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PM doa e fecha postos comunitários. População reclama de insegurança

Cerca de 35% das unidades estão sucateadas e 26% foram doadas. Polícia manterá em funcionamento apenas as localizadas em pontos estratégicos

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Felipe Menezes/Metrópoles
Novos usos dos Postos Comunitarios de Seguranca
1 de 1 Novos usos dos Postos Comunitarios de Seguranca - Foto: Felipe Menezes/Metrópoles

Dentro do kinder ovo de aço, pintado coincidentemente de marrom por fora e branco por dentro, os acordes inseguros dos estudantes de baixo elétrico ganham uma projeção que a sala de aula de alvenaria não consegue proporcionar. “Aqui tem uma acústica diferente”, observa o professor de música Adonias Alcântara, 48 anos. As aulas são realizadas dentro de um antigo posto comunitário de segurança (PCS), que costumava abrigar policiais militares. O “milagre” da acústica perfeita se deve a um simples fato: os módulos, que custaram em média R$ 150 mil cada aos cofres públicos, foram construídos com isolamento termo-acústico em isopor.

Quinze deles foram doados em dezembro do ano passado à Escola de Música de Brasília e, após algumas adaptações, agora servem como sala de aula e de estudos aos quase três mil alunos de 36 cursos variados, divididos em três turnos diferentes. “O melhor é essa ação cidadã de reaproveitamento do que é público”, diz Edilene Abreu, diretora da escola.

A reutilização dos Postos Comunitários de Segurança (PCSs) para servir à comunidade em atividades de cunho social e cultural foi a solução encontrada pela Polícia Militar para dar conta de um passivo com a população. Os R$ 18 milhões gastos em dinheiro público para a construção das 131 unidades foram para o ralo quando 46 delas sofreram depredações e incêndios. Somente neste ano,três postos foram danificados, segundo informações da assessoria da corporação.

Além do prejuízo do vandalismo, muitos postos foram simplesmente desativados, tornando-se abandonados e tomados pelo crime. Dos que restaram em boas condições, segundo a PMDF, 15 foram repassados à Escola de Música, 10 estão em processo de transferência para a Secretaria de Mobilidade, cinco para a Secretaria de Educação e quatro serão enviados à Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social.

O Decreto 16.109/94 é a base que regulamenta as transferências, que são feitas pelo Departamento de Patrimônio, Manutenção e Transporte (DPMT) da Polícia Militar mediante Termo de Movimentação de Bem Patrimonial.

As unidades doadas à segurança pública estão localizadas em Ceilândia, Samambaia, Recanto das Emas e Asa Sul. Elas serão destinadas a atividades de redução da violência voltadas ao público LGBT, pessoas com deficiência e pessoas em situação de rua. Um chamamento de propostas foi publicado em dezembro de 2016 no Diário Oficial do Distrito Federal e, desde fevereiro, a Subsecretaria de Segurança Cidadã analisa as 40 sugestões de projetos recebidas.

Biblioteca e sede de ONG
Além das doações às secretarias, os postos também estão sendo autorizados para utilização por administrações regionais e iniciativas do terceiro setor. No Riacho Fundo II, um PCS duplo que funcionava na QN 8D e tinha sido alvo de três tentativas de incêndio foi transformado em biblioteca pública.

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No Riacho Fundo II, comunidade, empresários e servidores da administração regional bancaram a transformação do posto da QN 8D em biblioteca

 

Com R$ 35 mil arrecadados em doações feitas por servidores, empresários e comunidade, o espaço ganhou cara nova com direito a reforma interna, troca de pintura e novo mobiliário. O valor está bem abaixo dos R$ 250 mil que o governo anunciou que gastaria para reformar uma única unidade para doação. Enquanto não sai a liberação para a inauguração do espaço, a administração começou uma campanha de doação de livros. Interessados em ajudar devem ligar no (61) 3333-9620.

Em Planaltina, onde todos os cinco PCSs estão desativados, há nove sugestões enviadas pela população à administração regional para transformá-los em bibliotecas, casas de cultura, salas multiuso e sedes de organizações não governamentais (ONGs). Segundo a administração, as propostas foram repassadas à Polícia Militar e aguardam resposta.

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Em Samambaia Norte, uma ONG que trabalha com educação ambiental espera, há quatro meses, a liberação de uso do posto comunitário

 

Já em Samambaia Norte, a ONG Força Nacional de Proteção Ambiental espera, há quatro meses, receber uma autorização formal da PMDF para funcionar no posto comunitário das quadras 206/406. A instituição atua em parceria com a Polícia Militar Ambiental e o Instituto Brasília Ambiental (Ibram) no flagrante de crimes contra a natureza, além de  trabalhar com educação ambiental em escolas.

Mesmo sem documentação, a sede da instituição já foi transferida para o posto, dividindo o espaço com dois artistas plásticos que expõem esculturas de material reciclado e ferragens. Com medo de ataques, os voluntários, a maioria militares aposentados, revezam-se em turnos para vigiar o kinder ovo 24 horas por dia.

Ataques
Desde que foram inaugurados pelo governo Arruda, em 2008, um terço dos postinhos comunitários foi alvo de incêndios intencionais e depredações. Procurado pela reportagem, o ex-governador preferiu não se pronunciar sobre o assunto.

Mesmo quando são ocupados por projetos sociais mais inclusivos e democráticos, os módulos não ficam livres de ataques. O projeto BiciCentro, um bicicletário que funcionava em um PCS na Estrutural, teve de ser cancelado dois meses depois da inauguração: a sede foi queimada no ano passado.

 

Reprodução/Facebook
Em posto na Estrutural, bicicletário só funcionou por dois meses até ser incendiado

 

Walisson de Souza, 21 anos, educador de uma das ONGs responsáveis pelo projeto, vê as depredações sob uma perspectiva social, e não somente criminosa. Ele lamenta que a iniciativa não tenha tido tempo suficiente para se tornar uma referência para a comunidade.

O pessoal tem dificuldade de perceber ações de cunho positivo, ainda mais dentro de um posto policial. Segurança Pública aqui na Estrutural significa você ser revistado o tempo todo. A revolta vem daí

Walisson de Souza, educador do Coletivo da Cidade

Insegurança
Com 35% das unidades sucateadas e 26% doadas, a PMDF decidiu manter apenas os PCSs localizados em pontos considerados estratégicos. Com isso, a maior parte da população se sente abandonada e reclama de que não houve comunicação sobre o fechamento dos postos.

WhatsApp/Reprodução
Último ataque a um posto comunitário aconteceu no último sábado (11/3)

 

Virgílio Araújo, presidente do Conselho de Segurança Comunitária (Conseg) de Sobradinho II – região onde um dos PCSs foi doado à Escola de Música e outros dois foram incendiados – pede mais atenção à população.

“Hoje estamos sem postos e o comando da PM que atende a nossa região não tem policiais suficientes”, reclama. Virgílio defende que as unidades sejam doadas somente quando a comunidade apontar que não precisa delas.

Para lidar com a insegurança nas regiões que estão sem postos, a Polícia Militar adotou bases móveis. A falta de efetivo tem sido combatida com a adoção do serviço “voluntário” gratificado: quando policiais de folga são requisitados para trabalhar voluntariamente, mas de forma remunerada.

O posto causa uma falsa sensação de segurança. É mais efetivo ter policiamento móvel do que fixo

Eduardo Conde, comandante responsável pelo policiamento na região do Paranoá, Jardim Botânico e São Sebastião

O especialista em segurança pública George Felipe Dantas aprova a troca dos PCSs pela intensificação do policiamento móvel. Para ele, com exceção de locais onde há muito movimento de público, o conceito de posto comunitário não é sustentável nem do ponto de vista estratégico nem de efetivo policial. “Parar um PM em um lugar gera um impacto financeiro que não se justifica, a não ser pela alta demanda ou pela excepcionalidade de um local”, avalia Dantas.

 

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