Henrique Luduvice sobre Ricardo Leal: “Estou preocupado com o Criança”
Ex-DER foi flagrado em grampo da Operação (12:26). Ele se referia a um dos principais arrecadadores da campanha de Rollemberg em 2014
atualizado
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Conversas do ex-diretor do Departamento de Estradas de Rodagem do Distrito Federal (DER-DF) Henrique Luduvice (foto em destaque) aparecem em grampos contidos no Inquérito nº 386/2018, origem da Operação (12:26), que apura o tráfico de influência no GDF. No documento, ao qual o Metrópoles teve acesso com exclusividade, o ex-gestor – primo de Rodrigo Rollemberg (PSB) – afirmou estar preocupado com “o Criança”, identificado no inquérito como Ricardo Leal, um dos principais arrecadadores da campanha de 2014 do governador.
O comentário foi feito ao representante comercial Augusto Diniz, investigado no âmbito da ação da Polícia Civil e do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Liderada pela Coordenação Especial de Combate à Corrupção ao Crime Organizado e aos Crimes Contra a Administração Pública (Cecor), a apuração coloca em foco suposta prática de tráfico de influência, advocacia administrativa e organização criminosa na cúpula do Palácio do Buriti.
O inquérito que originou a Operação (12:26) destaca a relação entre os personagens interceptados: Henrique Luduvice é irmão de Maurício Luduvice, presidente da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb). Augusto Diniz tem atuação na Fundação da Previdência Complementar (Fundiágua), ligada à empresa pública. O grupo Elo, do qual Diniz é sócio, foi responsável pela corretagem do plano de saúde da Fundiágua.
Luduvice, contudo, não é alvo da investigação. Nas únicas vezes em que o nome dele aparece – nas páginas 45, 46 e 47 do Inquérito nº 386/2018 –, os policiais monitoravam Augusto Diniz, apontado como um dos principais nomes do esquema.
O primeiro telefonema
Nos dois telefonemas interceptados, os próprios investigadores não conseguem compreender tudo o que está sendo dito. A primeira conversa ocorreu em 18 de junho de 2018. Na ocasião, Henrique Luduvice disse: “Aquele assunto está em rota de solução (…) Então, na audiência a gente ganhou uma certa tranquilidade”.
Não há sinalização no documento da polícia do que seria o tema a respeito do qual os dois dialogavam.
Logo depois dessa declaração, Luduvice disse que “está preocupado com a história do Criança”. De acordo com a polícia, Criança é Ricardo Leal e Luduvice “faz referência a uma nota publicada na revista IstoÉ”.
O Inquérito nº 386/2018 não informa se há relação entre o trecho em que Luduvice fala sobre “o assunto em rota de solução” e a preocupação com Ricardo Leal referente à nota publicada pela IstoÉ.
O texto em questão foi divulgado em 15 de junho na revista de circulação nacional e consta na coluna Linha Direta, do jornalista Ricardo Boechat.
Veja reprodução do trecho da nota que cita Leal:
“Em depoimento à Operação Câmbio, Desligo, [o operador financeiro] Lúcio Funaro revelou a entrega de dinheiro vivo ao ex-presidente do Banco de Brasília (BRB) Ricardo Leal. Apelidado de Criança, ele foi apontado como ‘um dos precursores dos desvios de recursos dos fundos de pensão no Brasil’.”
Apesar da menção, Ricardo Leal nunca presidiu o BRB. Na realidade, integrava o Conselho de Administração do banco.
Além da Câmbio, Desligo, o nome de Ricardo Leal é citado em outra operação que foi desdobramento da Lava Jato: a Sépsis. Nesse caso, o ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal (CEF) Fábio Cleto, em delação premiada, se refere a Ricardo Leal como Chuck. Essa ação investiga suposto esquema de corrupção no fundo de investimentos FI-FGTS.
O segundo telefonema
Em 23 de junho, portanto, há menos de dois meses, Luduvice e Diniz conversaram novamente. Dessa vez, o diálogo é ainda mais truncado do que o anterior, registrado cinco dias antes do primeiro.
Os próprios investigadores dizem que “o alvo Augusto Diniz e Henrique Luduvice conversam em forma de códigos acerca de um possível litígio judicial e a intenção de fazer prevalecer um ‘texto’ para ‘dar tranquilidade’ a uma terceira pessoa”.
Ainda de acordo com a polícia, “há menção à ‘companhia’. Até o presente momento, contudo, não foi possível elucidar sobre qual companhia o assunto versa. O tema permanece em processamento visando elucidar qual objeto”.
O Inquérito nº 386/2018, então, transcreve parte do diálogo entre Augusto Diniz e o ex-diretor do DER. Luduvice afirma ter recebido informações sobre possível encontro com desembargador para “resolver, para suspender”. “Na verdade, a proposta de acordo, aquela que está escrita, não está sendo levada, entendeu? Não sei se é devido à companhia não querer abrir mão da liminar”, prosseguiu.
Apesar de mencionarem as próprias dúvidas em relação às conversas interceptadas, os investigadores ressaltam que, além da atuação na Fundação da Previdência Complementar (Fundiágua), “outro vínculo que conecta Augusto Diniz à Caesb é uma ação judicial em tramitação na 6ª Vara de Fazenda Pública”. A polícia, contudo, não dá detalhes sobre o objeto do processo em andamento na Justiça.
O que diz Luduvice
Procurado pelo Metrópoles para comentar o diálogo interceptado pela polícia, Luduvice explicou que a relação dele com Augusto Diniz e Ricardo Leal vem desde a infância.
Conheço Augusto Diniz e Ricardo Leal, assim como suas famílias, desde os tempos de colégio. E, no telefonema em questão, apenas expressei preocupação com uma notícia veiculada em um órgão de comunicação, sem qualquer juízo de valor
Henrique Luduvice
Segundo Luduvice, Ricardo Leal era apelidado de Criança por ser o mais novo de um grupo de amigos. O ex-diretor do DER-DF reitera que, ao longo da carreira, jamais participou de ato sem estrita ligação com as exigências legais e nunca cometeu irregularidades.
Luduvice diz ainda que “jamais intercedi junto à Caesb em qualquer pleito, sobre tema algum. O respeito pessoal e profissional é uma das características das relações familiares”, afirmou.
“Em nenhum momento durante a minha participação no atual Governo do Distrito Federal, ou mesmo durante a minha extensa carreira profissional, participei de ação que não estivesse em plena consonância com a legislação vigente”, conclui Luduvice.
Indisposição com o governador
Embora tenha integrado os quadros do GDF e seja primo de Rollemberg, hoje, Henrique Luduvice briga contra o governo. Ele permaneceu à frente do DER-DF até 7 de fevereiro de 2018, um dia após a queda do viaduto sobre a Galeria dos Estados, no Eixão Sul. Ele não resistiu ao desgaste provocado pelo episódio e foi exonerado.
Desde então, não fez mais parte do governo e luta no Tribunal de Contas do DF (TCDF) e no Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) contra a tentativa do GDF em atribuir ao DER-DF a responsabilidade pelo desabamento da estrutura viária no Eixão Sul.
O que diz o GDF
Na última terça-feira (7) – data na qual foi deflagrada a Operação (12:26) –, mesmo sem ainda ter conhecimento da íntegra das investigações, o GDF emitiu nota para esclarecer pontos específicos divulgados até então pela Polícia Civil e pelo Ministério Público.
No documento, o governo nega as acusações feitas pelos investigadores de ter havido prática de advocacia administrativa e tráfico de influência.
A reportagem não conseguiu contato com Augusto Diniz.