Médicos presos na Mr. Hyde contaminavam materiais durante cirurgias
Investigação descobre que equipamentos autorizados e pagos pelos planos de saúde eram inutilizados no momento dos procedimentos. Com isso, médicos ligados à Máfia das Próteses alegavam que era preciso usar, em caráter de emergência, produtos das empresas integrantes do esquema, a custo bem mais alto
atualizado
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Conforme avançam as investigações que deram origem à Operação Mr. Hyde, fica cada vez mais claro para a polícia o lado sombrio dos médicos suspeitos de integrar o esquema criminoso praticado pela Máfia das Próteses. Trechos inéditos do inquérito aberto pela Divisão Especial de Repressão ao Crime Organizado (Deco) mostram que os profissionais chegavam a contaminar as órteses e próteses que deveriam ser usadas nas cirurgias enquanto os pacientes estavam deitados nas mesas cirúrgicas.
De acordo com a apuração da polícia, o material pago e autorizado pelos planos de saúde era inutilizado no momento do procedimento cirúrgico, muitas vezes com a pessoa já anestesiada e inconsciente. Dessa forma, os médicos alegavam que era preciso usar órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs) que pertenciam às empresas integrantes do esquema — de valores bem mais caros — em caráter de emergência.
Como os planos não autorizavam todos os itens que a máfia queria usar para deixar a operação com um preço bem mais elevado, os médicos contaminavam os materiais, diziam que estavam com o paciente aberto na sala de cirurgia e precisavam usar outros produtos. Pressionados, os planos de saúde acabavam autorizando o procedimento
Fonte policial ligada à Operação Mr. Hyde
Dinheiro vivo
De acordo com as investigações, médicos, empresários ligados às empresas fornecedoras de OPMEs e os chamados “pastinhas” — operadores do esquema — montaram uma rotina para realizar o pagamento das propinas. Os acordos eram quitados sempre em dinheiro vivo, nos estacionamentos dos hospitais, no interior de veículos ou dentro dos consultórios dos próprios médicos.
A quantia seria entregue a um médico nas imediações de um hospital no Plano Piloto. O inquérito policial relata que investigadores cogitaram monitorar a entrega do dinheiro, mas, para não colocar a operação em risco, os agentes decidiram não acompanhar o pagamento da propina naquele momento.
O esquema
Segundo as investigações, ao menos uma empresa, a TM Medical, fornecia órteses, próteses e equipamentos à organização criminosa. Quanto mais materiais caros eram usados em cirurgias para colocação desses equipamentos, maior era a propina recebida pelos médicos, que chegavam a ganhar 30% extras sobre o valor pago pelos planos de saúde pela intervenção nos pacientes.
Desde que o caso veio à tona, ao menos 60 vítimas do esquema procuraram a polícia para prestar depoimento. Os relatos incluem mutilações e tentativa de homicídio, segundo consta no inquérito.
A Operação Mr. Hyde foi deflagrada em 1° de setembro. Naquela quinta-feira, 13 pessoas foram presas, incluindo médicos acusados de participar da Máfia das Próteses. No dia seguinte, cinco conseguiram habeas corpus no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) e deixaram a carceragem do Departamento de Polícia Especializada (DPE).
Um dos que deixaram a cadeia foi Henry Greidinger Campos, proprietário da Ortopedia Sudoeste, que, apesar de ser suspeito de integrar o esquema e até mesmo de orientar pacientes a mentir para planos de saúde, voltou a atender em seu consultório.
Sindicância no CFM e no CRM-DF
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) afirmaram que os fatos serão apurados com rigor e critério.
O CRM-DF informou, ainda, que será aberta sindicância para apurar a denúncia do ponto de vista ético e profissional, cujos indícios, se confirmados, podem dar origem a processo contra os médicos envolvidos, que ficam passíveis a penalidades previstas em lei específica, como a cassação dos registros.
De acordo com os artigos 68 e 69, do Código de Ética Médica, é proibido ao profissional interação com qualquer segmento da indústria farmacêutica e de outros insumos para a saúde com o intuito de manipular, promover ou comercializar produtos por meio de prescrição a pacientes.