PCDF endurece regras para uso de armas em festas e “carteiradas”
Portaria é publicada duas semanas após um agente da 14ª Delegacia de Polícia matar um PM no Barril 66
atualizado
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Duas semanas após a morte do primeiro-tenente da Polícia Militar do Distrito Federal Herison Oliveira Bezerra, 38 anos, a Polícia Civil publicou uma portaria com regras mais rígidas sobre o porte de arma por agentes e delegados em eventos e restringindo a “carteirada”. Herison morreu no dia 15 de abril deste ano, depois de ser baleado pelo policial civil Péricles Marques Portela Júnior, 39, na casa de shows Barril 66, às margens da Estrada Parque Núcleo Bandeirante (EPNB).
Publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) desta segunda-feira (29/04/2019), a portaria assinada pelo diretor-geral da Polícia Civil, Robson Cândido, reforça que a “carteirada” é incompatível com a função policial, pois fere princípios básicos da Administração Pública. As normas atendem uma recomendação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).
A PCDF determina que o policial civil a trabalho só tenha acesso às casas de shows após se identificar ao responsável pelo estabelecimento, apresentando sua carteira funcional e preenchendo, de próprio punho, a ficha de controle fazendo constar seu nome e matrícula.
Nesse caso, a Corregedoria-Geral de Polícia também precisa ser comunicada no prazo máximo de 15 dias após o evento, para fins de controle.
O diretor-geral também proibiu qualquer tipo de consumo gratuito nos locais, bem como o uso de bebida alcoólica, ainda que mediante pagamento, se estiver em serviço.
Nos casos de folga, em que o policial paga a entrada e esteja na posse de arma de fogo, ele deverá se identificar apresentando sua identidade funcional, quando solicitado. Em caso de descumprimento, o servidor responderá a um procedimento administrativo disciplinar.
Porte de arma
Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), os policiais podem andar com as pistolas a qualquer hora do dia, inclusive em estabelecimentos comerciais.
A conduta é amparada pela Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o Estatuto do Desarmamento. O artigo 6º da norma diz que os integrantes dos órgãos policiais “terão direito de portar arma de fogo de propriedade particular ou fornecida pela respectiva corporação, ou instituição, mesmo fora de serviço”.
No entanto, recomendação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) diz que os agentes de segurança, antes de entrarem em estabelecimentos armados, precisam assinar um termo de responsabilidade.
No documento expedido pelo Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial (NCAP), está, também, “expressa proibição do uso de bebida alcoólica nas casas de diversão pública e congêneres, quando tiverem a entrada franqueada em razão do serviço”. Além disso, em outra recomendação, o MP prevê regras mais duras para as chamadas “carteiradas” de servidores da PCDF.
Câmeras gravaram assassinato
O momento do assassinato do tenente Herison foi registrado por câmeras de segurança do estabelecimento. Nas imagens, é possível ver o policial militar passando em frente ao agente. Eles se esbarram, o policial civil saca a arma. O PM chega a pegar a pistola, mas é alvejado antes. Foram quatro tiros: dois no tórax e um no abdômen do PM; outro na perna de Andressani de Oliveira, que estava próximo ao local.
As cenas também mostram que, após os disparos, a namorada do PM tentou socorrê-lo. “Foi desesperador. Não consegui sequer tirar ele do meio da briga, foi tudo muito rápido. Quando vi, ele já estava caído no chão, perdendo muito sangue. O socorro também demorou a chegar, levou exatos 30 minutos. Acho que isso contribuiu para a morte”, disse Aline Rabello, 30 anos, ao Metrópoles.
É um desespero muito grande, tanta dor. Vai ser muito sofrido viver sem ele
Aline Rabello, namorada de Herison
Aline disse que analisou as imagens do circuito interno do estabelecimento, do momento em que chegaram até a hora do assassinato. A casa tem capacidade para cerca de 1,5 mil pessoas e estava lotada. Segundo a jovem, em momento algum os dois policiais se encontraram durante a madrugada.
“Diferentemente do que algumas testemunhas disseram, ninguém mexeu comigo. Não discutiram antes. Ele não fez nada e, mesmo se tivesse feito, nada justifica ter dado três tiros à queima-roupa em um local fechado. Foi um ato covarde”, acrescentou.
“Alta periculosidade”
Na terça-feira (16/04/2019), dia seguinte ao crime, a juíza do Tribunal do Júri de Águas Claras decidiu manter o agente preso. Na decisão, a magistrada Flávia Pinheiro Brandão Oliveira ressaltou que “o fato é grave e a prisão se mostra necessária”.
De acordo com a juíza, “a análise dos autos revela a elevada periculosidade social do autuado, tendo em vista que, após um simples esbarrão em um estabelecimento comercial que estava muito cheio, teria sacado sua arma de fogo e efetuado quatro disparos em desfavor da vítima, deixando-a totalmente sem possibilidade de reação”.
Um agravante, segundo a juíza, é o fato de os disparos terem sido efetuados dentro da boate lotada. “Ressalte-se que a atitude do autuado colocou em risco a vida de milhares de pessoas que estavam no local em busca de diversão”, assinalou. Além disso, no entendimento dela, o fato de Péricles ser policial civil “torna ainda mais reprovável a sua conduta, uma vez que deveria zelar pela garantia da segurança das pessoas e, no caso, de forma diametralmente oposta, criou a situação de absoluta insegurança no local”.