Por dia, DF tem 7 crianças registradas sem o nome do pai na certidão
Ministério Público do DF tem programa para reconhecimento de paternidade que atua com cartórios e escolas públicas. Conheça o projeto
atualizado
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Entre primeiro de janeiro e 31 de julho de 2022, os cartórios do Distrito Federal contabilizaram o nascimento de 27.089 bebês. Deste total, 1.606 foram registrados apenas em nome da mãe, sem o pai na certidão. Isso representa 6% das crianças nascidas no ano.
Os dados revelam que, por mês, cerca de 230 recém-nascidos no DF foram registrados sem o nome do pai. O que corresponde a, pelo menos, sete casos por dia.
Os números estão disponíveis em módulo do Portal da Transparência do Registro Civil, denominado Pais Ausentes, e que integra a plataforma nacional, administrada pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil).
Pais ausentes
Quando a diarista Willana Santana, 35 anos, engravidou do pequeno Marcos Eduardo Sousa, 4 anos, lidou com a desconfiança da família do pai da criança, Edemário Soares Pereira, 32. Sem o apoio, registrou o menino apenas com o nome dela.
“O pai estava preso por um assalto e eu engravidei após uma visita íntima no presídio. A família paterna começou a questionar a paternidade e acabei colocando apenas meu nome na Certidão de Nascimento”, detalha.
A moradora de Planaltina tem, ainda, três filhos mais velhos. Willana não esconde o desejo de fazer um teste de DNA para confirmar a paternidade do pequeno e acabar com as “especulações” da família do homem.
“Uma vez, minha mãe o levou no hospital e a equipe médica ficou perguntando sobre o pai. É uma situação muito chata. Ainda mais sabendo que é direito do meu filho ter o nome paterno registrado na certidão”, destaca a mãe.
Atualmente, a diarista e Edemário estão juntos novamente. Há mais de dois anos, ele vive em liberdade condicional.
E foi trabalhando no Centro de Referência de Assistência Social (Cras) que o homem ficou sabendo sobre o processo de conceder esse direito ao filho através de um programa do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).
“Recentemente, demos início ao processo de envio da documentação para que o Eduardo tenha o nome do pai no registro. Vai fazer muita diferença na vida dele, tenho certeza”, comenta a diarista.
Programa “Pai legal”
Criado em 2002, o programa “Pai legal” tem o objetivo de regularizar a situação de crianças e adolescentes cuja paternidade não esteja declarada no registro de nascimento. Por meio do trabalho da Promotoria de Justiça de Defesa da Filiação (Profide), 352 crianças e adolescentes do DF tiveram a paternidade reconhecida no primeiro semestre deste ano.
No mesmo período, a Profide realizou 74 acordos de alimentos e custeou 212 exames de DNA para famílias carentes por meio do Fundo DNA, mantido em parceria entre o MPDF e a Associação de Mães, Pais, Amigos e Reabilitadores de Excepcionais (Ampare). Também foram ajuizadas 70 ações nas varas de Família do Distrito Federal.
Para a promotora Leonora Brandão, porém, esses números ainda podem melhorar.
“São cerca de 230 crianças registradas nos cartórios sem o nome do pai, por mês. E nós fazemos de 20 a 30 audiências por mês na Vara de mães que querem esse reconhecimento de paternidade. Então, uma boa parte delas não declara quem são os pais quando vão registrar”, argumenta Leonora.
Mesmo sem saber a atual localização do suposto pai, o MPDFT pode ajudar nessa busca. Também é possível participar do programa se o pai estiver preso ou for falecido.
Segundo Lenora, o apoio das mães é fundamental nesse processo de identificação paterna. “Se elas se negam a fornecer elementos, não temos nem de onde partir. Essa colaboração delas é fundamental para o direito das crianças e para que essa estatística triste diminua cada vez mais”, destaca.
No próprio site do MPDFT é possível acessar formulário para solicitação de investigação de paternidade. Acesse aqui.
Existem três frentes principais de atuação. O “Pai legal cartórios” atende crianças que foram registradas sem o nome do pai. O “Pai legal nas escolas” é voltado para crianças e adolescentes que estão matriculados na rede pública de ensino e não possuem o nome do pai em seu registro de nascimento.
O “Identidade legal” atende crianças e adolescentes que solicitam a primeira carteira de identidade sem o nome do pai. Além disso, é possível procurar a Profide a qualquer tempo.
“Essas frentes nos alimentam hoje em dia com as informações on-line e, com base nesses dados, a gente manda o convite para a mãe para instaurar um procedimento de paternidade em favor do filho. Às vezes, um pai que não foi um bom namorado ou um bom companheiro pode ser um excelente pai. Então, tem que ser dada essa oportunidade”, ressalta a promotora.
Reconhecimento de paternidade
Desde 2012, com a publicação do Provimento nº. 16, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o reconhecimento de paternidade pode ser feito diretamente em qualquer cartório de registro civil do país, não sendo necessária decisão judicial nos casos em que todas as partes concordem com a resolução.
Nos casos em que a iniciativa seja do próprio pai, basta que ele compareça ao cartório com a cópia da certidão de nascimento do filho, sendo necessária a anuência da mãe ou do próprio filho, caso este seja maior de idade. Em caso de filho menor, é necessário a anuência da mãe.
Já se o pai não quiser reconhecer o filho, a mãe pode fazer a indicação do suposto pai no próprio cartório, que comunicará aos órgãos competentes para que seja iniciado o processo de investigação de paternidade.
Também é possível, desde 2017, realizar em cartório o reconhecimento de paternidade socioafetiva, aquele onde os pais criam uma criança mediante uma relação de afeto, sem nenhum vínculo biológico, desde que haja a concordância da mãe e do pai biológico.
Neste procedimento, caberá ao registrador civil atestar a existência do vínculo afetivo da paternidade ou maternidade mediante verificação de elementos concretos: inscrição do filho em plano de saúde ou em órgão de previdência; registro oficial de que residem na mesma unidade domiciliar; vínculo de conjugalidade – casamento ou união estável – com o ascendente biológico; entre outros.