Icipe fica à frente do Hospital da Criança pelo menos até 10 de maio
Prazo foi estipulado pela Justiça. Até lá, GDF e Icipe deverão apresentar elementos a fim de regularizar o contrato de gestão
atualizado
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O impasse envolvendo a administração do Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB) pode ser resolvido em maio. O desembargador Alfeu Machado, da 6º Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), deu prazo até o dia 10 do próximo mês para o Governo do Distrito Federal (GDF) e o Instituto do Câncer Infantil e Pediatria Especializada (Icipe) se manifestarem sobre requisitos mínimos necessários a fim de regularizar o contrato de gestão da unidade de saúde. Até lá, a organização social continua à frente do HCB.
As instituições poderão mostrar propostas para ajustar as irregularidades apontadas pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), em 2011, ou eventuais documentos que comprovem a regularização. Após a manifestação de ambos, os promotores também deverão se posicionar sobre o assunto. Em seguida, o magistrado decidirá se concede ou não o efeito suspensivo da sentença que proibiu o Icipe de contratar com o poder público por três anos.
O GDF e o Icipe devem apresentar respostas sobre as condições impostas pelo desembargador nesta terça (24). Alfeu Machado destacou que as medidas visam “tão somente possibilitar a continuidade provisória dos serviços do Icipe no Hospital da Criança, observada as regras legais pertinentes”. Se for reconhecida a possibilidade de atendimento das exigências, as partes terão 90 dias úteis para cumpri-las após a publicação de eventual decisão.O desembargador impôs cinco condições: a apresentação de propostas concretas, com prazos factíveis, para submeter o Icipe a novo procedimento administrativo para qualificá-lo como organização social; compromisso em contratar pessoal mediante concorrência ampla e com critérios objetivos; apresentação do programa de trabalho desenvolvido e o futuro, especificando os recursos empenhados e programados; compromisso de promover fiscalização periódica das atividades do Icipe e posterior divulgação; e realizar chamada pública para viabilizar futura concorrência de outras entidades.
A decisão foi tomada nesta terça-feira (24/4), no Palácio da Justiça, durante audiência de conciliação entre o GDF e representantes do MPDFT. O secretário de Saúde, Humberto Fonseca, a procuradora-geral do DF, Paola Aires, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional DF (OAB-DF) e do Icipe acompanharam a sessão.
O magistrado ainda acatou o pedido para o GDF ingressar na ação. O desembargador, porém, ressaltou que o Executivo deve atuar somente como “assistente simples da parte requerente, apenas com relação ao pedido de concessão de efeito suspensivo”.
Confira a íntegra da ata da reunião:
Ata da audiência de conciliação sobre a gestão do HCB by Metropoles on Scribd
Na prática, se os efeitos da sentença forem suspensos, o Icipe poderá voltar a fechar contrato com o GDF. Dessa forma, não fica impedido de participar do novo chamamento público para administração do HCB, previsto para ser divulgado em agosto. O acordo concluído até o fim do ano, segundo o secretário de Saúde.
O gestor se mostrou entusiasmado com o encaminhamento da audiência. “Já olhamos as propostas e estaríamos até prontos para aceitá-las naquele momento, mas acho que é importante falar no processo”. Lucena explicou que o Icipe já passou a receber mais repasses financeiros desde março para efetivar a abertura de 202 leitos e outros serviços do Bloco 2, previsto para ser entregue até julho e passe a funcionar plenamente até o fim do ano. “Estamos pagando cerca de R$ 10 milhões pois é o que está previsto no contrato para fazer a ampliação”, explicou.
Para o presidente da OAB-DF, Juliano Costa Couto, a audiência de conciliação deu segurança jurídica ao Icipe para continuar gerenciando a unidade. “Desde que cumpram-se os requisitos, esse efeito suspensivo seria deferido e haveria perpetuação dos serviços [pelo menos até fevereiro, fim do contrato vigente]”, declarou.
Segundo a procuradora do MPDFT Ruth Kicis, o órgão protocolou uma petição, na segunda-feira (23), reafirmando que a sentença valeria para os futuros contratos. Kicis ainda complementou que o acordo atual está perto do fim. Assim, o Icipe não poderia entregar o serviço, como anunciou em 13 de abril. Nessa data, o instituto divulgou uma nota na qual informava o repasse da gestão ao GDF, em cumprimento a uma decisão judicial.
Entenda o caso
O juiz titular da 7ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, Paulo Afonso Cavichioli, condenou o Icipe por improbidade administrativa em 19 de dezembro de 2017. Na mesma decisão, também foram alvos o ex-secretário de Saúde Rafael Barbosa e o ex-secretário adjunto da pasta Elias Miziara.
O MPDFT apontou irregularidades na cessão da administração do Hospital da Criança ao Icipe. Conforme considerou o magistrado, não foram cumpridos requisitos necessários à qualificação do instituto como organização social (OS) para a fechar acordo com o poder público.
Dessa forma, proibiu, pelo prazo de três anos, a entidade de “contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário”.
Na sentença, Cavichioli justificou que a entidade se beneficiou pelos atos “ímprobos dos corréus”. Segundo o juiz, eles se articularam para possibilitar a qualificação do Icipe como organização social, mesmo sem o preenchimento dos requisitos legais.
“Permitindo, com isso, que o Icipe firmasse o Contrato de Gestão nº 001/2011-SES sem prévia seleção pública, além de ter efetuado contratação de pessoal em desconformidade com o regramento contido no artigo 1º do Decreto nº 30.136/2009, afrontando os preceitos da legalidade, isonomia, impessoalidade e moralidade administrativa. Violando, assim, o disposto no artigo 11, caput e inciso I da Lei nº 8.429/92”, detalhou.
Alfeu Machado defendeu a atuação do MPDFT no caso. Disse que “trata-se de mentira qualquer alegação e informação sobre viés político da ação movida pelo órgão ou que este visa dificultar contratos da Secretaria de Saúde”. Declarou, também, que eventual fechamento da unidade por conta da condenação do Icipe representaria ato de gestão, pois isso não foi determinado na sentença. Ele ressaltou que o juiz reconheceu, “de forma clara e expressa”, vícios na qualificação do Icipe como organização social e ausência de publicidade dos atos que precederam a assinatura do contrato de gestão.
Troca de farpas
A condenação mobilizou órgãos, autoridades e usuários do HCB. Em 18 de abril último, uma manifestação contra a decisão da Justiça foi organizada nas instalações do hospital. Cerca de 500 pessoas participaram do evento, incluindo o governador Rodrigo Rollemberg, que classificou a decisão como uma “tragédia”.
As últimas semanas foram movimentadas por troca de farpas entre os dois lados. Em nota, o MPDFT repudiou “os ataques sofridos e que se estendem ao Poder Judiciário e aos órgãos de controle”. A outra parte rebateu, disse estar interessada em cumprir a lei, além de pontuar quanto ao funcionamento do HCB “sob o regime de ‘portas fechadas’”, atendendo a um contingente limitado de usuários do SUS.
À época, o secretário de Saúde fez uma postagem no Facebook pedindo: “por favor, nos deixem trabalhar”. Um dos argumentos de Fonseca é a aprovação de 99% do hospital. A Ordem dos Advogados do Brasil endossou o coro dos governistas. Além de comparecer à manifestação realizada no HCB, divulgou nota afirmando que problemas devem ser resolvidos, e o fechamento do espaço não é uma opção.
Durante a gestão do Icipe, o Hospital da Criança de Brasília realizou mais de 2,7 milhões de atendimentos. Hoje, atende 1.162 pacientes com câncer, 747 com anemia falciforme, 475 com anomalias neurológicas, 445 com diabetes, 230 com imunodeficiências congênitas, 200 com síndrome nefrótica e 110 com fibrose cística.