Em áudio, integrante do QG Rural afirma que fazendeiro financia grupo
Homem que ameaçou Ibaneis estaria por trás de extremistas. PCDF apura prática de supostos crimes de milícia privada, ameaças e porte de arma
atualizado
Compartilhar notícia
Investigado pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), o grupo autointitulado QG Rural tem como financiador o fazendeiro goiano André Luiz Bastos Paula Costa, que foi intimado a prestar depoimento. A afirmação foi feita com exclusividade ao Metrópoles por um dos integrantes do grupo extremista.
André Luiz está na mira da PCDF também por ter ameaçado o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), após a remoção de acampamentos de extremistas da Esplanada dos Ministérios.
A declaração sobre ele ser a fonte de financiamento dos grupos foi gravada dias antes de a Coordenação Especial de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Cecor) cumprir mandado de busca e apreensão em um dos imóveis do empresário. A chácara localizada em Arniqueiras, próximo ao Riacho Fundo, servia como ponto de apoio para os ativistas.
Além do QG Rural, o local também abrigava manifestantes ligados ao Patriotas e 300 do Brasil, ambos de extrema-direita. A PCDF apura a prática de supostos crimes de milícia privada, ameaças e porte de armas. A ação policial ocorreu na manhã desse domingo (21/06).
À reportagem, um integrante do QG Rural, que pediu para não ser identificado, afirmou que o apoio vem de André Costa.
Confira:
“Na verdade, toda a estrutura lá, quem nos dá apoio é o André. Ele representa o Agro [agronegócio], a classe pecuária. Ele vem nos apoiando. Então, a gente reivindica algumas pautas dele, mas a estrutura toda é dele. A chácara lá é desse André, ele ofereceu isso para a gente, para a gente lutar junto com o Agro. Ele tem fazenda, tem terras aí, planta arroz, café, no Brasil inteiro”, afirmou.
O homem detalha que o fazendeiro mantinha os manifestantes e fornecia alimentos, em companhia de outras pessoas que se solidarizavam com a causa. “Ele [André] é de Goiânia e todo fim de semana vem para cá”, contou o militante do QG Rural.
A fonte afirma, ainda, que conseguiu vários apoios da classe empresarial de Corumbá (MS) e do DF. “Aqui também [em Brasília] a gente vem conseguindo muito apoio, faixa, outdoor”, exemplificou. Segundo o bolsonarista, o grupo está na capital federal há pouco mais de um mês.
Veja fotos da operação e dos ativistas:
Além de André, o integrante do QG Rural cita o nome de outros dois apoiadores, um deles é Elano Holanda de Almeida, o idoso que passou mal ao ser atingido por spray de pimenta em uma ação da Polícia Militar na Esplanada dos Ministérios. Outro suposto financiador seria um indivíduo identificado como Douglas.
“O Elano é da mesma cidade minha. Lá em Corumbá, a gente sempre promove esse movimento. A gente fez o movimento pró-Bolsonaro gigantesco na campanha do Bolsonaro. A gente fez ‘barqueata’ no Pantanal, que repercutiu nacionalmente”, detalhou o homem. “A gente sempre investe em movimentos, teve o “Fora Dilma”, na época [do impeachment], e aí a gente se uniu, né? Não só Elano, mas o Douglas também, que veio conosco”, completou.
Ele detalha que a ideia do grupo era ficar apenas uma semana em Brasília para “ver o cenário”, mas, com o apoio obtido, os militantes decidiram prolongar a estadia por tempo indeterminado.
Quem é André
André Luiz Bastos Paula Costa também é investigado pela PCDF por promover uma série de ameaças registradas em vídeo contra o governador do DF. As imagens foram feitas logo após o chefe do Executivo distrital determinar o desmonte de acampamentos e a retirada de integrantes dos grupos QG Rural e 300 do Brasil da Esplanada dos Ministérios, em 13 de junho. O autor da gravação tem histórico de violência em manifestações e teria dado uma facada no braço de um homem, em 2018.
As ameças do fazendeiro a Ibaneis Rocha são apuradas pela Delegacia de Repressão a Crimes Cibernéticos (DRCC), da PCDF. No vídeo, André Luiz aparece em uma área rural, com uma caminhonete ao fundo.
No início, ele se queixa de o acampamento onde se concentravam produtores rurais de todo o país ter sido desfeito à força pela Polícia Militar. “Governador Ibaneis, o senhor foi hoje [dia 13/06] lá no QG Rural, do lado do Ministério da Agricultura, e mandou derrubar nosso acampamento lá, né?”, diz o homem.
O integrante do grupo de extrema-direita prossegue e faz a primeira ameaça contra o chefe do Executivo local. “Pois é, governador, o senhor derrubou o acampamento de todos os produtores rurais do Brasil. Somos nós que estamos mantendo este país e nós não vamos a aceitar a truculência, a forma como o senhor agiu, senhor Ibaneis. Nós vamos mostrar pro senhor com quem que o senhor mexeu”, ameaçou.
Confira o vídeo:
O homem que ameaçou o governador do DF havia sido conduzido anteriormente a uma delegacia por ter dado uma facada no braço de uma pessoa. O caso ocorreu em Goiânia (GO), em 7 de abril de 2018. Na ocasião, André Luiz e um grupo de amigos comemoravam a prisão do ex-presidente Lula.
De acordo com o Termo Circunstanciado (TC) registrado pela Polícia Civil goiana, o grupo resolveu festejar a prisão de Lula soltando rojões. A barulheira teria incomodado frequentadores idosos de uma praça. Um deles, Abrão Noleto, 65 anos, abordou o grupo alertando do transtorno causado pelos fogos.
Irritados, os integrantes da manifestação correram no encalço de Abrão com o intuito de surrá-lo. Os agressores o perseguiram até o carro, onde ele buscou refúgio. Os homens tentaram arrancá-lo do veículo, no que foram impedidos pelo enteado do idoso, que, na confusão, acabou golpeado no antebraço por uma faca. Policiais que passavam pelo local conduziram autores e vítimas para a delegacia, onde o caso foi registrado.
Organização criminosa ou milícia privada
Os grupos vêm se organizando há mais de um mês e realizam atos que, segundo o delegado Leonardo de Castro, coordenador da Cecor, ultrapassam os limites de liberdade de expressão e se tornam crimes. Uma vez que eles relatam, em vídeos, portar armas de fogo, além de fazerem ameaças, a Cecor decidiu iniciar as apurações.
De acordo com Castro, não serão punidos só os indivíduos que emitem declarações, mas todos os que têm participação e tiveram a intenção de se agrupar para cometer os crimes – inclusive quem financia ou mantém esses grupos.
Se comprovado que se trata de uma organização criminosa ou milícia privada, será apurado quem são os possíveis financiadores.
O objetivo da ação desse domingo (21/06) era, justamente, coletar provas para confirmar os indícios que a PCDF tinha. “Acreditamos que tivemos um resultado positivo, na medida em que foram apreendidos aparelhos celulares de integrantes, documentos e o DVR de imagens de segurança do local. Isso tudo vai ser analisado e pode ser que contribua bastante para a investigação”, ressaltou o delegado.
Confira a entrevista do delegado:
Reuniões e treinamentos
Para o delegado, o local era utilizado pelo grupo para reuniões e treinamentos, assim como o acampamento descoberto antes, na região de Rajadinha.
“O inquérito foi aberto há, aproximadamente, um mês, após agruparmos as informações relacionadas a outras ocorrências de crimes cometidos por eles, em redes sociais. Eles são bastante combativos. Havia indícios de que eles possuíam armas nos acampamentos e isso era declarado por eles”, contou o delegado.
Além disso, Castro afirma que, em decorrência das ações do GDF que desmontaram os acampamentos, os suspeitos declararam que durante a manifestação desse domingo (21/06) haveria “uma grande surpresa” para os governantes. “Foi mais uma razão que nos levou a apressarmos a medida de busca”, disse Leonardo de Castro.
Os investigadores acreditam que os valores das notas apreendidas sejam suficientes para manter o acampamento durante uma semana, mas elas ainda não foram somadas. O cofre será aberto na tarde desta segunda-feira (22/06). A Polícia Federal também apura crimes em sua competência.
Veja vídeos de integrantes do movimento sobre a operação: