CLDF engaveta 23% dos projetos em trâmite por inconstitucionalidade
Das 408 proposições distribuídas para a CCJ, 96 foram rejeitadas desde o início da atual legislatura, em 1° de janeiro
atualizado
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Conhecida por aprovar uma infinidade de projetos inconstitucionais que acabam derrubados na Justiça, a Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) teve, nos quatro primeiros meses de 2019, quase 25% das proposições consideradas ilegais ainda na fase de tramitação. É o que revela o Relatório Quadrimensal da Comissão de Constituição e Justiça da Casa (CCJ), órgão responsável pela análise sobre a legalidade das matérias.
Das 408 proposições distribuídas para a relatoria na CCJ, 96 receberam o carimbo do colegiado pela inadmissibilidade de tramitação. A maior parte foi recusada por vícios de iniciativa – quando os parlamentares tentam legislar sobre assuntos de competência exclusiva dos Executivos local e federal.
Entre as propostas inusitadas que tiveram a constitucionalidade rejeitada está a que obrigaria os hotéis do DF a incluírem no café da manhã um cardápio para diabéticos. Outra ideia parecida tentava estabelecer menu alternativo em restaurantes para pessoas com problemas cardíacos, hipertensas e obesas. A Câmara Legislativa não tem competência para legislar sobre a atuação de empresas particulares.
Parlamentares também tentaram regulamentar a cobrança da taxa de serviço nos “restaurantes, lanchonetes, bares e congêneres”, mas não cabe ao Legislativo propor esse tipo de norma.
“A CCJ analisa a constitucionalidade, a juridicidade, a legalidade, a regimentalidade, a técnica legislativa e a redação dos projetos. Caso não correspondam aos critérios, terão parecer pela inadmissibilidade. Essa é a função do comissão”, disse o presidente do colegiado, Reginaldo Sardinha (Avante).
Recurso ao plenário
Quando um projeto é considerado inadmissível pela CCJ, ele não segue para a apreciação no plenário. Para reverter a situação, o autor precisa apresentar recurso ao pleno no prazo máximo de cinco dias, segundo o Regimento Interno da Casa.
Ex-presidente da comissão terminativa, o deputado Reginaldo Veras (PDT) foi o principal responsável pelas rejeições dos textos apresentados por correligionários. Das 93 propostas relatadas por ele na CCJ, 48 tiveram a inadmissibilidade decretada.
“A maioria dos projetos não tem como evoluir. O principal erro é o vício de iniciativa, quando eles [os distritais] propõem coisas que não são de competência da Câmara Legislativa. Os deputados sabem disso, mas arriscam para ver se cola”, afirmou ao Metrópoles.
Relatório 1º Quadrimestre CCJ/CLDF by Metropoles on Scribd
Histórico de inconstitucionalidade
O estigma da Câmara Legislativa sobre aprovar leis consideradas inválidas não é à toa. De 2010 a 2017, por exemplo, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) e o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmaram a inconstitucionalidade de 77% das leis aprovadas pelos distritais e questionadas pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Não há uma aferição mais recente.
De acordo com o levantamento da época, em cerca de 90% dos casos, a ilegalidade de tais normas foi por vício de iniciativa, ou seja, elas não poderiam ser propostas pelos parlamentares. O percentual mostra que, mesmo sabendo que seus projetos contrariam a legislação, os distritais brasilienses insistem em perder tempo e dinheiro público ao propô-los e aprová-los.
“Às vezes, com o intuito de agradar sua base, os deputados apresentam as matérias e tentam negociar com o relator e, quando isso não dá certo, combinam de apresentar um voto em separado. Mas, ultimamente, nem mesmo essa estratégia tem funcionado”, disse Reginaldo Veras.
Já para o advogado Luis Carlos Alcoforado, especialista em direito constitucional, o legislador precisa ter conhecimento profundo sobre os limites para a atuação parlamentar.
“Quando há textos inconstitucionais, a lei é natimorta e não vencerá as etapas, seja no Legislativo ou mesmo no Judiciário. O combate a esse tipo de prática é uma ação mais que necessária, já que o trabalho de legislar envolve estruturas da Casa de toda a sorte, como tempo de servidores e recursos públicos. Isso precisa ser respeitado por quem ocupa uma daquelas cadeiras”, disse.