Pedófilos do DF preferem atacar meninas entre 6 e 11 anos, diz levantamento
Polícia Civil mapeou os crimes sexuais envolvendo crianças e identificou as cidades, o dia da semana e o horário em que mais ocorrem abusos
atualizado
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Tão silencioso quanto devastador, o pedófilo deixa marcas profundas no corpo e na alma de suas vítimas. Os ataques, muitas vezes, partem de quem deveria ser porto seguro e dar aconchego. Sufocados, os gritos de socorro custam a extravasar o seio familiar e alcançar as autoridades. No Distrito Federal, quase a metade das vítimas de pedofilia é composta por meninas, entre 6 e 11 anos. O dado estarrecedor faz parte de um levantamento elaborado pela Polícia Civil do Distrito Federal e obtido com exclusividade pelo Metrópoles.
A PCDF mapeou os casos na capital da República, identificando as regiões administrativas, o dia da semana e a faixa horária em que mais ocorrem esse tipo de crime. O relatório define, ainda, o perfil das vítimas e o tipo de ambiente em que os abusos foram consumados. O estudo analisou 172 ocorrências registradas entre janeiro de 2018 e 30 de junho de 2020. Apenas neste ano, 34 crianças foram violentadas sexualmente no DF.
O levantamento aponta que entre o universo de vítimas, 75,8% são do sexo feminino, com predomínio da faixa etária entre 6 e 11 anos – 46,7% dos casos.
“É assustador quando nos deparamos com casos em que pais, padrastos, tios e avôs cometem esse tipo de abuso. Eles se valem de uma relação de confiança não só com a vítima mas com o restante da família para consumar a agressão”, explica a titular da Delegacia de Proteção a Criança e ao Adolescente (DPCA), Ana Cristina Santiago.
Estratégia abusiva
A delegada ressalta que os pedófilos se utilizam de estratégias para consumar o abuso e, sobretudo, manter a agressão em segredo, evitando que a criança o denuncie.
A principal arma do abusador, segundo especialistas, é promover a familiaridade da vítima com sexo, posições sexuais, fotos e vídeos eróticos, além da suposta naturalidade em tocar no corpo nu.
“O objetivo do pedófilo, nesse caso, é transparecer que o abuso é algo natural, em que a criança tenha a ilusão de que não está ocorrendo nada errado”, detalha Ana Cristina.
Quando existe a suspeita de violência sexual, a materialização do abuso se transforma em um complexo quebra-cabeça, em que as peças permanecem ocultas no íntimo de cada criança. Nem sempre a ação do pedófilo deixa marcas no corpo da vítima.
“Cuidamos de poucos casos em que o abuso deixa vestígios. Uma prática de sexo oral, um toque mais incisivo ou masturbação não deixam sinais. Nesse momento, o trabalho se torna muito mais psicológico”, ressalta a investigadora.
Perceber os sinais que a criança vítima de abusos apresenta é o primeiro passo para concluir que há algo errado. Voltar a fazer xixi na cama, alterações no sono e de apetite são algumas das mudanças de comportamento que podem denunciar uma possível agressão sexual.
“Não existe uma fórmula exata para identificar o abuso, ainda mais intrafamiliar. No entanto, quando uma criança costumava ser muito alegre e se torna agressiva, com alterações de humor, as mães precisam ficar atentas”, ensina a titular da DPCA.
Mapa da pedofilia
Entre o recorte das 172 ocorrências mapeadas pelo levantamento, os analistas criminais determinaram as regiões administrativas em que mais ocorreram casos de pedofilia no DF. Em primeiro lugar, figura Planaltina, com 25 registros. Ceilândia aparece em segundo, com 24 casos, e São Sebastião, com 18.
Segunda-feira é o dia da semana com a maior quantidade de ocorrências policiais dessa natureza, acumulando 21,3% dos casos. A faixa horária em que os pedófilos mais atacam está compreendida entre 12h e 18h59.
O magistrado que responde pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra as Mulheres do Núcleo Bandeirante, Ben-Hur Viza, lida diariamente com processos criminais envolvendo vítimas de pedofilia.
O juiz frisa que tais abusos não ocorrem apenas em residências em que moram famílias desestruturadas social e emocionalmente. “Temos consciência de que existe uma cifra oculta, uma subnotificação relacionada a casos de pedofilia, por uma série de fatores, entre eles o fato de membros da família entrarem em um processo de negação envolvendo os abusos”, salienta.
Viza ressalta que, em processos presididos por ele, ocorrem casos em que as vítimas são vistas como “culpadas” pelo fato de sofrerem abusos cometidos por pais e padrastos.
“É lamentável, mas algumas dessas crianças são julgadas e condenadas dentro de seus seios familiares e, muitas vezes, acusadas pelas próprias mães de supostamente se envolverem amorosamente com seus companheiros. Ou então de estarem fingindo ter sofrido agressão sexual”, assinala o magistrado.
Combate direto
Nos últimos quatro anos, o DF se tornou palco de uma série de operações desencadeadas tanto pela PCDF quanto pela Polícia Federal para combater a pedofilia. As ações têm como principal objetivo prender criminosos sexuais responsáveis por disseminar fotos e vídeos de crianças e adolescentes com conteúdo sexual.
No ano passado, a DPCA participou da segunda fase da Operação Luz na Infância, cumprindo mandados de busca e prisões na casa de suspeitos de alimentar a pedofila na internet.
Em julho deste ano, a PCDF deflagrou a Operação Infância Violada, com o intuito de combater a pedofilia e o armazenamento de conteúdo sexual de crianças e adolescentes. A força-tarefa prendeu seis pedófilos.
No mesmo mês, policiais civis do DF viajaram até o Maranhão para prender um homem apontado como um dos maiores pedófilos do país. Ele teria feito vítimas em todos as unidades da Federação, com exceção do Acre. No DF, as autoridades contabilizaram pelo menos 60 adolescentes que teriam sido alvo dos ataques.
O auxiliar administrativo Sylas Sousa Silva, 31, tornou-se um dos mais contumazes pedófilos a atuar nos últimos anos. Suas principais vítimas tinham entre 11 e 14 anos. Ele agia no sentido de convencê-las a enviar fotos em posições pornográficas.
Vítimas do pedófilo chegaram a cogitar o suicídio, com medo do vazamento das fotos e dos vídeos de nudez. A investigação teve início após os pais de uma adolescente de 13 anos registrarem ocorrência. Para ganhar a confiança de seu público-alvo, Sylas se passava por uma garota. Ele usava um perfil falso no Instagram.