas de violência atendidas pelo programa.
No campo nacional
Embora os números ainda preocupem, houve avanço com a instituição da Lei Maria da Penha, sancionada em 2006. Antes da legislação entrar em vigor, o crescimento da taxa de assassinato de mulheres era, em média, de 2,5% ao ano. Depois da lei, caiu para 1,7% ao ano.
O levantamento publicado no Mapa da Violência 2015 – Homicídio de Mulheres no Brasil, lançado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) Brasil – revela que o Brasil está em quinto lugar no ranking de países que mais matam mulheres, atrás apenas de El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia.