Memórias de um visionário. Um ano sem Aloysio Campos da Paz, fundador da Rede Sarah
A instituição é referência em saúde e mudou a vida de milhares de brasileiros
atualizado
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Um carro a 105 km/h cruzou o caminho de Guilherme Costa, à época com 14 anos, e sua vida mudou de rumo. Ele atravessava o Parque da Cidade a pé, depois de sair da aula, no colégio Sigma, para ir para casa, no Sudoeste. Guilherme, que planejava ser jogador de futebol, não poderia saber, mas aqueles seriam seus últimos passos. Ele saiu do acidente tetraplégico.
Depois de 4 meses internado, seguiu para a reabilitação no Sarah Kubitschek. Além de receber cuidados médicos, aprendeu a reformular sonhos. “Foi no Sarah que vi como seria dali para frente. Tive contato com outras histórias felizes e tristes. Assim, tomei consciência da vida que eu queria construir para mim”, lembra Guilherme.
Nem só de encontros trágicos se fez a história de Guilherme. A equipe de profissionais do Sarah preocupava-se com a saúde do paciente em vários aspectos. Recebeu incentivo para não desistir dos esportes, mesmo sem o movimento das pernas. Apresentaram a ele o tênis de mesa. Guilherme tornou-se paratleta, participou do Parapan de Toronto em 2015, ganhou medalha de bronze na categoria individual e o ouro no agrupamento por equipes.
“Tiveram o cuidado de me mostrar que havia muito além do futebol. Hoje, sou atleta de tênis de mesa e, se Deus quiser, vou participar das Paraolimpíadas, no Rio de Janeiro, em 2016”, afirma.
Quando conheceu essa forma de cuidar que leva em consideração todos os aspectos do ser humano, Guilherme viveu a experiência idealizada pelo fundador da Rede Sarah: Aloysio Campos da Paz. Os dois tiveram um breve encontro, antes de uma das cirurgias de Guilherme. “Ele (Campos da Paz) me tranquilizou naquele momento tão complicado”, diz.
Campos da Paz aplicou na rede conhecimentos adquiridos em Oxford, Inglaterra, onde fez pós-graduação em ortopedia. Em 1968, foi convidado por Juscelino Kubitschek a assumir a direção da entidade. Além de prestar atendimento, a rede também forma profissionais e desenvolve tecnologia própria. Atualmente, a rede está em oito cidades brasileiras.
Assim como Guilherme, outros milhares de pacientes tiveram sua vida transformada pela filosofia de Campos da Paz: “tratar o doente e não a doença”. O médico dizia que era preciso trabalhar para que cada um fosse tratado com base no seu potencial e não nas suas dificuldades. Do cuidado com os pacientes às fotografias espalhadas pelos corredores – que eram um hobbie levado a sério -, Campos da Paz está em cada detalhe dos hospitais da Rede Sarah.
Nesta segunda-feira (25/1), familiares e amigos organizaram uma missa, às 18h, no Santuário Dom Bosco, em ocasião do um ano da morte de Campos da Paz. Lembrar a sua importância é essencial para que o projeto permaneça vivo, após a partida do fundador, em 25 de janeiro de 2015.
Quem garante a preservação e o aprimoramento desses ideais é a neurocientista Lúcia Willadino Braga, diretora da rede Sarah desde 1994. Campos da Paz era ortopedista e transformou os hospitais da marca em referência em reabilitação física.
Nos últimos anos, o Sarah tem ganhado cada vez mais o toque de Lúcia Willadino, se voltando especialmente aos cuidados neurológicos, uma preocupação com o envelhecimento da população.
É preciso investir em tratamentos para doença de Alzheimer e mal de Parkinson, por exemplo. Com modelo gerencial a cargo de uma organização social, o hospital realiza mais de 19 milhões de procedimentos por ano.
A principal meta da instituição é devolver à população os impostos pagos por meio de atendimento público de alta qualidade, com tecnologia de ponta e acolhimento mais humano. As atividades crescem a cada ano. Em 2015, o Sarah registrou o recorde de mais de 174 mil consultas, só em Brasília. A intenção é manter esse número, em 2016. A saúde dos brasilienses agradece.
Depoimentos
Colegas de trabalho homenageiam doutor Aloysio Campos da Paz
O doutor Campos sempre se preocupou em reabilitar o paciente nos aspectos físicos e psicológicos, oferecendo-lhe qualidade de vida, com perspectivas de uma melhor inclusão na sociedade. O mais admirável era a sua vitalidade diária e a preocupação com a qualidade dos serviços prestados em toda a instituição, desde a limpeza ao atendimento mais complexo
Domingas Gentil, enfermeira no Sarah durante 36 anos.
“Campos da Paz era um monstro sagrado, impetuoso e genial, de uma força de trabalho impressionante. Há um sentimento de profundo respeito e gratidão ao doutor Campos, por ter feito parte dessa instituição que é pública e séria, que devolve o imposto que a gente paga em serviços qualificados, com uma humanização inquestionável. Ele deixou a semente de serviço humanizado e qualificado, os princípios de tratar a pessoa não como doente, mas como sujeito da ação. Ele foi um homem muito visionário, já pensava em uma visão holística, quando ainda nem se falava nisso”, afirma Mércia Lorentz, fisioterapeuta.
“Doutor Aloysio Campos da Paz demonstrou ser um médico muito humano, além do que seria o dever de um médico no tratamento de seus pacientes. Um exemplo era o costume que ele tinha de lotar seu carro de crianças internadas para levá-las à praia aos fins de semana. Campos deixou uma lembrança indelével no Sarah com sua obra, seu trabalho, sua força, sua determinação, seu sorriso largo mesmo diante de adversidades e até mesmo sua maneira, algumas vezes rude, de ensinar, quase nunca entendida. Os que ficaram têm nas mãos a tão difícil, mas ao mesmo tempo doce tarefa de continuar, não importa se por caminhos retraçados”, destaca a médica Sáuria Burnett.