Facção desarticulada no DF cobrava diária de até R$ 100 de prostitutas
Aquelas que se recusassem a pagar os valores eram expulsas, intimidadas e até assassinadas por integrantes da Comboio do Cão
atualizado
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A facção Comboio do Cão (CDC), desarticulada em megaoperação da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) nesta terça-feira (13/08/2019), faturava alto com atividades criminosas, como crimes por encomenda, tráfico de drogas, roubos diversos e até com a cobrança de diária entre R$ 50 e R$ 100 para que prostitutas pudessem explorar pontos, principalmente em Taguatinga. Aquelas que se recusassem a pagar os valores eram expulsas, intimidadas e até assassinadas.
Um dos casos envolve o homicídio da travesti Bruna Morango, friamente executada com diversos disparos de arma de fogo após se recusar a pagar os valores cobrados pelo grupo. De acordo com o delegado da 1ª Divisão de Homicídios da PCDF, Thiago Boeing, o assassinato teria sido cometido por William Peres Rodrigues, o Willinha – única liderança da facção criminosa que segue foragida.
Segundo Boeing, o grupo se instalou no local em 2017, inicialmente para tráfico de drogas: “Chegaram na região e trataram de tirar o traficante responsável pela área. Após um tempo, observaram a movimentação e viram uma oportunidade em explorar as garotas da região. Começaram, então, a intimidá-las para que pagassem uma taxa para ficarem em via pública”.
Nesta terça, foram cumpridos 46 dos 49 mandados de prisão expedidos pela Justiça. As investigações apontam que o grupo criminoso foi responsável por 420 ocorrências criminais, 209 inquéritos policiais, 65 termos circunstanciados de ocorrência (TCO), 54 denúncias e 34 apurações nos últimos seis anos.
A PCDF acredita que o grupo usava familiares para lavar o dinheiro das práticas criminosas. A suspeita de lavagem de dinheiro resultou no bloqueio de 60 contas bancárias e na apreensão de 19 veículos, além de 11 imóveis. Todos comprados com dinheiro ilícito.
A operação, batizada de Rosário, contou com a participação de mais de 300 agentes e delegados. Entre os detidos está um advogado acusado de trabalhar para a organização criminosa. Também apontado como uma das lideranças da facção, Rafael Nunes Carvalheiro Barros, o Rafael Abelha, foi preso durante a operação. Além do DF, a ação ocorreu simultaneamente em municípios de Minas Gerais, Goiás e Piauí.
O Comboio do Cão é uma facção criada no Distrito Federal há seis anos, fruto de uma disputa entre as gangues Grupo do Galba, Helinho, Pepita e Irmãos Periquito por pontos de tráfico de drogas. À medida que ia crescendo, o CDC ia exterminando as lideranças dos demais grupos criminosos, até comandar o tráfico da região. Investigações da Divisão de Repressão a Facções Criminosas (Difac) apontam que a gangue do DF procura reproduzir práticas adotadas pelas grandes e conhecidas facções criminosas do país, como o Primeiro Comando da Capital (PCC).
O grupo cresceu de forma isolada, sem vínculo com organizações criminosas com atuação nacional, como o Comando Vermelho (CV) e o PCC. Apesar da aparente independência, a quadrilha busca se cacifar perante as demais facções e ganhar o respeito dos rivais.
Mais de 30 pessoas teriam sido assassinadas pelos bandidos do CDC nos últimos anos. Como demonstração de força, os criminosos promoviam bárbaras execuções em portas de cadeias e de fóruns do DF. As investigações apontam que o grupo foi responsável, em 2016, pela morte de um homem com 30 tiros em frente ao fórum de Santa Maria. Alguns dias depois, o tio da vítima também foi assassinado com 50 disparos.
“Estamos falando de um grupo que utilizava armas que nem as forças de segurança têm, com seletores de rajada e alto poder de fogo, verdadeiras metralhadoras. Os homicídios eram cometidos sempre com alto número de disparos. Há casos de desafetos mortos com 10, 20 e até 30 tiros.”
Delegado Thiago Boeing
A Justiça autorizou o sequestro de bens e bloqueio de contas das principais lideranças do bando. O intuito foi atacar e enfraquecer o braço financeiro da quadrilha.
Códigos de conduta
O CDC tenta implementar métodos de disciplina e códigos de conduta. Um exemplo constatado pela PCDF foi a criação de um “tribunal do crime”, que consiste no julgamento de integrantes que descumpriram as regras impostas pelas lideranças.
Enquanto o PCC predomina nas regiões administrativas de Planaltina, São Sebastião, Paranoá, Ceilândia e Samambaia, o Comboio do Cão age no Gama, Santa Maria, Recanto das Emas e Riacho Fundo.
Pouco representativo no Distrito Federal, o Comando Vermelho restringe sua área de atuação à Estrutural e ao Entorno de Brasília.