Crise pra quem? Cargos em conselhos turbinam o salário de secretários. Há quem ultrapasse os R$ 30 mil com os tais jetons
Pelo menos seis integrantes do primeiro escalão do GDF participam de conselhos de estatais e conseguem reforçar o contracheque
atualizado
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Com o discurso de ter herdado um governo em dificuldade financeira, Rodrigo Rollemberg (PSB) precisou de criatividade para convencer servidores do Executivo e do Legislativo federal a largarem seus órgãos de origem para embarcar na aventura de gerir o Distrito Federal em tempos de contingenciamento de recursos. E essa criatividade tem nome: jeton — aquela remuneração extra para os representantes do GDF que participam de conselhos fiscais ou de administração de empresas controladas direta ou indiretamente pelo Estado.
O jeton pago por essa atividade extra é feito em folha suplementar. Embora a soma com o salário ultrapasse o limite permitido por lei em alguns casos, o teto só leva em conta os vencimentos do contracheque. Dessa forma, há secretários que conseguem turbinar o holerite sem entrar na regra do abate-teto.O secretário-adjunto de Planejamento, Renato Brown (foto principal, à esquerda), por exemplo, possui cadeira cativa em três conselhos — embora receba apenas pelo colegiado Fiscal do BRB, do qual é titular. Nos demais, é suplente. Ainda assim, a contrapartida mensal, de R$ 8.750, é suficiente para engordar a conta bancária. Em janeiro, por exemplo, o salário líquido do secretário foi de R$ 25.491. Ao se somar o jeton, a cifra sobe para R$ 34.241.
Ao Metrópoles, Renato Brown admitiu que é membro de três conselhos. “Eu participo do Conselho Fiscal do BRB, de Adminstração da SAB (Sociedade de Abastecimento de Brasília) e do Iprev. Mas só recebo por um”, afirmou ele.
O secretário da Fazenda, João Antônio Fleury Teixeira, é colega de Brown no Conselho Fiscal do BRB. Em janeiro, o salário líquido dele foi de R$ 19.834. Com o jeton, o funcionário aposentado do Banco Central recebeu R$ 28.584.
Além de Brown e de Fleury, há ao menos outros oito servidores do alto escalão do governo que abocanham jetons. São eles: os secretários Fábio Gondim Pereira da Costa (Saúde), Leany Lemos (Planejamento), Marcos Dantas (Mobilidade Urbana) e Sérgio Sampaio (Casa Civil — foto, ao centro); o ex-secretário de Fazenda Pedro Meneguetti (foto, à direita); o ex-chefe de gabinete de Rollemberg Rômulo Milhomem Freitas Figueira; o diretor do Departamento de Estradas de Rodagens (DER), Henrique Leite Luduvice; e o próprio presidente do BRB, Vasco Cunha Gonçalves.
Além do salário — que não foi revelado pelo banco —, Vasco recebe um agrado de R$ 8.750 pela participação no Conselho de Administração do BRB. Na mesma turma, estava o ex-secretário de Fazenda Pedro Meneguetti, antes de deixar o cargo. Já Leany Lemos e Sérgio Sampaio recebem R$ 1.371 por participar do Conselho de Administração do Instituto de Previdência dos Servidores do Distrito Federal (Iprev).
Uma peculiaridade dos conselhos é que os encontros não têm carga horária fixa. Alguns chegam a se reunir a cada três meses. Entre as atribuições, estão as de orientação, fiscalização e controle dos atos da administração, além de análises dos livros e papéis da companhia, bem como contratos celebrados ou em via de celebração.
Entendimento do STF
Por meio de nota, o GDF ressaltou à reportagem que não há ilegalidade em receber o jeton e o salário. Ainda de acordo com o governo, a própria Constituição Federal diz que a soma dos salário com os benefícios não se enquadra para fins do cálculo de teto constitucional. “O Supremo Tribunal Federal, em diferentes ocasiões, já pacificou o entendimento de que a verba de representação, que é o jeton, possui caráter indenizatório.”
O GDF cita a Lei n° 5.416, de 24 de novembro de 2014, que determina que “a indicação de conselheiro deve recair em pessoa com comprovada experiência técnica e profissional no ramo de atividade por ela desempenhada ou com notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de administração pública”.
Com base nisso, o Executivo local acrescenta que os “titulares das secretarias que integram o núcleo econômico do governo foram colocados nos conselhos das empresas públicas para buscar condições necessárias para ajuste fiscal, dado o fato de esses órgãos gerarem despesas, sendo preciso, portanto, mantê-las sob supervisão. Nesse sentido, é preciso esclarecer ainda que, embora alguns secretários acumulem atividades em conselhos, legalmente, só se é possível receber por um”.