Hospitais citados em escândalo das UTIs querem acordo de leniência
Tratativa tem como base parecer do Ministério Público de Contas, que aponta descumprimento da ordem cronológica nos pagamentos aos serviços de saúde que estavam atrasados
atualizado
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Empresas que supostamente participaram do esquema de pagamento de propina a distritais em troca da liberação de recursos procuraram escritórios de advocacia na tentativa de fechar acordo de leniência com as autoridades. Fontes da área jurídica envolvidas nas negociações revelaram que há tratativas abertas com advogados especializados. Esse tipo de acordo precisa ser firmado com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) para atenuar eventuais punições às empresas. Ao menos três das seis terceirizadas citadas no escândalo do Bonde da Propina estudam como conseguir o benefício. Todas as envolvidas administram UTIs na rede pública do DF.
Escritórios consultados pela reportagem confirmaram, sob condição de anonimato, terem sido procurados por algumas dessas empresas. Segundo eles, a situação é propícia para o fechamento de acordos na modalidade. Atualmente, há seis companhias citadas no escândalo. Todas tiveram os sigilos fiscal, bancário e telefônico quebrados no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde na Câmara Legislativa. São elas: Home Hospital Ortopédico, Santa Marta, Oxtal, o Hospital São Francisco, Fundação Universitária de Cardiologia e Intensicare.A principal justificativa dessa procura, segundo informam fontes próximas ao assunto, é a dificuldade em se contrapor ao argumento elaborado pelo Ministério Público de Contas (MPC-DF) de que os pagamentos feitos às empresas, após a aprovação de uma emenda às pressas pela Câmara Legislativa no fim do ano passado, não seguiram ordem cronológica — como impõe a lei.
Com o endurecimento das ações ligadas à Operação Drácon, coordenada pelo MPDFT e pela Polícia Civil, as empresas começaram a buscar alternativas para evitar punições duras. Dessa forma, caso assinem o acordo, que teria como contrapartida assumir a culpa no processo, essas pessoas jurídicas poderiam continuar prestando serviços e recebendo valores do poder público em todas as esferas, sejam elas municipais, estaduais e distritais ou federais.
A emenda aditiva, que garantiu crédito suplementar para hospitais que prestam serviços de UTI no DF, foi revelada a partir de gravações feitas pela deputada distrital Liliane Roriz (PTB), então vice-presidente da Câmara Legislativa. Nos áudios, nos quais foram grampeados a presidente-afastada da CLDF, Celina Leão (PPS), e o ex-secretário-geral da Casa Valério Neves, é sugerida a existência de um esquema no qual essas empresas de UTI pagariam propina em troca da liberação de recursos.
Leniência vs. delação
O acordo de leniência funciona como uma espécie de delação premiada, porém é destinado às empresas. Se uma pessoa jurídica envolvida em acusação de crime ou ato ilícito busca uma autoridade para confessar os atos ilícitos, pode obter condescendência e flexibilização nas eventuais penas as quais seja condenada. Para que o acordo de leniência seja aceito pelo órgão competente, a empresa precisa demonstrar que tem informações e provas que o órgão acusador não conseguiria pelos caminhos da investigação.
No caso das empresas com a quebra de sigilo determinada pela CPI da Saúde, o MPDFT seria o órgão a analisar o pedido. “Se a pessoa jurídica é condenada por um dos tipos previstos na Lei Anticorrupção, pode ter o contrato suspenso ou anulado. Pode até chegar a ser extinta, vai depender do ilícito praticado”, explicou o presidente da Comissão de Legislação Anticorrupção e Compliance da OAB-DF, Antônio Rodrigo Machado.
O acordo de delação premiada parte do mesmo princípio. No entanto, ele vale para pessoas físicas. Pode ser feito com um delegado de polícia ou com o Ministério Público. Se o MP aceitar, o órgão remete o acordo para o juiz, que decide se homologa ou não o ato.
Outro lado
Questionados sobre a tentativa de acordo, o Santa Marta e o Home não mencionaram o instituto da leniência. Apenas negaram ter cometido irregularidades. O Hospital Santa Helena informou que não tem conhecimento do assunto. A Oxtal e a Intensicare não foram localizadas para comentar o assunto. O Hospital São Francisco não havia respondido à demanda até a publicação desta reportagem. A Fundação Universitária de Cardiologia disse que não buscou auxílio de advogados para realizar nenhum tipo de acordo.
O MPDFT informou, via assessoria de imprensa, que não comenta ações relacionadas à Operação Drácon devido ao sigilo das investigações.