Em 60 dias, bancada do DF na Câmara promoveu servidores e turbinou salários
Teve gabinete onde um terço do quadro funcional ascendeu. E situações em que o contracheque aumentou acima de 50% no período
atualizado
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Na iniciativa privada, os trabalhadores contratados passam por 90 dias de experiência. É o prazo em que as empresas avaliam os recém-contratados para saber se realmente estão preparados para desempenhar as atividades. Na Câmara dos Deputados, a bancada do Distrito Federal não precisou nem de 60 dias para promover 20 comissionados. A quantidade pode não ser tão grande num universo de 141 nomeados. Mas a movimentação funcional chama a atenção pelo curto espaço de tempo.
Outra coisa: teve gabinete, caso do Professor Israel Batista (PV), onde um terço do quadro de pessoal ascendeu. E situações nas quais a remuneração (com ou sem gratificação) do comissionado promovido recebeu uma boa turbinada, acima de 50%, como ocorreu com servidores de Flávia Arruda (PR), Bia Kicis (PSL), Paula Belmonte (Cidadania), Luis Miranda (DEM) e do próprio Israel.
O Metrópoles pesquisou a relação, disponível no site da Casa, dos servidores dos oito deputados do Distrito Federal. Seis deles promoveram funcionários entre fevereiro, março e o dia 1º de abril.
No Legislativo federal, cada deputado pode ter até 25 secretários parlamentares (SP), cargo de livre provimento (sem concurso), e o teto para gastar com eles é o de R$ 111.675,59 mensais por gabinete. Isso quer dizer que quanto mais comissionados, menor é o salário pago a cada um.
O vencimento bruto começa em R$ 1.025,12 e segue até o limite de R$ 15.698,32 (veja tabela abaixo), podendo ter ou não o acréscimo da Gratificação de Representação de Gabinete (GRG). A Casa ainda conta com os cargos de Natureza Especial (CNEs), lotados geralmente nas lideranças partidárias, comissões e órgãos da Mesa Diretora. Para eles, a bolada é maior e varia entre R$ 3.664,79 e R$ 19.902,20.
O valor considerado das remunerações é o bruto, ou seja, sem descontos de INSS e Imposto de Renda, entre outros. Também não foram contabilizados benefícios, como auxílios alimentação, creche e de saúde. Vale destacar que, em fevereiro, alguns comissionados podem não ter recebido o vencimento cheio, em razão de terem sido nomeados durante o mês, já que os parlamentares foram empossados em 1º/2.
Movimentações
De acordo com a relação disponível no portal da Câmara, o Professor Israel Batista é o deputado brasiliense que mais promoveu seus subordinados. Ao todo, cinco dos 14 funcionários atuais de sua equipe subiram de posição. O professor também exonerou uma funcionária.
Uma das servidoras teve o salário, no período pesquisado, quase triplicado, passando do cargo de SP-21 (e remuneração de R$ 5.344,38) para SP-25, no limite máximo liberado: R$ 15.698,32.
Paula Belmonte ascendeu três, entre 12 comissionados. Uma das funcionárias beneficiadas teve o contracheque turbinado, passando de SP-21 (R$ 3.053,94) para SP-25 (R$ 7.849,16). A parlamentar também assinou uma exoneração no período.
Bia Kicis deu promoção a dois, entre 16 funcionários. Um deles subiu 12 níveis em menos de 60 dias, passando de R$ 3.997,38 para R$ 5.271,20. Outra servidora começou o mês de fevereiro no primeiro degrau (SP-1) atingindo R$ 5.271,20 (SP 20) em março.
Flávia Arruda também fez modificações no gabinete: entre 12 pessoas, a parlamentar ascendeu duas e rebaixou outra. Uma delas aparece na folha de fevereiro com remuneração de R$ 3.534,56, passando em março para R$ 10.542,40. O outro servidor deixou de ser secretário parlamentar e foi nomeado em um CNE-7. No novo posto, o contracheque subiu de R$ 14.520,47´para R$ 19.902,20.
Luis Miranda (DEM) promoveu um do seu quadro de 18 comissionados. O funcionário recebeu R$ 9.161,80 (SP-21) em fevereiro e passou para R$ 14.141,44 em março (SP-25). Outros dois foram exonerados nos primeiros dois meses de mandato.
Única remanescente da última legislatura, Erika Kokay (PT) deu um plus nos salários de sete entre 25 colaboradores. O caso dela, entretanto, é diferente dos colegas porque os empregados que ganharam promoção trabalham no gabinete há, pelo menos, dois anos. Em 2019, a petista também exonerou dois funcionários.
Os outros dois parlamentares do Distrito Federal fizeram modificações em suas equipes, mas no sentido contrário. Celina Leão (Progressista) rebaixou uma servidora entre 20. Júlio Cesar Ribeiro (PRB) exonerou uma pessoa, ficando com 24 funcionários.
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De olho
Doutor em administração pública e governo, o professor da Universidade de Brasília (UnB) Caio César de Medeiros Costa avalia que as promoções de servidores em pouco tempo de mandato demonstram pouca familiaridade com a complexidade da atividade de deputado federal.
“Poderiam ter tido uma ideia do que fariam e perceberam que não era assim. Talvez, também, precisaram motivar mais seu staff ”, comentou. O docente assinala, ainda, que a população deve ficar de olho no trabalho dos gabinetes.
Já que o deputado tem autonomia para, dentro desse limite de dinheiro, contratar até 25 comissionados, o que a gente tem que fazer enquanto cidadão é acompanhar para ver se vai reverberar em uma atividade parlamentar mais qualificada
Caio César de Mederios Costa, da UnB
Fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco frisa que, com um recurso limitado, se os parlamentares optarem por pagar salários menores, terão mais trabalhadores. Por outro lado, se despendem mais dinheiro para as remunerações, consequentemente, terão menos funcionários.
Conheça a bancada do DF na Câmara dos Deputados:
O outro lado
Por meio de nota, Professor Israel Batista disse que as nomeações “ocorreram rigorosamente dentro das regras da legislação prevista no Ato da Mesa Diretora 72, de 16/09/1997″. O parlamentar explicou que as alterações devem-se “a um processo de organização interna de gabinete e foram feitas de acordo com as estratégias políticas do mandato”.
Paula Belmonte esclareceu, em nota, que as mudanças de funções “estão em absoluto acordo com a legislação e podem ocorrer a qualquer tempo ao longo do mandato”. “Sendo assim, foram promovidos ajustes nas funções e remunerações exercidas no gabinete conforme a necessidade e visando sempre a prestação do melhor serviço à população”, pontuou.
Flávia Arruda afirmou que ‘fará ajustes no gabinete conforme se apresentarem as necessidades de suporte à sua atividade parlamentar”.
Luis Miranda disse que o servidor promovido “trabalha sábado, domingo… Não tem limite”. O deputado argumentou que se tratou de um período de experiência no qual o funcionário ficou em cargo mais baixo por um mês e seis dias. “Fui o único que fiz concurso público e todos os contratados, sem exceção, têm nível superior”, completou.
Erika Kokay afirmou que fez uma avaliação do trabalho e precisou fazer mudanças. “É um processo natural na medida em que tem aumento de jornada, de acordo com a necessidade do gabinete e do próprio desempenho dos trabalhadores”, relatou.
Por meio da assessoria de imprensa, Celina Leão informou que rebaixou uma servidora por questões de ajustes. “E assim, atender a demanda funcional do gabinete”. Bia Kicis e Júlio Cesar Ribeiro não se pronunciaram até a última atualização deste texto.
O que diz a Câmara
A Câmara dos Deputados afirmou, em nota, que as indicações para os níveis de retribuição podem ser feitas a qualquer tempo pelos parlamentares, conforme estabelece Ato da Mesa.
Explicou que o pagamento dos servidores é feito regularmente no segundo dia útil após o dia 20 e que são considerados os dias trabalhados desde a data da posse até o último dia do mês de referência. Caso o servidor tenha tomado posse ou tenha sido exonerado após o fechamento da folha de pagamento, receberá a respectiva remuneração no próximo salário.
“Normalmente, ocorrem ajustes na folha de pagamento complementar do mês ou na folha normal do mês seguinte, com a finalidade de acertar o valor exato da remuneração do servidor. Isso ocorre em razão de eventos novos – como posses, exonerações, mudanças de nível etc. – que não foram processados a tempo na folha normal do mês e alteram o valor já pago”, completou a nota.