Entidades ligadas à saúde do DF alertam para colapso no pico da pandemia
Aviso foi feito pelo gerente-geral de assistência do Hospital de Base do Distrito Federal, Lucas Seixas, em áudio enviado à equipe
atualizado
Compartilhar notícia
Entidades que têm fiscalizado a atuação do Governo do Distrito Federal frente à pandemia do novo coronavírus afirmam que o caos esperado pelo gerente- geral de assistência do Hospital de Base do Distrito Federal, Lucas Seixas, está próximo de acontecer. Com poucos medicamentos e com o perigo de aumentar a lotação de unidades de terapia intensiva (UTIs), o pico da pandemia chega com perigo à capital do país, dizem profissionais ligados ao setor.
Gutemberg Fialho, presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF), alerta que a capacidade dos hospitais já está praticamente ocupada. “A situação é grave, de eminente colapso. Faltam cinco ou seis dias para chegarmos ao pico de contágio da doença, no qual teremos o maior número de pessoas precisando de UTIs ao mesmo tempo”, alerta.
Ele conta que conversou com outros servidores do Hospital de Base sobre o áudio vazado e ouviu a confirmação de que o estado da UTI por lá é crítico. “Ele estava fazendo um alerta. Veja que sugeriu até um lockdown. Não é o sindicato que está falando isso, é o responsável pela assistência no Hospital de Base”, reforça.
O problema, diz Gutemberg, é a Secretaria de Saúde insistir em não passar informações à população. “Eles perderam o controle e não querem admitir. Os dados divulgados não batem com o que está ocorrendo”, afirma.
Sobre a falta de medicamentos, o presidente do SindMédico diz que o problema, de fato, é mundial, mas o DF poderia contar com um estoque maior se tivesse atendido à solicitação da categoria, ainda em março, de suspender cirurgias eletivas. “Muita medicação necessária neste momento foi usada em procedimentos que poderiam ser adiados. Poderíamos estar em situação melhor agora”, diz.
A presidente da Comissão de Direito à Saúde da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Alexandra Moreschi, corrobora a fala de Gutemberg. Ela lembra que esteve na Farmácia Central da Secretaria de Saúde na sexta-feira (26/06) e pôde observar a situação. “Tem até alguns remédios para entubar, mas para manter sedado são muito poucos”, conta.
De acordo com ela, aumentar o número de respiradores disponíveis é essencial, mas falta muita coisa. “UTI não se faz só com equipamento e maca. Falta medicação e pessoal também”, salienta.
Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do DF (CRM-DF), Farid Buitrago, a situação, no geral, é grave. Várias vistorias já foram realizadas em hospitais do DF e ele diz que alguns inspiram preocupação. “Nós identificamos algumas UTIs que não estão lotadas, mas muito próximas da ocupação máxima”, conta.
Hospitais como o de Santa Maria e o Base estão com cenários mais delicados. “A situação é crítica e a secretaria já deve ter um plano B. A habilitação de novos leitos e continuar as campanhas educativas são coisas importantes”, diz Farid.
Segundo o representante do CRM-DF, a grande dificuldade tem sido, justamente, manter as pessoas em casa e respeitarem as normas de saúde. “No momento em que se abriu o comércio, os números explodiram. Insisto muito no uso de máscaras, mas, infelizmente, não é o que temos visto”, comenta.
O áudio
Na tarde de sábado (27/06), um áudio começou a circular pelo WhatsApp de profissionais de saúde e revelou o desespero de Lucas Seixas, do Hospital de Base, o maior da rede pública do Distrito Federal. Ele alertava para a chegada do “pico da pandemia” em um momento no qual, alegava, as vagas nas unidades públicas e privadas teriam se esgotado.
Como revelou o site O Antagonista e o Metrópoles confirmou, na gravação, o cirurgião geral traçou um panorama dramático:
“Estamos com 100% de ocupação dos nossos ventiladores. Gostaria que vocês unissem forças para dar as altas necessárias”, diz. E prossegue: “Vamos aguentar firmes, todos unidos, porque o pico chegou e esta semana será muito difícil”.
Ouça:
No áudio, o médico alega ter sugerido à Secretaria de Saúde e ao gabinete do governador Ibaneis Rocha (MDB) a decretação de um lockdown (fechamento geral, com exceção de serviços fundamentais) entre a terça-feira (30/06) e 14 de julho.
“Fizemos uma sugestão de lockdown, para que a gente tenha uma diminuição gradativa dos leitos com ventilação e a segunda semana de julho seja mais tranquila, mesmo que a gente postergue um pouco mais a crise intra-hospitalar. Mas é necessário, porque se esgotaram as vagas privadas, as públicas, e nós estamos criando mais.”
Em uma gravação complementar, enviada pouco depois da primeira, Seixas é ainda mais contundente: “Neste fim de semana, é não deixar ninguém morrer no corredor sem ventilador”.
Apesar da situação tensa com o avanço da pandemia, o governo não trabalha com a hipótese de lockdown nas próximas horas. Uma das razões é a destinação, pelo Ministério da Saúde, na sexta-feira (26/06), de 150 respiradores para o DF, justamente com o objetivo de ampliar a capacidade dos atendimentos a pacientes com o novo coronavírus em 13 unidades da rede pública local. Desse total, 90 são para leitos e os outros 60 são de transporte e emergência.
O que diz a Saúde
Por meio de nota, o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do Distrito Federal (Iges-DF), que administra, entre outras unidades, o Hospital de Base e o de Santa Maria, negou a informação de que 100% dos leitos de UTI com respiradores estejam ocupados.
“A informação não procede, não há falta de leitos de UTI e nem de medicação. O Iges-DF tem feito todo o esforço para que a população seja atendida de forma eficaz e efetiva neste momento de pandemia. No Hospital de Base, 66 leitos de UTI para atendimento exclusivo de pacientes referenciados acometidos pela Covid-19 foram abertos e, neste momento, 58 deles encontram-se ocupados”, diz a nota.
Ainda de acordo com o instituto, “no HRSM, 100 leitos de UTI para atendimento exclusivo de pacientes referenciados acometidos pela Covid-19 foram abertos e, neste momento, 81 deles encontram-se ocupados”.
O Iges-DF ressalta que, apesar de as liberações desses leitos serem dinâmicas, o instituto estuda meios de poder disponibilizar mais vagas para atender um número maior de pacientes e dar mais suporte à rede pública de saúde do DF.
Já a Secretaria de Saúde informa que “o número de leitos de UTI disponíveis nas redes pública e privada pode ser conferido na Sala de Situação, onde os dados são atualizados constantemente ao longo do dia. Na tarde deste sábado, dos 497 leitos de UTI reservados para casos de Covid-19 na rede pública, 300 estavam ocupados. Nos hospitais particulares, de 218 leitos disponíveis, 179 estão ocupados”.
A pasta reforça que “os dados da rede pública podem ser acompanhados neste link, enquanto os da rede privada estão disponíveis neste endereço“.
“Desde o início da pandemia, a Secretaria de Saúde vem ampliando o número de leitos de UTI e de retaguarda, além de aumentar a carga horária dos servidores e fazer novas convocações e contratações para garantir o atendimento aos usuários do serviço público”, finaliza a nota.
Sobre a falta de medicamentos, a pasta “reforça que a rede está abastecida de Fentanil, Alfentanila e Atracúrio, medicamentos utilizados para a sedação e intubação dos pacientes. Com relação a outros medicamentos, o Distrito Federal, assim como os outros estados, enfrenta dificuldades para aquisição, devido à escassez dos produtos no mercado”.