PMDF paga gasolina no débito, mas postos cobram valor no crédito
Polícia Militar abre processo administrativo para apurar por que alguns estabelecimentos do DF têm adotado a prática, e exigirá reembolso
atualizado
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A Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) está pagando mais caro pela gasolina das viaturas. Apesar de um contrato ter sido firmado em 1º de julho de 2019, no valor de R$ 30,7 milhões, com a garantia de que os menores preços seriam praticados, alguns postos cobram o valor correspondente à venda no crédito, mesmo com os policiais militares usando cartão de débito.
A corporação abriu processo administrativo para apurar o valor do prejuízo. O levantamento vai embasar pedido de ressarcimento que a PMDF pretende fazer.
Durante uma semana, o Metrópoles acompanhou a rotina em três dos postos conveniados com a Polícia Militar. Um deles, na Asa Sul, cobrou o preço correto. Os demais, localizados na Candangolândia e na Asa Norte, direcionaram as viaturas às bombas com valores programados para os pagamentos a prazo.
Na Candangolândia, os PMs chegaram a questionar a gerente do estabelecimento sobre o motivo do valor mais elevado. A funcionária explicou que, apesar de os policiais usarem cartão para pagamento à vista, a verba só é repassada aos postos 30 dias após o abastecimento, o que, segundo ela, configura a venda a prazo. A gerente admitiu que a diferença das cifras pode chegar a R$ 0,20 por litro.
Na última quinta-feira (31/10/2019), o preço da gasolina no local variava de R$ 4,29 no débito a R$ 4,39 no crédito. A profissional informou que os donos dos postos estavam em processo de negociação com a ValeCard – empresa responsável pelos cartões usados pela PMDF –, mas não soube determinar quando o problema será resolvido ou se haverá ressarcimento de valores à corporação.
Confira o vídeo:
À reportagem, um dos militares contou que se recusou a abastecer no local, uma vez que, ao passar o cartão, o valor é imediatamente descontado nos caixas da corporação. “Se eles recebem o valor 30 dias depois, não é problema nosso. O dinheiro que usamos está disponível e vem do Fundo Constitucional. Não faz sentido firmar um contrato que vai cobrar mais caro para abastecer uma frota inteira”, denunciou o policial, que pediu para não ser identificado.
A gerente de um posto da Asa Norte – no qual a gasolina estava a R$ 4,25 no débito e R$ 4,39 no crédito – também admitiu que cobra mais caro dos veículos do Governo do Distrito Federal (GDF). A mulher justificou que as taxas cobradas pela empresa gestora do contrato são altas, e disse que os proprietários resolveram estipular o preço superior para não “ficarem no prejuízo”.
A PMDF informou ao Metrópoles que o valor mensal pago pelo abastecimento das viaturas não é fixo, varia mês a mês, mas, atualmente, a média de pagamentos mensais está em torno de R$ 1,2 milhão. Estas despesas são pagas com o orçamento do Fundo Constitucional.
Contrato
A empresa responsável por administrar e repassar os recursos aos postos conveniados é a Trivale Administração LTDA, ou ValeCard, com sede em Uberlândia (MG). O contrato firmado com a Polícia Militar do Distrito Federal é claro ao estabelecer que cabe à contratada o acerto financeiro com os integrantes da rede credenciada, por meio de transações eletrônicas e notas fiscais, além de garantir o menor preço.
“Os valores transacionados através dos cartões terão como limite o menor preço praticado entre o valor da bomba à vista e o preço médio publicado pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) para os combustíveis no Distrito Federal”, diz trecho do contrato.
Além de fazer a gestão dos postos, a empresa é obrigada a fornecer um sistema informatizado disponibilizando os preços cobrados pelos estabelecimentos conveniados, por ordem crescente de valores. É necessário, ainda, expedir relatórios gerenciais de controle informando o histórico de quilometragem, custos, identificação do veículo, datas, horários, valores e endereços dos postos, assim como o tipo de combustível e a quantidade.
O acordo, que tem vigência de um ano, estabelece ainda um desconto de 4,25% no fornecimento de gasolina, etanol e diesel. Cabe ao Distrito Federal fiscalizar o cumprimento das obrigações e encargos no que se refere à execução do contrato.
Investigação
Questionada sobre a possível irregularidade, a Polícia Militar do Distrito Federal informou que notificou a empresa fornecedora dos cartões. De acordo com a corporação, a ValeCard apresentou justificativas e alegou que está providenciando a solução.
A PMDF instaurou processo administrativo visando ao reembolso das cifras que foram pagas a mais. A polícia revelou à reportagem que a maioria dos valores que constam nos relatórios elaborados pela empresa se referem a vendas a crédito. Os documentos servem como provas e serão anexados ao processo.
O outro lado
Por meio de nota, a ValeCard nega que tenha cometido alguma irregularidade. A empresa explica que o serviço contratado pela PMDF não se trata de cartão de débito ou crédito, e declarou que tem dois marcos de preços: o da ANP ou o menor valor à vista.
A companhia, no entanto, ponderou que, “na garantia do preço à vista, a ValeCard atua caso a caso, na medida em que toma conhecimento da ocorrência de discrepâncias praticadas pelos postos”, e acrescentou que “atua mediante negociações comerciais constantes junto à sua rede de credenciados para garantir o menor preço e as melhores condições de atendimento”.
Por fim, destacou que vai assumir o custo da diferença, conforme determinado em contrato. “Mesmo não tendo conhecimento imediato da prática de cada posto em relação à aplicação de preços à vista/a prazo, a ValeCard assegura, via sistema, o desconto necessário a garantir à PMDF o menor preço.”
Ao Metrópoles, o presidente do Sindicombustíveis-DF, Paulo Tavares, defendeu que os donos dos postos estão ficando no prejuízo ao fechar contrato com a ValeCard. “Eles recebem o recurso da PMDF e só repassam aos postos após um prazo de 40 dias. Além disso, cobram uma taxa de 3,6%, praticamente três vezes maior do que a normal, de 1,4%, referente à comercialização do litro no débito. A nossa margem é de 20 centavos por litro pago à vista. A taxa alta desconta em boa parte do nosso lucro. É desvantagem”, reclamou.