Projetos de combate ao racismo no DF ficaram sem investimento em 2020
Pandemia impossibilitou a aplicação dos recursos. Porém, desde 2018, o Executivo local deixou de aplicar R$ 1 milhão na área
atualizado
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Movimentos sociais lutam contra o racismo no Brasil e em Brasília (foto em destaque) neste Mês da Consciência Negra. Na contramão da ação popular contra o preconceito, contudo, o Governo do Distrito Federal (GDF) reduziu os investimentos na promoção da igualdade racial entre 2018 e 2020. Na soma dos três anos, R$ 1 milhão deixou de ser gasto. Em 2020, o Executivo local não empenhou um centavo para mitigar a desigualdade que atinge a população afrodescendente, especialmente os moradores da periferia.
De acordo com a Secretaria de Justiça e Cidadania, responsável pela Subsecretaria de Direitos Humanos e Igualdade Racial do DF, em 2020, foram disponibilizados R$ 26.562,50 para o Conselho de Defesa dos Direitos do Negro e R$ 148.437,50 para a promoção da igualdade racial. No entanto, o dinheiro não foi aplicado até 24 de novembro.
De acordo com a pasta, a pandemia do novo coronavírus inviabilizou os investimentos neste ano, justamente quando o Poder Público local e o federal lançaram auxílios emergenciais para socorrer a parcela mais carente da população.
A Lei Orçamentária Anual de 2019 previa R$ 680 mil para a Subsecretaria de Direitos Humanos e Igualdade Racial. O GDF autorizou o gasto de R$ 69 mil. No entanto, o valor empenhado e liquidado ficou em R$ 30 mil.
A atual gestão não conseguiu informar os valores investidos em 2018. Porém, segundo pesquisa no Sistema Integrado de Gestão Governamental (Siggo), o GDF reservou R$ 1.017.769,00 para a luta antirracista no DF naquele ano. O total empenhado e liquidado foi de R$ 733 mil.
O levantamento foi produzido pelo gabinete do deputado distrital Chico Vigilante (PT).
Migalhas
Do ponto de vista da presidente da Comissão de Igualdade Racial da seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Josefina Serra dos Santos, os números são alarmantes. “Uma dotação dessas é um desrespeito, uma agressão. É uma migalha? Tudo que é relacionado ao negro é uma migalha”, protestou.
Na leitura de Josefina, a formulação e execução do orçamento revelam a falta de empenho do GDF na implementação das políticas públicas sólidas contra o racismo e para a construção da igualdade. A partir de 2021, a comissão irá investigar os gastos do governo distrital e cobrar mais recursos na luta antirracista. Para Josefina Serra, os investimentos são fundamentais, especialmente nas salas de aula.
“Com a execução da Lei nº 10.639 de 2003 e da Lei nº 11.645 de 2008, o professor pode mostrar a verdadeira contribuição do negro para a sociedade. Não é só futebol, samba e violência. Ao mostrar a contribuição real, vamos conseguir a mudança”, ressaltou.
A representante da OAB-DF participou do protesto antirracista em frente ao Carrefour de 402 Sul (fotos abaixo e em destaque), nessa quinta-feira (26/11). A morte de João Beto, espancado em uma unidade da rede de supermercados no Rio Grande Sul, reacendeu o debate sobre o tema no país durante este mês, dando início a uma série de manifestações.
Retrocessos
Na leitura de Jacira Silva, representante do eixo de comunicação da Frente de Mulheres Negras do DF e Entorno, o GDF não tem avançado na luta contra o racismo. E, em alguns casos, tem permitido retrocessos. “Na Saúde Pública, cadê as estatísticas locais dos negros mortos durante a pandemia? Quem eram?”, questionou. Ela entende que a ausência de políticas públicas eficazes para negros também é gritante na educação distrital.
Segundo Jacira, não existe uma política pública integral para a população negra em situação de vulnerabilidade social. “O GDF precisa assumir ações para garantir o bem viver da nossa população”, destacou.
“O racismo é violento. Nos mata todos os dias. Mata nossos desejos, sonhos, prazeres, conquistas, ascensão profissional e realização como pessoa”, lamentou a ativista. Nesta linha, Jacira defende a criação do Conselho de Comunicação do DF para fomentar o debate e buscar soluções para diversos problemas sociais que atingem os brasilienses.
O que diz o governo?
Mesmo sem novos investimentos, segundo a Secretaria de Justiça, o governo local manteve ações para a promoção da igualdade racial no DF. Estão em análise sete emendas parlamentares para a atenção à pauta racial. A pasta publicou decreto reservando 20% das vagas nas seleções para estágio da administração pública distrital a estudantes negros e está em marcha a regulamentação da Lei Distrital nº 6.321/2019, para instituir as cotas raciais nos concursos públicos.
O governo também atualizou o Disque Racismo. A pasta propôs decreto para a criação do Centro de Referência em Direitos Humanos e Igualdade Racial e tem trabalhado no aprimoramento do mapeamento da população do DF por raça, cor e etnia.
Também estão em fase de execução ações de valorização e capacitação da população afrodescendente, além de palestras e webconferências. Em 2019, foram realizadas 85 ações em promoção da igualdade racial e combate ao racismo, segundo a Secretaria de Justiça.
Nessa quinta-feira (26/11), o GDF anunciou o curso “Saúde da População Negra: desafios do SUS”, promovido pela Secretaria de Saúde e oferecido a servidores, trabalhadores e estudantes da área de saúde. As inscrições estão disponíveis até 3 de dezembro. Para mais informações e acesso à ficha de inscrição, clique neste link.
A Secretaria de Justiça e Cidadania do DF é responsável pela manutenção do Disque 156, canal utilizado para denúncias de racismo e outras formas de discriminação. O governo federal disponibiliza o Disque 100.