Programa israelense usado no caso Henry ajuda PCDF a elucidar crimes
O dispositivo é capaz de recuperar mensagens ou imagens apagadas de qualquer equipamento eletrônico
atualizado
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A tecnologia que se tornou a principal arma de apuração do caso Henry Borel Medeiros, 4 anos, também é utilizada por investigadores da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). A corporação conta, desde 2013, com a ferramenta de perícia digital israelense UFED, da fabricante Cellebrite. O dispositivo permite o acesso a diversas fontes de dados, como computadores e dispositivos móveis, dentro do método forense.
A solução é capaz de recuperar mensagens ou imagens apagadas em qualquer equipamento eletrônico – como os celulares apreendidos com a mãe do menino, a professora Monique Medeiros, e com o padrasto, o vereador da Câmara Municipal do Rio de Janeiro Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho. O casal é acusado da morte da criança.
Jairinho e Monique estão com a prisão temporária decretada por 30 dias, por determinação do 2º Tribunal do Júri. Henry foi levado pelo casal para o hospital Barra D’Or, na zona oeste do Rio de Janeiro, onde foi confirmado seu óbito, no dia 8 de março.
Assim como na investigação da morte de Henry, o equipamento da israelense Cellebrite é usado exclusivamente por autoridades policiais. No Brasil, poucos departamentos de perícia criminal contam com o programa, que também ficou famoso no país ao ser usado na Operação Lava Jato. Atualmente, a PCDF se prepara para adquirir a versão Premium, que traz ainda mais funcionalidades.
Análise especializada
Na capital federal, as perícias digitais ficam sob responsabilidade do Instituto de Criminalística, que recebe demandas do Ministério Público, de tribunais de Justiça e de todas as delegacias da Polícia Civil. Em 2020, foram emitidos 3,5 mil laudos de análises em dispositivos móveis.
O aumento de investigações envolvendo crimes cibernéticos fez com que fosse criada a Seção de Perícias de Crimes de Alta Tecnologia (SPCAT), uma espécie de tropa de elite da PCDF, para realização de perícias em crimes ocorridos no ambiente virtual.
A seção conta com especialistas em crimes como invasão de sistemas, furtos de dados bancários pela internet, instalação de aplicativo espião em celulares, análise de dispositivos complexos (como centrais veiculares), entre outros.
Na perícia de um aplicativo espião, por exemplo, é possível descobrir vestígios de autoria, analisando-se para onde as informações estão sendo enviadas.
Daniel Mendes Caldas, chefe da seção, explica que, além da UFED, da Cellebrite, os peritos desenvolvem programas específicos para cada caso, de acordo com a necessidade. Para melhorar o desempenho das investigações, os profissionais pesquisam técnicas de extração, quebra de senhas criptográficas de dispositivos e algoritmos de inteligência artificial.
O nosso objetivo é sempre auxiliar delegados e agentes a chegar, com mais segurança, na verdade dos fatos. Podemos descobrir se o criminoso mentiu no depoimento, encontrar outros comparsas ou até mesmo identificar novos crimes.
Daniel Mendes Caldas, chefe da Seção de Perícias de Crimes de Alta Tecnologia
Veja:
Ainda de acordo com Caldas, mesmo com o aparelho danificado, em muitos casos é possível recuperar dados. “Às vezes, o celular vem com defeito, seja proposital, para destruir a prova, ou natural, decorrente do uso. Nesses casos, o perito repara o celular e extrai as informações”, explicou.
Além de fazer exames em laboratório, os peritos criminais participam de operações policiais, prestando apoio técnico no processo de obtenção dos dados. Nas ações, eles identificam e extraem dos dispositivos eletrônicos informações importantes para o inquérito. No ano passado, os profissionais participaram de 43 operações.
Casos de repercussão
As análises são cruciais na elucidação de crimes como homicídio, pornografia infantil, invasão de sistemas digitais, tráfico de drogas, corrupção e roubo de cargas, entre outros. Em 2019, conforme o Metrópoles noticiou, a prova fundamental que levou três assassinos para a cadeia foi extraída do celular de um deles.
O laudo do Instituto de Criminalística apontou que um dos suspeitos de roubar a Paróquia Nossa Senhora da Saúde, na 702 Norte, e matar Kazimerz Wojno, 71 anos, o padre Casemiro, gravou o crime.
O assalto na casa do padre foi filmado, inclusive o estrangulamento e a morte do líder religioso. Vídeos e fotos extraídas do aparelho mostraram os integrantes do bando comemorando o assalto e usando crucifixos de ouro que pertenciam ao pároco.
Outras imagens registradas com o celular revelam que os criminosos organizaram festas, regadas a bebidas alcoólicas, nas quais ostentavam objetos roubados da casa do padre.
Em 2020, peritos da SPCAT realizaram exame pericial na arquitetura do sistema Getran, do Departamento de Trânsito do DF (Detran-DF), com o objetivo de identificar vestígios relacionados a uma denúncia de cancelamento irregular de multas.
O exame pericial revelou que vulnerabilidades foram inseridas no sistema, para possibilitar que usuários sem permissão realizassem o cancelamentos de multas e o desbloqueio de restrições de veículos.
As vulnerabilidades inseridas foram utilizadas para possibilitar o cancelamento de multas de ao menos 614 veículos, chegando à quantia de R$ 1.371.658,99. Foram realizados também desbloqueios de restrições judiciais e administrativas, que pertenciam a um total de 80 veículos.
O laudo comprovou a materialidade e a dinâmica da ação criminosa, além de trazer vestígios de autoria. Após a análise de mais de 1,5 terabyte de dados, foram identificadas 8.425 requisições fraudulentas, relacionadas a 108 endereços IPs únicos, além de um número de telefone utilizado para realizar as consultas.
As fraudes eram solicitadas pelos proprietários ou usuários dos veículos a despachantes, que, por sua vez, encomendavam os cancelamentos aos hackers. Em alguns casos, as alterações foram feitas para liberar veículos destinados a leilão. A investigação resultou na prisão de seis pessoas, entre elas, despachantes, servidores da autarquia e um hacker.
Em outro caso, que ocorreu agosto de 2020, especialistas realizaram o primeiro exame pericial de intrusão e extração de dados em ambiente virtual com autorização judicial ocorrido no Distrito Federal.
O exame foi realizado após solicitação da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC), que conduzia investigação para desarticular uma organização criminosa responsável por publicar e operar sítios falsos de leilões de veículos na internet.