Prisão de Arruda travou licitação que interessava a cartel do Metrô, dizem delatores
Executivos da Camargo Corrêa detalham que “instabilidade política” em 2010 impediu o avanço do certame para ampliação metroviária
atualizado
Compartilhar notícia
O cartel dos trens formado por empresas investigadas na Operação Lava Jato planejava atuar na ampliação do Metrô de Brasília. A revelação é de executivos da construtora Camargo Corrêa, que firmaram acordo de leniência com a Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). No Distrito Federal, contudo, o esquema de fraude não teria chegado a se concretizar. Informações divulgadas nesta segunda-feira (18/12) revelam que o certame não foi realizado devido à “grande instabilidade no cenário político do Distrito Federal” em 2010.
Segundo o relato dos executivos da Camargo Corrêa, a licitação para as obras do Metrô-DF nos trechos Plano Piloto–Asa Norte, Samambaia e Ceilândia foi tema de um dos encontros entre as empresas do chamado “G-5”, grupo composto pela Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, Queiroz Galvão e OAS. O acordo, informam os delatores, estaria sendo costurado desde 2008.A instabilidade à qual os executivos se referem foi o turbilhão provocado pela Operação Caixa de Pandora, deflagrada pela Polícia Federal em novembro de 2009. As investigações levaram à prisão, em fevereiro de 2010, do então governador do DF, José Roberto Arruda (PR), acusado de obstruir a apuração do chamado Mensalão do DEM. O escândalo resultou na mais grave crise dos últimos anos na política brasiliense.
O empreendimento de expansão metroviária seria dividido entre firmas de construção civil, como a Camargo Corrêa, a Andrade Gutierrez e a Serveng, além de companhias dos ramos: de serviços de sinalização, controle e telecomunicações, como a Alstom; de energia, como a lesa; e de projetos de engenharia, que ficariam por conta da TC/BR.
Projeto de licitação
Para garantir o sucesso no certame, as empresas teriam financiado a elaboração do próprio projeto-base da licitação, executado pela TC/BR. Os custos dos estudos, informam os delatores, foram divididos entre as firmas, com rateio controlado pela Andrade Gutierrez. Era necessário, segundo os depoimentos, “forte alinhamento com o Governo do Distrito Federal”.
O relato, integrante do acordo de leniência, detalha que, além do consórcio, apenas a Odebrecht conseguiu se pré-qualificar para concorrer à licitação. Já havia, no entanto, um acerto para ela ofertar proposta de cobertura em favor do grupo formado pelas outras companhias.
Os delatores afirmam haver a possibilidade de o próprio edital para pré-qualificação ter sido elaborado “de modo a restringir a participação de empresas não alinhadas”.
O projeto de licitação teria sido elaborado por um grupo de trabalho com profissionais das três firmas, que se reuniam no escritório da Serveng em Brasília. Todo o material produzido pelo consórcio, afirmam os executivos, era consolidado pela Andrade Gutierrez e entregue a um funcionário do Metrô-DF.
Dificuldades
A fase comercial da licitação, contudo, nunca chegou a ser lançada pelo Governo do Distrito Federal (GDF). Segundo os delatores, um pacote completo com licitação, edital e anexos foi entregue em 2009 a representantes do governo local, que não publicou os materiais. Havia, descrevem os executivos, uma dificuldade de o Executivo “internalizar” o planejamento preparado pelas companhias.
Os percalços se deram, de acordo com o acordo de leniência, porque a TC/BR não havia sido contratada pelo GDF por meio de licitação para fazer o projeto. Assim, os estudos que embasariam o edital precisariam ser assinados por alguém do próprio Metrô-DF, e isso significaria envolver o corpo técnico do órgão nas discussões, aumentando o risco de exposição das irregularidades.
Em 2010, com a prisão de Arruda, os planos para a licitação foram “postos de lado”, segundo os delatores. O plano, no entanto, não teria sido abandonado pelo “G5”, que ainda o contabilizava como uma possível negociação para o futuro.
Outro lado
A Odebrecht afirmou estar colaborando com a Justiça no Brasil e nos países em que atua. Conforme diz em nota, a empresa “já reconheceu os seus erros, pediu desculpas públicas, assinou acordos de leniência com autoridades de Brasil, Estados Unidos, Suíça, República Dominicana, Equador e Panamá, e está comprometida a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas”.
A Andrade Gutierrez informou estar “empenhada em corrigir qualquer erro ocorrido no passado”. A companhia disse ter assumido o compromisso publicamente, ao pedir desculpas em um manifesto veiculado nos principais jornais do país, e que segue colaborando com as investigações em curso, dentro do acordo de leniência firmado com o Ministério Público Federal.
A empresa declarou ainda ter incorporado diferentes iniciativas, nas suas operações, para garantir a lisura e a transparência de suas relações comerciais, seja com clientes ou fornecedores, e afirma: tudo aquilo que não seguir rígidos padrões éticos será imediatamente rechaçado pela companhia.
A construtora Queiroz Galvão alega não comentar investigações em andamento. Já a OAS informou que a companhia não irá se pronunciar sobre o caso.
O advogado de defesa de Arruda, Paulo Emílio Catta Preta, afirmou que não vai se manifestar sobre revelações parciais. “Temos resguardado o direito de falar quando tivermos o acesso amplo e irrestrito ao material”, concluiu.
O Metrô-DF afirmou, por meio de nota, que as denúncias contra a Camargo Corrêa e demais empresas investigadas pelo Ministério Público Federal e pelo Cade, em segredo de Justiça, envolvem contratos assinados em gestões anteriores.
“A atual gestão não mantém nenhum contrato com as empresas citadas na investigação”, disse. Sobre os serviços de manutenção da companhia, o Metrô de Brasília informou que realizou uma nova licitação em 2015, com economia de R$ 57 milhões, anualmente, em relação aos contratos anteriores.
Colaborou Manoela Alcântara