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Pesca no reservatório já teve tempos melhores

Pescadores chegaram a pescar 100 quilos num único dia. Carpas, tilápias e carás são as espécies mais pescadas no local

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Michael Melo/Metrópoles
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1 de 1 Michael Melo/Metrópoles - Foto: Michael Melo/Metrópoles

Abiesel Alves Cavalcante, conhecido como Seu Bisa, também criou os dez filhos com o trabalho no Lago Paranoá. No dia 14 de abril de 1969, o pernambucano saiu de seu estado natal rumo à nova capital da República. Chegou aqui no dia 21 do mesmo mês, quando Brasília comemorava o aniversário de sua inauguração. Aqui, ele fincou raízes. Morou em paradas de ônibus, na rodoviária, até firmar-se em uma invasão às margens do lago, conhecida atualmente como Vila Telebrasília.

Colocadas alguns anos antes de sua chegada, as espécies que povoavam o curso d’água, em sua maioria tilápias e carpas, proliferavam-se. Mesmo com as intempéries, que incluíam as investigações linha dura dos órgãos responsáveis, aqueles eram bons tempos para esse segmento.

Em algumas épocas a gente não gastava duas horas para capturar até 100 quilos de pescado.

Seu Bisa, pescador

Com a formação da cooperativa de pescadores, “hoje desorganizada” nas palavras de Seu Bisa, ele conquistou a carteira de pescador profissional, que permite o uso nas águas de todo o território brasileiro, com exceção de Goiás. Foram também delimitados locais para a prática (alguns deles como o Setor de Clubes, o Pontão e a Península dos Ministros têm proibições) e algumas medidas foram adotadas para regularizar a atividade (malhas e tarrafas somente acima do número 6, por exemplo).

 

Atualmente, pescadores tiram até 35 quilos do lago por dia*Daniel Ferreira/Metrópoles**

 

Agora, Seu Bisa espera retomar o ritmo normal de pescaria, prejudicado por causa de alguns problemas de saúde e do roubo de sua canoa. Enquanto isso, acompanha os amigos em incursões nas proximidades do DF. Quando no Paranoá, vai sozinho e leva algumas horas, quando o barco está sem motor, para chegar à Ponte do Bragueto, um dos melhores pontos segundo ele.

Alta temporada

Observador, virou especialista na arte de pescar: analisa as fases lunares, a temperatura da água, a visibilidade do lago e a direção do vento. “Agosto marca o começo da melhor época do ano para essa atividade”, revela. Ele comercializa tilápias, tucunarés, carpas, traíras e tambaquis também cara a cara com o cliente, na beira d’água – nesse caso, o preço para a clientela fiel cai pela metade do aplicado para mercadinhos e restaurantes.

No alvorecer, as investidas dos pescadores se transformam em mais trabalho ainda. Debaixo de uma improvisada construção de madeira, esses homens iniciam o ritual de limpeza dos animais capturados. Ao som de uma rádio local, ainda sem o sinal de sol no céu, os peixes são amontoados em uma mesa rústica. Facas bem amoladas iniciam o serviço.

Em um arame, os pescados são colocados lado a outro, formando uma espécie de colar ou anel. Aos poucos, as caixas de plásticos são abarrotadas. Os miúdos acabam indo para o lixo ou se transformam em ração para patos, galinhas, gatos e cachorros que ali vivem.

 

Antônio Geraldo compra e revende os peixes do Lago Paranoá*Daniel Ferreira/Metrópoles**

 

Responsável por revender as postas, Antônio Geraldo Sousa, botafoguense roxo, realiza a atividade há 16 anos. Ele não se aventura nas águas com tarrafas e varas, mas conhece a rotina de cada homem daquele pedaço. Às 8h30, ele coloca o resultado de uma madrugada de trabalho nas costas e parte de ônibus para algumas regiões administrativas do DF. Não há um endereço certo: “Quem conhece sabe onde comprar”, diz.

O lago

Pensado ainda no Relatório Cruls, estudo do século XIX que mapeou o Planalto Central do Brasil, o Lago Paranoá começou a ser represado no fim dos anos 50. São 48km² de extensão, 38 metros de profundidade máxima e cerca de 80km de perímetro. Após a inauguração de Brasília, algumas variedades de peixes foram introduzidas ao ambiente aquático.

Hoje, o espelho d’água conta com maior variedade de espécies de peixes desde a despoluição e menor quantidade de biomassa comparado aos tempos de maior sujeira no curso de sua bacia, período entre o fim das décadas de 60 a 90.

 

Experientes, pescadores sabem exatamente melhores lugares para ir*Daniel Ferreira/Metrópoles**

 

Ao contrário do que muitos pensam, esse foi o período mais produtivo para o ofício da pescaria. Explica-se. Os dejetos orgânicos lançados lá, provenientes do esgoto, alimentavam a água em nutrientes como fósforo e nitrogênio, o que facilitava a reprodução de carpas e principalmente tilápias (as espécies estrangeiras deram início ao povoamento animal do espelho d’água à época da inauguração de Brasília).

Porém, ao mesmo tempo, o número crescente da biomassa de pescados também possibilitava a multiplicação das algas que, por sua vez, acabavam aos poucos com o ar no lago. “Esse número era tão grande que até a pesca com tarrafa, considerada predatória até então, teve de ser admitida para restaurarmos o ecossistema”, conta Fernando Starling, analista do sistema de saneamento da Caesb e PhD em ecologia aquática.

Tal cenário, se não cuidado devidamente, poderia significar a morte da vida por ali. A Caesb, então, montou estações de tratamento aliadas a outros recursos, tais como o flushing, uma espécie de “descarga”, que filtrava o volume aquático.

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