PCDF apreende R$ 43 mil em casa de servidor suspeito de fraude
Esquema de corrupção gerou prejuízo de R$ 11 milhões. Contratos foram firmados em 2017, na gestão de Rodrigo Rollemberg
atualizado
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Um servidor da Secretaria de Educação investigado por fraude na licitação de merendas para escolas públicas guardava R$ 43 mil em espécie em casa. A quantia foi apreendida pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) no âmbito da Operação Fames, deflagrada na quinta-feira (16/04). O prejuízo aos cofres públicos pode chegar a R$ 11 milhões.
Os contratos foram firmados em 2017, na gestão de Rodrigo Rollemberg. Dos quatro mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça, um deles ocorreu na empresa contratada e os demais, nas residências do proprietário e de dois servidores que participaram do processo de licitação.
Os crimes investigados pela Divisão Especial de Combate à Corrupção (Decor/Cecor/PCDF) são fraude ao caráter competitivo de processo licitatório, corrupção ativa e corrupção passiva.
Confira fotos da operação:
Participaram da Operação Fames 30 policiais civis, entre delegados, agentes, escrivães e peritos criminais, além de analistas do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e dois auditores da Controladoria-Geral da União (CGU).
Um detalhe importante: todos utilizando EPIs, que também foram fornecidos às pessoas que se encontravam nos locais alvos das buscas, como medida de prevenção à disseminação do novo coronavírus.
O termo “Fames”, que dá nome à operação, é alusão à deusa da fome na mitologia romana.
Em nota ao Metrópoles, a Secretaria de Educação garantiu a colaboração “com o que for necessário para o bom andamento das investigações, mas vai aguardar o fim das apurações para adotar as medidas cabíveis e se pronunciar a respeito das supostas irregularidades na licitação da merenda escolar em 2017”.
Auditoria
Inspeção realizada pela CGU nos contratos fechados pela Secretaria de Educação constatou que a pasta executou mais de R$ 130 milhões com alimentação escolar. Mesmo assim, faltou merenda nas escolas da rede pública de ensino.
O relatório da CGU constatou exigências injustificadas nas especificações dos produtos licitados que oneraram a contratação de produtos e restringiram a competitividade em prejuízo da escolha de melhor proposta.
Entre os itens cobrados, havia orientações para que o frango a ser adquirido fosse cortado em cubos.
“A especificação restritiva pode direcionar a aquisição para determinado fornecedor e impactar no valor da contratação [de milhões de reais no caso da SEEDF], inclusive com prejuízo ao erário, sem mencionar o próprio esvaziamento do certame devido ao número reduzido de produtos que satisfazem aos critérios definidos”, afirma a CGU.
De acordo com o órgão, não é razoável que sejam exigidas especificações sem que se demonstre o custo-benefício prático envolvido.
Segundo a CGU, não há, nos autos analisados, qualquer fundamento técnico de nutricionista ou responsável técnico que justifique cortes tão minimamente especificados.
Ou seja, independentemente do tamanho, os pedaços de frango devem ser manuseados e cortados para serem utilizados nas refeições servidas aos alunos, portanto, na avaliação dos técnicos, isso torna inócuo o rigor excessivo demonstrado na avaliação das amostras.
“Assim, percebe-se que as especificações, além de restringir a potencial oferta de licitantes, acaba por encarecer o produto, pois onera o preparo para o fornecimento”, consta no levantamento da CGU.
Fraude
O órgão de controle constatou favorecimento à empresa previamente escolhida, com habilitação indevida, ante aceitação de produtos com características que levaram à desclassificação de outros participantes da licitação, que, inclusive, ofereceram valores mais vantajosos ao governo.
“Chama a atenção, ainda, aquisição de produtos sem cobertura contratual decorrente de processos licitatórios previsíveis que se arrastaram por dois anos na fase interna. Ademais, verificou-se sobrepreço de gêneros alimentícios nos pregões eletrônicos promovidos pela SEEDF, com potencial prejuízo identificado de R$ 11.156.979,68, e prejuízo efetivo de R$ 4.348.916,65”, diz o relatório.
A CGU afirma que a empresa Juno Veloso, responsável pelo abastecimento de carnes e produtos perecíveis, foi duplamente favorecida: ao ter a proposta indevidamente aceita pela comissão de licitação e na hora do fornecimento dos produtos à rede de educação do Governo do Distrito Federal. A medida novamente veio sem a observância das qualificações técnicas e padrões de qualidade minimamente definidos.
Desabastecimento
Impropriedades e irregularidades contribuíram para a precariedade na execução do Programa de Alimentação Escolar do Distrito Federal (PAE), devido à contratação sem licitação e falta de variedade e desabastecimento de carnes in natura na alimentação escolar, prejudicando o desempenho dos alunos.
“Em tempos de crise financeira pela qual o Distrito Federal e o Brasil passam, não se viu nos atos da Secretaria de Estado da Educação do Distrito Federal a observância dos princípios constitucionais da economicidade e da eficiência na escolha dos gêneros alimentícios consumidos no âmbito da alimentação escolar”, constataram os fiscais.
Além do prejuízo material envolvido, a má execução do PAE causa um grande prejuízo social, segundo a CGU. Tendo em vista o impacto no correto desenvolvimento da política pública e, consequentemente, dos alunos matriculados na rede pública do DF, que, em muitos casos, têm a alimentação escolar como principal refeição diária.
Secretaria se defende
Em resposta ao Relatório de Auditoria, a SEEDF afirmou ter havido desabastecimento de proteínas animais (carne de frango, suína, bovina, peixes e ovos) nas escolas da rede pública do DF somente em alguns dias da semana, entre os dias 7 e 11 de outubro de 2019.
Ressaltou que nos períodos anteriores não houve desabastecimento completo de todos os tipos de proteínas animais, pois ainda havia o fornecimento de frango in natura nas escolas.
A SEEDF apresentou uma relação de gêneros alimentícios disponíveis para oferta durante auditoria realizada pela CGU. Nessa lista, são apresentados os seguintes itens perecíveis de proteínas animais: frango in natura, carne bovina in natura – almôndega e acém moído, carne suína e peixes.
Quanto à almôndega, foi noticiado na imprensa, e confirmado pela equipe da CGU, o problema relacionado ao excesso de gordura da carne, em desconformidade com o contratado. Durante o período de visitas às escolas, a oferta de almôndegas estava suspensa, e os estoques existentes nas escolas estavam aguardando recolhimento por parte da empresa responsável.
Em relação aos outros alimentos fontes de proteína, segundo a CGU, ainda foi possível encontrar estoque de peixes em algumas poucas escolas. Carne suína só foi encontrada em uma das 29 escolas visitadas. Na maioria delas, a última entrega de ovos se deu em maio de 2019.
Em quase todas as escolas visitadas houve reclamação sobre a falta de variedade de carnes para preparo da merenda escolar, tendo em vista a existência, basicamente, de carne de frango para preparo.
De acordo com a Secretaria, o desabastecimento completo de proteína animal nesse período foi acarretado pela impossibilidade de renovação de contratos de aquisição de gêneros alimentícios.